Aparentemente existe falta de ambição quando se projetam os crescimentos económicos para os próximos anos, num país com tanto potencial como Portugal. Não é o cheque [do PRR] que nos conduz, mas o que fazer com o que temos e recebemos, com o valor que criamos, com a coragem em transformar. Temas que deviam ser discutidos com propostas concretas e construtivas para agilização de processos, alterações de critérios e envolvimento de todos
POR JOÃO PEDRO TAVARES
Quanto se soube que a União Europeia iria apoiar os países que estavam a sair da pandemia com o PRR – Plano de Recuperação e Resiliência, fiquei na dúvida se as obras que se anunciavam seriam ao abrigo da Recuperação ou da Resiliência pois surgiam como resposta a antigos desejos políticos.
Estes fundos têm como pano de fundo a transição digital, a transição climática e a resiliência, estando os pacotes para cada componente já negociados entre todos. Existe neste momento, e da parte do Governo, a possibilidade de se reprogramar o que está em atraso,
Todos se recordam do que foi a aprovação e formalização inicial do programa, com o primeiro-ministro a perguntar à Presidente da Comissão Europeia se já poderia ir ao banco levantar o prometido cheque. Acontece que a disponibilização dos fundos tem uma lei-travão que só disponibiliza os fundos mediante apresentação e validação de projetos em concreto.
Tendo passado mais de 30% do tempo (prevê-se terminar o programa em finais de 2026), verifica-se no site da “Estrutura de Missão Recuperar Portugal” que o nosso país ainda só acedeu a 11% dos fundos inicialmente previstos, no valor de 16,6 mil milhões de Euros. Já existiu um pedido da parte do Governo português para a prorrogação deste prazo, como reconhecimento do atraso que existe. Infelizmente só muito recentemente é que o Conselho Nacional de Finanças Publicas veio alertar para o real atraso na aplicação dos fundos, o que poderá comprometer a disponibilização da totalidade do valor.
Este apoio foi desenhado para aplicação primordial ao Estado (cerca de 60%) ficando uma parcela reservada às empresas (30%), ao contrário de alguns países europeus que o desenharam em proporções inversas. Infelizmente, no nosso país não se consegue ter uma visão convergente que envolva publico e privado, bem como o sector social (infelizmente pouco contemplado atualmente no apoio, mas que deveria ser considerado na reprogramação), discutindo-se sempre se algo deve ficar à responsabilidade do Estado ou do sector empresarial e corporativo. Uma visão convergente, inclusiva, abrangente seria uma enorme mais-valia numa economia que é, em termos relativos, cada dia mais pequena, que precisa de se desenvolver, para criar e distribuir mais riqueza, e para contribuir para maior bem-estar e condições de vida para todos, a começar pelos mais jovens.
Com os apoios contínuos que o nosso país tem recebido, ainda recentemente ao abrigo do Programa Horizonte Europa, seria muito importante que se medisse de que forma a aplicação destes fundos irá contribuir para o desenvolvimento, recuperação e resiliência do nosso país, para um maior desenvolvimento económico, maior justiça social, de forma a ter-se uma ideia da correta aplicação dos mesmos, dos mecanismos de escrutínio e eleição adotados e, por fim, da responsabilização de quem decide.
Aparentemente existe falta de ambição quando se projetam os crescimentos económicos para os próximos anos, num país com tanto potencial como Portugal. Não é o cheque que nos conduz, mas o que fazer com o que temos e recebemos, com o valor que criamos, com a coragem em transformar. Temas que deviam ser discutidos com propostas concretas e construtivas para agilização de processos, alterações de critérios e envolvimento de todos.
Presidente da ACEGE – Associação Cristã de Empresários e Gestores