Foi com o objectivo de inverter a tendência crescente de desempregados seniores que a Fundação AEP criou o projecto Empreender 45-60. No estudo “Diagnóstico e Estratégia de Desenvolvimento do Empreendedorismo Sénior”, realizado no âmbito desta iniciativa, a organização conclui que este segmento populacional está altamente desmotivado para o empreendedorismo. A criação de acções de sensibilização e a aproximação entre estes, os jovens e as diversas formas de financiamento de projectos são algumas das principais recomendações apresentadas
POR
MÁRIA POMBO

Muito se tem falado e escrito sobre o desemprego jovem e, felizmente, diversos são os apoios e as iniciativas que pretendem ajudar os mais novos a procurar formas de contornar a dificuldade de entrar no mercado de trabalho. Contudo, o desemprego sénior – que tem vindo a aumentar – ainda não tem o destaque que deveria, afectando muitos cidadãos com idade igual ou superior a 45 anos.

Foi precisamente com foco na promoção do empreendedorismo sénior – o qual é encarado como uma forma de diminuir o desemprego e atenuar as suas consequências junto da população com mais de 45 anos e com elevados níveis de qualificação – que a Fundação AEP criou o projecto Empreender 45-60, uma estratégia de apoio ao desenvolvimento do próprio negócio na Região Norte, podendo posteriormente ser replicada para outras regiões do País ou estimulando a criação de outras iniciativas a nível nacional.

Esta iniciativa está em linha com as metas estabelecidas da Estratégia Europa 2020, procurando alcançar uma taxa de emprego na ordem dos 75% na faixa etária entre os 20 e os 64 anos, nomeadamente por via da criação de emprego por conta própria e pela promoção do empreendedorismo.

A este respeito, a Fundação AEP realizou o estudo “Diagnóstico e Estratégia de Desenvolvimento do Empreendedorismo Sénior”, focando-se no segmento populacional com mais de 45 anos e procurando conhecer em maior profundidade a população sénior da região Norte do País (que, das cinco regiões de Portugal Continental, é aquela que apresenta a maior taxa de desempregados seniores qualificados), nomeadamente as suas necessidades e motivações, assim como as condições que favorecem e as que dificultam o empreendedorismo nesta fase da vida.

Com base nas conclusões retiradas a partir deste estudo, a Fundação AEP procedeu depois à aplicação e ao desenvolvimento de uma estratégia de apoio ao empreendedorismo junto de desempregados qualificados que se encontram na faixa etária entre os 45 e os 60 anos, nomeadamente através de apoio em termos de geração de ideias, criação de negócios e networking.

A análise contou com a participação válida de 738 cidadãos residentes na região Norte, com elevado nível de qualificação e com idades compreendidas entre os 45 e os 60 anos. Destes, 57,8% são mulheres, e cerca de 60% dos respondentes têm habilitações académicas ao nível da licenciatura. Em termos geográficos, a faixa litoral é aquela que acolhe a grande maioria dos cidadãos, os quais se concentram essencialmente no Porto (54,8%) e em Braga (27,1%), sendo a cidade mais interior – Bragança – aquela que acolhe a menor percentagem de respondentes (4,4%).

Antes de se encontrarem em situação de desemprego, muitos dos inquiridos exerciam profissões liberais (26%) ou eram trabalhadores por conta de outrem sem ser em escritórios (17,8%), sendo que apenas 0,8% trabalhavam por conta própria e 1,9% eram estudantes, domésticas ou inactivos. Adicionalmente, 42% trabalhavam no sector dos serviços e mais de 30% tinham entre 10 e 15 anos de experiência profissional.

População sénior desmotivada para o empreendedorismo

Tendo em conta que, ao longo da carreira, 62,9% dos cidadãos frequentaram cursos de formação e/ou actualização profissional, os autores do estudo “Diagnóstico e Estratégia de Desenvolvimento do Empreendedorismo Sénior” concluem que os mesmos parecem ter sido trabalhadores preocupados com a sua vida profissional. Os cursos técnicos e as formações sobre empreendedorismo foram os mais frequentados, com 33% e 12,1% respectivamente, embora a grande maioria (82,3%) não possuísse um negócio próprio.

Importa ainda sublinhar que 54,7% dos respondentes estão em situação de desemprego há menos de dois anos e que, apesar de o principal motivo ser o encerramento da empresa empregadora (32,9%), existe uma fatia de 16,1% que está relacionada com o desajustamento das competências dos trabalhadores no que respeita a novos desafios estratégicos adoptados pela organização, levando assim ao despedimento.

[quote_center]Existe uma fatia de 16,1% de desemprego sénior que está relacionada com o desajustamento das competências dos trabalhadores[/quote_center]

O desejo de alcançar autonomia, independência e flexibilidade foi a principal motivação apresentada pelos respondentes para se tornarem empreendedores, seguindo-se a vontade de serem proactivos na procura de resultados e também a vontade de obterem maiores rendimentos. Todavia, o facto de a maioria dos participantes nesta análise revelar baixas motivações para a criação do seu próprio negócio é um forte sinal de alerta.

A dificuldade em encontrar falhas no mercado que possam originar a criação de negócio, os constrangimentos financeiros provocados pelo clima de instabilidade, e o desconhecimento de instrumentos ou mecanismos de apoio ao empreendedorismo assumem-se como as grandes dificuldades identificadas pelos cidadãos para a criação do seu próprio negócio. Em linha com os obstáculos identificados, os apoios ao desenvolvimento de ideias, a criação de acções de formação específica e de mecanismos de financiamento, a promoção de consultadoria especializada na criação de uma empresa e a criação de um serviço de acompanhamento do negócio são medidas que os inquiridos consideram fundamentais – e que gostariam de ver implementadas – para que possam criar o seu próprio negócio.

Importa ainda realçar que foi geral o desinteresse demonstrado pelos inquiridos em participar nas actividades previstas no âmbito do projecto Empreender 45-60, o qual poderá estar relacionado quer com os obstáculos acima mencionados (nomeadamente a não identificação de falhas de mercado), quer ainda com o facto de estarem conscientes das suas dificuldades e da eventual falta de competências para gerirem um negócio.

Pelos motivos apresentados, os autores do estudo concluem que “estamos perante potenciais empreendedores relutantes que precisam de ser sensibilizados para o empreendedorismo enquanto alternativa válida para a reentrada no mercado de trabalho”. Este facto justifica a importância da promoção de uma estratégia de apoio a este segmento populacional, nomeadamente através da criação de uma rede de contactos profissionais, do acompanhamento de técnicos experientes e de formação que lhes permita adquirir competências técnicas e ferramentas para fazer uma gestão sólida do seu negócio.

© Fundação AEP

Tornar fortes as fraquezas e procurar alternativas ao desemprego

Com base nos resultados do estudo acima apresentado, em entrevistas de grupo e em literatura especializada nesta temática, a equipa promotora do projecto Empreender 45-60 realizou uma análise SWOT (Strengths, Weakness, Opportunities e Threats) do empreendedorismo sénior qualificado. As principais forças (Strengths) identificadas são a experiência profissional e conhecimentos especializados nos sectores dos serviços e dos negócios, o desejo de autonomia e proactividade, e a procura de elevados rendimentos. Entre as fraquezas (Weakness) destacam-se a idade avançada, a desmotivação e a falta de competências na área das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC).

Já as principais oportunidades (Opportunities) são os fundos de apoio ao empreendedorismo, o reconhecimento de que a reestruturação económica origina o crescimento de desempregados seniores, a facilidade na criação de empresas, e a existência de formação especializada em empreendedorismo e de redes de acompanhamento e coaching. Por fim, as principais ameaças (Threats) são o facto de a maioria dos apoios serem direccionados aos jovens, uma cultura que não lida bem com o risco, a burocracia que existe em torno dos apoios governamentais e o facto de muitas startups enfrentarem grandes dificuldades.

[quote_center]É necessário fortalecer a ligação entre estes e os jovens, conciliando a experiência dos mais velhos com os conhecimentos de tecnologia dos mais novos[/quote_center]

Com esta análise em mente, os autores do estudo lançaram algumas recomendações, com o objectivo de apoiar este segmento populacional a encontrar no empreendedorismo uma alternativa viável ao desemprego.

De acordo com Michael E. Porter (citado no documento), economista e docente na Harvard Business School, existem três estratégias competitivas que poderão levar as empresas ou os empreendedores ao sucesso: a primeira é a estratégia pelos custos (através da prática de preços atractivos), a segunda é a estratégia pela diferenciação (através de produtos ou serviços próprios e bastante diferentes daqueles que a concorrência oferece), e a terceira é a estratégia pelo foco ou especialização (por via de produtos ou serviços destinados a nichos de mercado ou grupos específicos da população).

Seguindo esta teoria e tendo em conta as características da população e o meio onde esta vive, a equipa responsável pela implementação desta iniciativa considera que a estratégia de especialização é a mais adequada, ajudando a maximizar os benefícios do empreendedorismo sénior.

Já que este segmento populacional apresenta alguma relutância em receber formação e em apostar na criação de um negócio próprio, a equipa considera fundamental que seja promovida uma aprendizagem aberta, na qual as novas tecnologias são imprescindíveis. Adicionalmente, e em linha com esta questão, deve ser promovida a relação entre diversas gerações, a qual poderá ser uma solução capaz de atenuar alguns receios sentidos pela população sénior, nomeadamente no que respeita à utilização de tecnologia e das ferramentas que são utilizadas pelos mais novos para promover um negócio, fazendo-o chegar a um maior número de potenciais clientes.

Para além da relação entre os mais velhos e os mais novos, os promotores deste projecto julgam ser importante criar uma ligação directa entre os empreendedores e algumas entidades financeiras (entidades bancárias e de apoio ao microcrédito, por exemplo) ou plataformas de financiamento (como business angels ou plataformas de crowdfunding), bem como com uma rede de mentores com disponibilidade e vontade de acompanhar de perto a evolução das ideias e o crescimento dos negócios.

[quote_center]O desejo de alcançar autonomia, independência e flexibilidade foi a principal motivação apresentada pelos respondentes para se tornarem empreendedores[/quote_center]

Em suma, é necessário promover o diálogo entre gerações, facilitar a comunicação entre os empreendedores seniores e as variadas entidades que promovem o financiamento de negócios, e acompanhar de uma forma próxima e constante o desenvolvimento de ideias e negócios, dando a este segmento populacional as ferramentas e a confiança necessárias ao sucesso e evitando assim o prolongamento da situação de desemprego e todas as suas consequências.

E é a integração de todas estas necessidades e valências que dá origem à plataforma Empreender 45-60. Esta iniciativa, que no fundo se trata de uma comunidade de empreendedores, promove a superação das dificuldades e estimula a criatividade dos desempregados seniores, dando-lhes ferramentas que permitem encontrar alternativas ao desemprego.

A mesma plataforma pretende ainda fortalecer a ligação entre estes e os jovens, conciliando a experiência dos mais velhos com os conhecimentos de tecnologia e a as ideias inovadoras dos mais novos, beneficiando assim ambos os segmentos populacionais. Complementarmente, este projecto estimula também a criação de sinergias entre diferentes organizações e empreendedores, em que todas as entidades operam em clima de cooperação mas têm total independência e autonomia.

Por fim, entre os autores do documento predomina o desejo de que este projecto possa ser um ‘trampolim’ para o desenvolvimento de outras iniciativas de apoio ao empreendedorismo, especialmente junto da população entre os 45 e os 60 anos, contrariando assim o aumento do número de desempregados seniores qualificados, não só na região Norte do País como em todo o território nacional.

Jornalista