O mês de janeiro foi muito pródigo em eventos, seja por que continuamos a tentar recuperar de todo o tempo em que não nos podíamos encontrar, seja pela complexidade do mundo que exige múltiplas perspetivas e cocriação de ideias. Destaco dois deles, talvez pela simples razão de os ter acompanhado mais de perto: o World Economic Forum, em DAVOS, e a Conferência de Deans do EFMD (European Foundation of Management Development), em Madrid
POR MARIA DE FÁTIMA CARIOCA
Refletindo sobre estes dois eventos, ocorrem-me duas considerações introdutórias.
Primeira consideração é que o papel das empresas na solução de temas políticos, nomeadamente dada a sua capacidade para moldar a narrativa económica e social dos países onde estão presentes, foi de novo clarividente em DAVOS e fundamenta o valor e a missão das Business Schools, discutido no segundo fórum. Em concreto, as escolas que, como a AESE, são um espaço onde se debatem ideias, se criam iniciativas, se estabelecem parcerias, se perscruta o futuro e se preparam líderes. Por isso se diz que a educação, nomeadamente dos líderes, salva gerações. Grande responsabilidade a que respondemos com um grande compromisso.
Segunda consideração é que, entre tudo o que foi dito e escrito, pude constatar algumas questões e ideias interessantes e relevantes partilhadas em ambos os fóruns e que, sistematizando, me levam ao que se pode constituir como um bom referencial para equacionar o futuro.
Coloquemos então o futuro em equação. E que variáveis poderão fazer parte desta equação? Em primeiro lugar, como dimensões de fundo, há que considerar, naturalmente, o cenário geopolítico e o macroeconómico. Para não ir mais longe, basta recordar as tensões a nível global e a Guerra da Ucrânia com consequências que a todos estão a afetar e saber que, para 2023, em geral, se espera um panorama económico global ligeiramente melhor, apontando a um crescimento de cerca de 1,8%, mas com riscos pronunciados de uma recessão na Europa, a incógnita da saída da China da sua política Covid-Zero e os riscos persistentes em algumas economias da especial dependência de matérias-primas. A resiliência, quer pessoal quer organizacional, será um bom ponto de partida para lidar com estas variáveis.
Mas, na continuação, é importante refletir também sobre como o nosso mundo tão fragmentado e com um horizonte incerto, se pode transformar num catalisador de oportunidades. Por isso vale a pena acompanhar e debater temas como a demografia, as tecnologias emergentes, a industrialização, a sustentabilidade do planeta. Refiro-me, por exemplo, a tópicos como a maior longevidade ou o envelhecimento de muitos países em que a renovação geracional não acontece ou, já no campo da tecnologia, a evolução das GPT com base na Inteligência Artificial, a edição genética, a computação quantum, a hiper-conetividade ou as chamadas tecnologias verdes.
Todos estes temas são matéria para criativamente se pensar e abraçar a evolução dos negócios e do futuro, não apenas do trabalho, mas das organizações em geral, desde as empresas, passando pelas cidades, até às próprias famílias enquanto realidades humanas vivas e dinâmicas. Como será o futuro dependerá, seguramente, da fluidez do mundo dos negócios, mas será decisiva a capacidade das organizações para se adaptarem a novas iniciativas, novos desafios sociais a pedirem resolução, novos contextos geracionais, novas necessidades de talento e formação, novos conceitos de bem-estar, etc.. A maneira ágil, harmoniosa e atenta como, pessoal e colaborativamente, soubermos ir respondendo determinará a evolução económica e da própria sociedade, que todos ambicionamos mais humana, justa e inclusiva.
Daí a importância dos critérios que se assumem e a ponderação das decisões que se tomam. Uma visão estratégica míope ou a falta de coragem pode levar a decisões defensivas que hipotecam o futuro da organização e dos que nela trabalham. Por seu turno, uma audácia imprudente pode ser igualmente penalizadora. Na realidade, hoje, a disrupção e a mudança são mais fortes, a incerteza é mais generalizada, os desafios são mais diversificados, complexos e o impacto de tudo isto é mais profundo. É por isso, cada vez mais fundamental, e terá de ser uma constante ao longo da vida, a preparação para o exercício da liderança, através da aquisição de conhecimentos, do desenvolvimento de competências, do debate de ideias e da maturidade pessoal.
Por tudo isto, equacionar o futuro levar-nos-á, no essencial, a refletir sobre como vemos o futuro, como aspiramos a que seja o futuro e como podemos influenciar o futuro para que se concretizem os melhores sonhos que nele projetamos. Por outras palavras, a atentar como podemos liderar o futuro e como nos podemos preparar a nós mesmos para tal.
Ser líder, dirigir uma organização, qualquer que seja a sua missão e a sua configuração, nunca foi fácil. Certamente todos os que viveram ou vivem essa responsabilidade o sabem. Pode ser entusiasmante e muitas vezes divertido, pode ser muito gratificante, mas nunca, nunca é fácil. Por isso é bom recordar o que fazemos, porque o fazemos, com quem o fazemos. Dar-nos-á a dimensão exata do impacto que temos na vida dos que nos rodeiam e no futuro. E concluiremos que todos temos a grande possibilidade, e a correspondente responsabilidade, de construir, no dia-a-dia, os alicerces do futuro. Cabe-nos resolver a equação e decidir que futuro queremos para nós, para os nossos filhos e para os nossos netos.
Publicado originalmente no Jornal de Negócios. Republicado com permissão
Professora de Factor Humano na Organização e Dean da AESE Business School