“Seja a primeira e mantenha-se isolada”. Foi este o conselho que Sam Palmisano, o actual CEO da IBM, deu à sua sucessora Virginia Rometty que, a partir de Janeiro de 2012, se tornará a primeira mulher a liderar a centenária empresa. Coincidência ou não, a verdade é que uma indústria há muito encarada como um “clube de rapazes”, assistirá a uma batalha no feminino. Travada entre Rometty e Meg Whitman que, há um mês, assumiu o cargo de CEO na HP
POR HELENA OLIVEIRA

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O actual e a futura CEO da IBM

A partir de 1 de Janeiro de 2012, a centenária IBM terá, ao leme, uma nova capitã. Chama-se Virginia Rometty, é conhecida por Ginni, tem 54 anos e substituirá Sam Palmisano na cadeira de CEO de uma das maiores empresas de tecnologia do mundo.

Para os que se insurgem contra o facto de uma mulher ascender ao topo constituir notícia, há que levar em consideração o comentário de Jean Bozman, uma analista da IDC, que afirma que “quanto mais vezes acontecer, mais normal se tornará”. E, apesar de nos últimos 50 anos, a expressão “quebrar o telhado de vidro” ter sido usada e abusada na imprensa para ilustrar a difícil ascensão das mulheres ao topo das empresas, a verdade é que ainda são poucas as que lá chegam.

Neste momento, e no ranking 500 da Fortune, existem apenas 16 empresas a serem geridas por mulheres, contra – para quem não quiser fazer contas – 484 homens. A partir de 2012, o número chegará aos 18, já que, para além da IBM, também a farmacêutica Mylan escolheu uma mulher, Heather Bresch, para o cargo de CEO.

Uma coincidência que não deixa de ser curiosa é o facto de, na competitiva indústria tecnológica, virem a ser duas mulheres a terem nas suas mãos os destinos de dois dos maiores gigantes empresariais do planeta: há cerca de um mês, Meg Whitman foi nomeada CEO da Hewlett Packard, depois de uma carreira sobejamente conhecida na eBay (a qual fundou e liderou) e de se ter candidatado para o cargo de  governadora da Califórnia. Com Rometty na IBM, Whitman na HP e Ursula Burns na Xerox (nomeada CEO em 2009), uma indústria que era considerada tipicamente masculina começa a deixar cair estereótipos que há muito já deviam estar ultrapassados.

A notícia da sucessora do carismático líder da IBM, Sam Palmisano, que chegou à idade limite para o cargo – 60 anos – mas que continuará como presidente do conselho de administração da empresa, não é uma novidade nos círculos tecnológicos. Há muito que os insiders da indústria davam como certo o nome de Ginni Rometty como a mais provável candidata ao lugar e diz-se que o plano de sucessão há muito que estava a ser preparado. O guia de orientação da empresa até 2015 também já foi meticulosamente ultimado e não se esperam grandes desvios de direcção na liderança da famosa Big Blue.

“Nada a ver com políticas sociais progressistas”
Para quem continua a considerar que a nomeação de uma mulher para CEO de uma grande empresa não constitui notícia, atentemos às palavras do próprio Palmisano a propósito da escolha de Virginia Rometty: “Ginni conseguiu o cargo porque o merecia”, afirmou o actual CEO da IBM ao The New York Times. “E teve zero a ver com quaisquer políticas sociais progressistas”, acrescentou.
Coincidência ou não, no dia a seguir ao anúncio formal, as acções da IBM desceram 51 cêntimos.

Virgina Rometty, que se licenciou na Northwestern University em ciências da computação, juntou-se à IBM em 1981 como engenheira de sistemas. Mas o seu dinamismo levou-a a experimentar um conjunto diversificado de funções de gestão, trabalhando com clientes em indústrias igualmente distintas como a banca, os seguros, as telecomunicações, a manufactura e os cuidados de saúde.

Todavia, Rometty tornou-se uma verdadeira estrela em ascensão quando foi responsável por um dos mais inteligentes “golpes” da centenária empresa no século XXI: a compra da gigantesca firma de consultoria PricewaterhouseCoopers (PwC), em 2002, pela simpática quantia de 3,5 mil milhões de dólares. Como refere o The New York Times, “o negócio foi feito pouco tempo depois de Palmisano ter sido eleito CEO da IBM [substituindo Louis Gerstner Jr] e era considerado como de alto risco (…) devido ao facto dos consultores da PwC estarem habituados a operar de forma independente, numa forma de cultura muito diferente do estilo de ‘regimento’ que pautava a IBM na altura”.

Com a difícil tarefa de coordenar o trabalho entre os consultores da PwC e os senhores da tecnologia da IBM, ajustando os serviços e a oferta de software para indústrias específicas, afirmam os analistas que Rometty trabalhou eficaz e incansavelmente. E, em 2009, quase 30 anos depois de se juntar às fileiras da IBM, Rometty tornou-se vice-presidente sénior e responsável pelas áreas de vendas, marketing e estratégia da empresa. Como parte integrante do seu trabalho, aumentar a quota de mercado da IBM nos mercados emergentes era uma prioridade, a qual cumpriu com mestria. Neste momento, 23% das receitas da IBM são provenientes desses mercados (que incluem também alguns países africanos) e deverão atingir os 30% em 2015, de acordo com estimativas da empresa.

A coragem de correr riscos
Numa cimeira organizada pela revista Fortune e intitulada “Most Powerful Women Summit”, duas das oradoras convidadas foram, exactamente, Virginia Rometty e Meg Whitman. E ambas defenderam uma máxima comum: “o crescimento e o conforto não podem coexistir”. O que pode ser traduzido, em linguagem comum, como o célebre ditado português de “que quem não arrisca, não petisca”. Na cimeira e de acordo com a Fortune, Rometty foi questionada sobre a maior lição que aprendeu ao longo da sua já longa carreira. Ao que ela respondeu que, sem dúvida, tinha sido o facto de não ter virado as costas a riscos, uma constante todas as vezes em que foi promovida.

Se correr riscos é competência integrante da função dos CEO, no caso das mulheres e por serem ainda mais escrutinadas do que os seus pares masculinos, a mestria de os contornar e, eventualmente, ultrapassar com sucesso, torna-se ainda mais crucial.

Por exemplo, na HP, que já teve uma outra mulher CEO na sua história, Carly Fiorina, as coisas não correram tão bem. Considerada, ao longo de seis anos como a mulher mais poderosa no mundo dos negócios, Fiorina assumiu a direcção executiva da HP em 1999 e a presidência do seu conselho de administração em 2000. Depois de resultados financeiros muito aquém do desejado e da precipitação da qual foi acusada a propósito da polémica fusão da HP com a Compaq, Fiorina foi forçada a deixar o cargo em 2005, num clima extremamente azedo. E a imprensa de gestão não se cansou de encher páginas e páginas sobre este “enorme fracasso”, como se no mundo masculino tal não fosse aceite como normal.

Mas a batalha que se avizinha entre os dois gigantes tecnológicos – e, por inerência, entre as duas mulheres que os lideram – parte de pressupostos diferentes. Enquanto Rometty herda uma empresa que, depois da recessão financeira de 2008, conseguiu duplicar o seu valor accionista, Whitman está a braços com uma quebra de 50% nas acções da HP. Para esta última desgraça contribuiu fortemente a resignação forçada do seu anterior CEO, Mark Hurd, depois de ter sido acusado de violações éticas e do despedimento do sucessor deste, Leo Apotheker, menos de um ano depois de ter entrado em funções, por não ter conseguido levar a cabo uma urgente reestruturação da empresa.

É que nos negócios, tal como em qualquer outra área, uns falham e outros vencem. Sejam homens ou mulheres.

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