Atualmente, já temos bons exemplos de empresas que facilitam a coexistência de várias gerações, e que promovem um envelhecimento ativo e saudável aos seus colaboradores, assumindo o seu papel de transformadores positivos da sociedade. Mas os desafios e oportunidades associados ao envelhecimento da força de trabalho ainda não se materializam numa abordagem proativa generalizada por parte das empresas
POR MARIANA RIBEIRO FERREIRA
As empresas e as organizações são chamadas, cada vez mais, a agir para ajudar a resolver, ou minimizar, os problemas sociais mais complexos. A sociedade já tem, de alguma forma, essa expetativa, sobretudo se a empresa tiver uma estratégia de responsabilidade social e atuar de forma “cidadã”.
E quando se trata de abordar o desafio do envelhecimento da sociedade, como podem as empresas contribuir para dignificar os mais velhos e promover o encontro e a cooperação entre gerações?
A população europeia ativa está em processo de envelhecimento e as mudanças demográficas representam desafios e oportunidades para as organizações. A expetativa de se viver mais tempo é, sem dúvida, um dos maiores benefícios do desenvolvimento, mas os desafios que lhe estão inerentes não são de somenos: o aumento de pessoas dependentes, a diminuição da população ativa, a situação dos cuidadores informais e o aumento da idade da reforma para garantir a sustentabilidade dos sistemas de proteção social, são apenas alguns dos desafios que se apresentam ainda por resolver plenamente, até nos países mais desenvolvidos.
O envelhecimento associado à longevidade é um ganho civilizacional, mas pode também aumentar o risco de desigualdade, de conflitos intergeracionais e de desvalorização das pessoas idosas dependentes, que não correspondem ao paradigma do envelhecimento ativo. Os países desenvolvidos, de uma forma transversal, têm inclusivamente adoptado práticas que incentivam a saída precoce da vida ativa, numa lógica pouco solidária, do ponto de vista geracional.
Para a Organização Mundial de Saúde, o envelhecimento ativo é o processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas ficam mais velhas. Falamos, por, isso de um processo, de um conjunto sistémico de medidas que devem ser planeadas e executadas ao longo do tempo. Assim, a preparação para um envelhecimento ativo deveria ser mais uma etapa da gestão de carreira, a iniciar logo com a procura de emprego, e na qual as empresas se devem empenhar, para seu próprio benefício e a bem de uma sociedade demograficamente sustentável. O corte abrupto com a vida profissional ativa, de um dia para o outro, pode ser brutal e trazer consequências dramáticas na saúde física e mental, no equilíbrio familiar e na segurança financeira.
O trabalho sustentável ao longo da vida, segundo a definição de trabalho estabelecida pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound), significa que “as condições de vida e de trabalho criadas ajudam as pessoas a entrar e a permanecer no mercado de trabalho durante uma vida ativa mais longa”. Para que tal aconteça, há dois domínios que têm de ser contemplados: as características do emprego e o ambiente organizacional e as características e circunstâncias de cada pessoa.
É neste âmbito que as empresas e as políticas de responsabilidade social, enquanto modelo de gestão, podem ser determinantes para a construção de uma sociedade mais solidária e “age friendly”. Por um lado, devem compreender que os seus colaboradores não têm as mesmas necessidades ao longo da vida, nem ao longo da sua carreira, e devem procurar agir em conformidade com estas circunstâncias, no desenvolvimento de medidas que promovam a conciliação entre trabalho-família, a adequação das funções, o desenvolvimento de programas de reintegração no trabalho e a oferta de opções flexíveis de horários. A prevenção de riscos e o reforço da promoção da saúde no local de trabalho são outros aspetos organizacionais que devem ter em conta a diversidade geracional.
A mentoria de colaboradores mais experientes aos mais jovens, cheios de energia e curiosidade, é uma das medidas que poderá ajudar a reforçar a coesão interna, a otimizar competências e a preservar conhecimento na empresa. Assim como a adoção de benefícios que considerem vários segmentos de idade, a definição de objetivos que considere várias fases da carreira e a promoção de ações de sensibilização que consciencializem sobre o processo de envelhecimento e evitem preconceitos com a idade.
O Grupo de Reflexão e Apoio à Cidadania Empresarial – GRACE, enquanto disseminador de boas práticas publicou dois guias orientadores para as empresas que compreendem este valor acrescentado da intergeracionalidade para a sua sustentabilidade e para toda a sociedade. Refiro-me ao Guia para a Promoção do Envelhecimento Ativo e da Solidariedade entre Gerações no Contexto Empresarial, publicado em 2012, Ano Europeu do Envelhecimento Ativo e da Solidariedade entre Gerações, e ao Guia sobre Responsabilidade Social Interna, publicado em 2018, que aborda, entre outras, a temática da gestão da idade nas organizações e a integração de várias gerações. Neste documento de suporte estratégico, mas também operacional, aos associados do GRACE, destacam-se ainda vários projetos e iniciativas que têm o objetivo de promover o equilíbrio e a solidariedade entre gerações.
Atualmente, já temos bons exemplos de empresas que facilitam a coexistência de várias gerações, e que promovem um envelhecimento ativo e saudável aos seus colaboradores, assumindo o seu papel de transformadores positivos da sociedade. Mas os desafios e oportunidades associados ao envelhecimento da força de trabalho ainda não se materializam numa abordagem proativa generalizada por parte das empresas.
Ainda temos um longo caminho pela frente para que, a par do envelhecimento enquanto indicador de desenvolvimento, esteja a solidariedade intergeracional como um sinal de maturidade da sociedade.
Vice-Presidente do GRACE, em representação da José de Mello Saúde