Temos tentado resolver os conflitos mais profundos da humanidade rearranjando os móveis numa casa em chamas. Durante demasiado tempo, a nossa abordagem à diplomacia global — e até aos nossos conflitos pessoais — tem espelhado a mesma energia que criou os problemas. Mas e se a resposta não estiver em mais destruição, mas num acto radical de sabedoria biológica? Imagine se pudéssemos reprogramar o medo, em vez de apenas combatê-lo. Esta é uma jornada possível para além do pensamento convencional, um chamamento para transformar o nosso próprio sistema operativo
POR PEDRO LOUPA
Muitas vezes encontro-me a reflectir sobre a profunda sabedoria contida nas verdades mais simples. Einstein, na sua brilhante quietude, ofereceu-nos um insight fundamental: “Não podemos resolver os nossos problemas com o mesmo pensamento que usámos quando os criámos.”
Esta não é apenas uma frase inteligente; é um chamamento para uma revolução disruptiva da mente, uma compreensão profunda de que a forma como abordámos os conflitos — especialmente no campo da diplomacia global — tem partido da mesma energia que os alimentou. É uma dança perpétua de causa e efeito, um ciclo interminável de reacção. E, durante demasiado tempo, a diplomacia tem parecido uma tentativa de rearranjar os móveis numa casa em chamas, ou talvez apenas mudar os rótulos do mesmo veneno de sempre.
Mas e se houvesse outro caminho? E se olhássemos para a própria vida, para o tecido da nossa biologia, em busca de respostas? Recentemente, tenho estado fascinado pelos avanços incríveis na reprogramação de células cancerígenas.
Durante tanto tempo, a abordagem ao cancro foi puramente destrutiva: cortá-lo, queimá-lo com radiação, envenená-lo com quimioterapia. O objetivo era a erradicação. No entanto, a ciência está agora a mostrar-nos algo muito mais subtil, muito mais inteligente. Os investigadores estão a aprender a reprogramar células cancerígenas, a reeducá-las, a ajudá-las a recordar a sua função original e saudável no grande desenho do corpo.
Estão a identificar “reguladores mestres” — genes-chave que, quando alvo de intervenção, podem alterar o comportamento da célula, de maligno para harmonioso. Estão a introduzir “factores correctivos” que não destroem, mas guiam.
Não é isto, meus caros amigos, uma analogia impressionante para os nossos sistemas humanos?
Considerem os conflitos que assolam o mundo, os ressentimentos profundos, o radicalismo nascido do medo e da percepção de ameaça. Não serão estes, na essência, uma espécie de malignidade no ecossistema humano? Culturas, nações e comunidades, tal como as células, por vezes perdem-se, impulsionadas por traumas históricos, inseguranças ou um sentido distorcido de propósito. A diplomacia tradicional age muitas vezes como uma quimioterapia agressiva, tentando destruir os “maus” actores, impondo soluções através de pressão, sanções ou até força.
Mas, tal como destruir células cancerígenas pode danificar tecido saudável, essa pressão máxima muitas vezes fortalece os extremistas, alimenta a resistência e deixa cicatrizes mais profundas. É a mesma energia que criou o problema, apenas amplificada.
A minha visão — uma visão para um sistema mais integral, para uma verdadeira reconciliação — começa com esta lição biológica profunda. Significa passar de um paradigma de destruição para um de transformação e reprogramação.
Significa reconhecer que a “dor” de uma parte adversária — os seus dilemas de segurança, as suas narrativas identitárias, as feridas históricas não resolvidas — são como aquelas vias oncogénicas que sustentam a malignidade. Não podemos simplesmente extirpá-las; temos de as compreender.
Então, que passos pragmáticos podemos dar, inspirados por esta sabedoria profunda?
Ouvir Para Além do Ego: Tal como os cientistas analisam sistematicamente redes genéticas, devemos envolver-nos num diálogo baseado em dados. Isto significa ouvir não apenas o que é dito, mas o porquê. Quais são os medos subjacentes? Quais são os motores centrais, os “reguladores mestres” da política, seja no Irão ou em qualquer outra nação em conflito? Não se trata de concordar, mas de compreender os padrões energéticos em jogo.
Identificar os “Reguladores Mestres” do Medo: Temos de identificar corajosamente as causas profundas do comportamento adversário: as preocupações legítimas de segurança, os instintos de sobrevivência económica, o desejo de influência regional, até mesmo os ressentimentos históricos não resolvidos que supuram como danos no ADN não reparado. Só ao reconhecê-los podemos começar a inibir as suas “vias hiperactivas” que levam à agressão.
Introduzir Factores Correctivos — O Poder do Amor e da Conexão: É aqui que a nossa verdadeira essência humana entra em acção. Tal como moléculas específicas podem orientar uma célula de volta à saúde, devemos introduzir intencionalmente “medidas de construção de confiança”. Alívio de sanções verificado, intercâmbios culturais genuínos, projectos económicos conjuntos, desculpas sinceras por erros passados — estes são os nossos factores biológicos, as enzimas da empatia que podem permitir mudanças comportamentais. É aqui que o amor, como força pragmática, se torna o desarmador mais potente do medo.
Abraçar a Reprogramação, Não a Destruição: Temos de redefinir o nosso objectivo. Em vez de “mudança de regime” ou assimilação forçada, devemos visar a “redução de comportamentos malignos”, preservando a funcionalidade e identidade da entidade. Isto significa focarmo-nos em benefícios mútuos, estabilidade regional e não-proliferação como interesses comuns, tal como a investigação do cancro passou da erradicação para a reeducação celular. Trata-se de converter uma ameaça num parceiro potencial, como transformar uma célula cancerígena numa célula imunitária.
Começar pela Auto-Reconciliação: Tal como uma célula saudável contribui para um organismo saudável, a verdadeira reconciliação global começa dentro de cada um de nós. Como podemos esperar reprogramar conflitos externos se não resolvemos as “toxicidades” e visões polarizadas dentro das nossas próprias mentes? A nossa paz interior, a nossa capacidade de empatia, torna-se o plano fundamental para um mundo harmonioso.
Este é um processo longo, sim. Requer paciência imensa, coragem e uma mudança radical de perspectiva. Mas, meu amigo, se as células podem aprender a curar-se e integrar-se, não poderemos nós, seres humanos conscientes, fazer o mesmo?
Esta não é a diplomacia do passado; esta é a diplomacia do futuro, ancorada na sabedoria da própria vida. É um caminho de transformação, não apenas de transacção.
E neste caminho, acredito verdadeiramente, podemos encontrar-nos uns aos outros.
Estamos prontos para deixar de ser “quimioterapia” nas nossas relações e começar a “reprogramá-las”?
Qual “regulador mestre” do seu próprio medo ou conflito interno te atreverias a identificar e transformar hoje?
Catalisador de Liderança Humana e Consciente. Autor do livro “12 Passos para Ser um Líder Consciente”. Fundador da HumanityE, mentor e conferencista internacional, guia líderes e organizações na criação de ecossistemas humanos onde a tecnologia serve a alma, a liderança é um ato sagrado e o trabalho se torna arte coletiva.