O Parlamento Europeu distingue este ano com o Prémio para a Liberdade de Pensamento
O Prémio Sakharov para a Liberdade de Pensamento 2012 foi este ano atribuído a dois activistas iranianos: a advogada e activista dos direitos humanos Nasrin Sotoudeh e o realizador de cinema Jafar Panahi, ambos detidos desde 2010. O Prémio é atribuído pelo Parlamento Europeu (PE) a personalidades ou entidades que se distinguem por defender os direitos humanos e as liberdades fundamentais. Sotoudeh e Panahi foram escolhidos há poucos dias pelo presidente Martin Schulz e por líderes dos partidos políticos, depois de terem sido nomeados pelos grupos dos Socialistas e Democratas, Liberais e Democratas e pelo Grupo dos Verdes / Aliança Livre Europeia e por vários eurodeputados, pelo seu trabalho em prol da liberdade de expressão e de pensamento. No anúncio da dupla iraniana, o presidente do PE sublinhou que este ano, “a entrega do Prémio Sakharov para a Liberdade de Pensamento é uma mensagem de solidariedade e de reconhecimento de uma mulher e de um homem que não se renderam ao medo e à intimidação e que decidiram colocar o destino do seu país acima do seu próprio destino”. E apelou: “espero sinceramente que eles consigam vir a Estrasburgo, ao Parlamento Europeu, receber o prémio em Dezembro”. Os dois opositores ao regime iraniano foram presos na sequência dos protestos contra a reeleição do Presidente Mahmoud Ahmadinejad, em 2009, a que se seguiu uma vaga de detenções, incluindo as de Panahi, em Março de 2010, e de Sotoudeh, em Setembro do mesmo ano. Condenando a repressão no Irão, o presidente do Parlamento Europeu sublinhou que o Prémio Sakharov 2012 deve ser interpretado como um “não muito claro ao regime iraniano”, que “não respeita nenhuma das liberdades fundamentais”. “Quisemos exprimir a nossa admiração por uma mulher e um homem que resistem à intimidação de que são vítimas pelas autoridades iranianas”, concluiu o eurodeputado social-democrata alemão. Os outros dois finalistas do prestigiado prémio são também activistas que estão detidos: as três jovens russas do grupo “punk” Pussy Riot, condenadas a dois anos de prisão por terem entrado numa igreja ortodoxa para um concerto de protesto contra o Presidente Vladimir Putin, e o dissidente bielorruso Ales Beliatski, fundador de uma organização que apoia prisioneiros políticos na Rússia (ver caixa 1). Provavelmente perante a ausência de todos os finalistas, o Prémio Sakharov 2012 será entregue por Martin Schulz numa sessão solene a realizar no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, a 12 de Dezembro. This is not a film Esta sentença causou indignação a nível internacional e várias personalidades do mundo do cinema solidarizaram-se com a causa de Panahi. O seu último filme, “This Is Not a Film” foi transportado clandestinamente do Irão para o Festival de Cinema de Cannes em 2011 numa pen USB escondida dentro de um bolo. O Festival homenageou-o nesse mesmo ano e, em sinal de protesto, a sua cadeira foi deixada simbolicamente vazia no momento da apresentação do júri internacional, para o qual tinha sido convidado. Panahi alcançou o reconhecimento internacional com o filme “The White Balloon”, que ganhou o prémio Caméra d’Or, no Festival de Cannes, em 1995, o Leão de Ouro de Veneza por “O Círculo” (2000). Assumindo uma visão crítica sobre o regime iraniano na abordagem de temas como a realidade das crianças, das mulheres e dos pobres no Irão, o realizador foi acusado em Março de 2010 de “planear” um filme sobre as manifestações que proliferavam então. Detido na prisão que já recebeu milhares de presos políticos nas últimas décadas, Evin, em Teerão, Panahi foi mais tarde libertado, e acusado em Dezembro desse ano, tendo recorrido da sentença e aguardado a decisão em prisão domiciliária a decisão final: vinte anos sem poder sair do Irão, os mesmos vinte sem poder exercer a sua profissão e a sua arte. Segundo anunciou à imprensa já este mês o realizador Abbas Kiarostami, Jafar Panahi continua a trabalhar e deverá apresentar um novo filme em 2013. Acusada pelo que defende
Aos 47 anos, Sotoudeh é há vários anos uma das principais dos abusos dos direitos humanos cometidos pela República Islâmica. Advogada e amiga de Shirin Ebadi, Nobel da Paz em 2003, Sotoudeh pertencia ao Centro de Defesa dos Direitos Humanos, o qual fundou para defender mulheres, opositores políticos e minorias no Irão. Conseguindo em 2000 o difícil reconhecimento, para uma mulher no Irão, do direito a exercer advocacia (batalha de que não desistiu durante longos anos), tornou-se reputada por defender crimes de jovens menores condenados à morte, uma das práticas judiciais de Teerão mais condenadas pelas organizações internacionais. Na sequência da “Revolução Verde” (como ficaram conhecidas as manifestações contra a reeleição de Ahmadinejad, as maiores desde a Revolução Islâmica), Sotoudeh representou em tribunal muitos dos opositores presos durante os protestos, incluindo advogados e activistas. A sua acção torna-se demasiado incómodo depois de dar algumas entrevistas a jornalistas ocidentais em que denuncia a repressão vivida no país desde as presidenciais de 2009 e, em Setembro de 2010 é detida e transportada para Evin, onde anos antes estivera presa a Nobel da Paz, Ebadi. É lá que faz duas greves de fome para denunciar as condições em que estava detida, reclamando inclusivamente com a proibição de ver os seus dois filhos, de três e 11 anos. Em Janeiro de 2012, Nasrin Sotoudeh foi condenada a onze anos de prisão e ficou proibida durante vinte de exercer advocacia. O veredicto – “acções contra a segurança nacional e propaganda contra o regime” – é o mesmo que tantos jovens e opositores ao regime defendeu, quando ainda entrava nos tribunais iranianos como advogada, e não como réu. Hoje, conta com o apoio da Amnistia Internacional que, desde que um recurso reduziu a sua pena para seis anos, pede a libertação da activista.
Em 2011, pela Primavera Este manifestante, que se imolou pelo fogo no dia 17 de Dezembro de 2010, num gesto desesperado que revelava a falta de condições do povo tunisino para a sobrevivência, morreu duas semanas mais tarde, desencadeando um movimento popular nacional que levou à queda do regime do ditador Ben Ali. Estava lançada a Primavera Árabe, que floresceu rapidamente estendendo-se a várias nações. Ao Egipto por exemplo, onde Asmaa Mahfouz, uma das fundadoras do Movimento 6 de Abril apelou ao movimento na Praça Tahrir, no Cairo, que conduziu à queda do regime do ditador Hosni Mubarak. Ou à Líbia, onde com já 77 anos, Ahmed al-Zubair Ahmed al-Sanusi, contava os 31 anos perdidos na prisão por causa das suas actividades de dissidência ao regime do falecido Muammar Khadafi. Ou ainda à Síria, onde Razan Zeitouneh, com 34 anos, dirigiu os comités de revolta e Ali Farzat foi espancado em Agosto de 2011 pelas forças de segurança, pelo atrevimento das suas caricaturas. Todos eles são protagonistas das revoltas que conduziram à queda de vários ditadores árabes, o que levou, no ano passado, os vários presidentes dos grupos políticos do Parlamento Europeu a não ter dúvidas quanto ao destino do Prémio Sakharov: a decisão foi unânime e a vitória já era esperada, uma vez que esta candidatura tinha sido apresentada conjuntamente no Parlamento Europeu pelos principais grupos: conservadores, socialistas, liberais e ecologistas. Criado em 1988, o Prémio Sakharov já foi atribuído a personalidades como o líder sul-africano Nelson Mandela, a activista birmanesa Aung San Suu Kyi, o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, o dissidente chinês Hu Jia, ou o timorense Xanana Gusmão. (ver Caixa 2).
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Jornalista