Durante anos rejeitei o rótulo de “feminista” e mantive-me à margem de grupos ou causas exclusivamente dedicados às mulheres. Parecia-me limitador, até redutor. Mas talvez tenha sido ingénua. Num mundo ainda desequilibrado — onde os homens continuam a ocupar a maioria dos lugares de poder e onde o cuidado continua a ser confundido com fraqueza — tornou-se urgente olhar de frente para as diferenças reais entre homens e mulheres. E reconhecer que é na empatia, na escuta e no pensamento de longo prazo — tantas vezes protagonizados por lideranças femininas — que pode estar a chave para um novo modelo de progresso
POR SOFIA SANTOS
Nunca me associei a dinâmicas feministas nem a grupos de mulheres em prol de causas. Sempre me rejeitei a fazer algo que critico: pertencer a grupos segmentados, que limitam a diversidade de pensamento, mantendo-se num conforto cristalizado que pode desacelerar o progresso. Nunca quis pertencer a um grupo que se coloca como oposição a outro, só pelo facto dos seus membros serem de géneros diferentes.
No entanto, talvez tenha de assumir que, mais uma vez, fui ingénua. Num Portugal ainda marcado por um conservadorismo anacrónico, a minha abordagem pode ser lida como indiferente aos problemas existentes entre os direitos e as oportunidades dos homens e das mulheres. Na realidade acredito que há muitas diferenças entre os dois géneros, e é da capacidade de interagir, respeitar a diferença e aprender com ela, que a evolução se pode fazer. No entanto, sem mútua empatia esse diálogo é muito difícil.
Talvez porque as minhas três referências paternais morreram, uma delas há 2 anos, e os outros dois há um mês, e porque tenho um filho do sexo masculino, sinto que faz falta falar-se muito mais das diferenças entre os homens e as mulheres, reforçando que é da dinâmica desta diferença que o progresso pode surgir. Acima de tudo quero educar um filho para ser empático, que tenha capacidade de ouvir, mudar de ideias e que se preocupe genuinamente em cuidar dos outros, coisa que vários estudos afirmam ser algo mais característico das mulheres.
Vivemos num mundo desequilibrado, liderado por homens. Vivemos num mundo onde um homem que é o presidente dos EUA, não é capaz de articular nenhuma frase ao nível institucional e protocolar que devia. Esse homem, não quer que as empresas apostem na diversidade, pois isso é uma ameaça ao seu poder. Numa ditadura, quanto menos diversidade de pensamento existir melhor, e é isso mesmo que este homem está a querer incutir. Uma abordagem puramente ideológica, pois existem muitos estudos que evidenciam que um conselho de administração diversificado está associado a melhor desempenho empresarial. E face a isto o que se ouve em Portugal? Nada. O que se debate sobre esta ameaça? Nada.
Por isso fui á procura de estudos sobre as características de liderança de mulheres e de homens, e deixo aqui algumas das conclusões que encontrei. Penso que o sistema de educação deveria reflectir sobre este tema…
As mulheres são diferentes dos homens. É científico. As mulheres têm tendência a cuidar mais dos outros, os homens têm tendência a explorar mais os outros
Estudos vários sugerem que as mulheres são mais atenciosas e empáticas na gestão em comparação com os seus colegas homens, o que pode levar a um ambiente de trabalho mais positivo e a um melhor desempenho organizacional.
As mulheres são mais empáticas, buscam mais informação e pensam a longo prazo
As mulheres tendem a ter uma inteligência emocional mais elevada, que inclui a capacidade de compreender e gerir as suas próprias emoções, bem como as emoções dos outros. Esta sensibilidade acrescida permite às líderes femininas estabelecer uma ligação mais profunda com os seus colaboradores, promovendo uma cultura de confiança e apoio. Os líderes empáticos são mais propensos a reconhecer as necessidades individuais dos membros da sua equipa, o que pode levar a uma melhoria do moral e da satisfação no trabalho.
As mulheres costumam adotar uma abordagem colaborativa à liderança, valorizando o trabalho em equipa e a contribuição coletiva, o que incentiva a comunicação aberta e a participação, fazendo com que os funcionários se sintam valorizados e ouvidos. Desta forma, ao promover um sentimento de comunidade no local de trabalho, as mulheres podem criar um ambiente mais solidário, onde os colaboradores se sentem motivados a dar o seu melhor. Nos contextos masculinos, normalmente quando surgem opiniões divergentes o tom das vozes aumenta mesmo que de forma inconsciente, e isso gera desconforto a um recetor que é empático. Para aqueles que não são empáticos, esse tom de voz é perfeitamente normal.
As mulheres tendem a investir mais tempo e dinheiro no crescimento pessoal e profissional dos seus colaboradores, o que não só melhora as capacidades dos funcionários, como também promove a lealdade e o compromisso com a empresa.
As mulheres normalmente valorizam diversas perspetivas ao tomar decisões, procurando obter opiniões de vários membros da equipa, resultando em escolhas mais equilibradas e informadas, o que pode levar a soluções inovadoras. Ao nível da resolução de conflitos, e devido á sua empatia, as mulheres focam-se na compreensão do tema e na busca da resolução das questões subjacentes, incentivando o diálogo e a colaboração para encontrar soluções mutuamente benéficas.
Os homens são mais agressivos, avessos à mudança e focados no curto prazo
Existem estudos que afirmam que que os homens podem apresentar uma abordagem mais exploradora ou autoritária nas suas práticas de gestão em comparação com as mulheres. Estes comportamentos de gestão estão assim associados a certas características masculinas decorrentes da educação, do contexto social. Os homens são frequentemente socializados para adotar comportamentos competitivos e agressivos, que podem manifestar-se como um estilo de liderança autoritário. Essa abordagem enfoca o controlo em detrimento da colaboração, levando a um estilo de gestão que pode explorar os talentos e o trabalho árduo dos funcionários sem reconhecer adequadamente as suas contribuições. Os líderes autoritários tendem a tomar decisões unilateralmente, potencialmente desconsiderando a opinião dos funcionários e sufocando a criatividade e a inovação.
Estudos sugerem que os líderes masculinos podem estar mais inclinados a priorizar resultados de curto prazo em detrimento da sustentabilidade de longo prazo. Isso muitas vezes leva a práticas exploradoras, como pressionar os funcionários a cumprir metas agressivas sem levar em consideração o seu bem-estar ou equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
Enquanto as mulheres são empáticas e procuram pela diversidade de opiniões para construir a sua, os homens tendem a ficar fechados nas suas verdades. Os homens em cargos de liderança podem, inconscientemente, perpetuar preconceitos de género que se podem manifestar em salários desiguais, falta de oportunidades de promoção para as mulheres e uma subvalorização geral das contribuições das mulheres no local de trabalho.
Os homens podem resistir a mudanças que promovam a inclusão e o envolvimento dos funcionários, percebendo essas mudanças como ameaças à sua autoridade. Essa resistência pode limitar as oportunidades para as mulheres e outros grupos, reforçando dinâmicas exploradoras dentro da organização. Ao apegarem-se a estruturas de poder tradicionais, os homens podem, inadvertidamente, perpetuar práticas exploradoras que prejudicam uma força de trabalho mais diversificada.
Reconheço, e os estudos também, que nem todos os homens e mulheres apresentam estes estilos de liderança. No entanto a informação disponível através das conclusões dos estudos permite-nos identificar um padrão de comportamento distinto entre o homem e a mulher. Vários estudos sugerem que certos comportamentos e normas culturais podem levar a abordagens mais autoritárias e competitivas entre os líderes masculinos. Essa dinâmica pode criar um ambiente de trabalho onde os funcionários se sentem subvalorizados e explorados. Em contrapartida, as mulheres costumam empregar um estilo de liderança mais colaborativo e empático, o que pode promover uma cultura organizacional mais saudável e solidária. Abordar estas disparidades nos estilos de liderança é crucial para criar locais de trabalho equitativos que priorizem o bem-estar e o desenvolvimento de toda a organização.
O mundo de hoje precisa de mulheres líderes sem medo de serem mulheres
Um estudo publicado na Harvard Business Review, sugere que as mulheres líderes são mais propensas a exercer uma liderança transformacional. Outro estudo da autora Jean Lau Chin conclui que as mulheres costumam apresentar uma abordagem mais relacional e acolhedora do que os homens, o que pode aumentar a coesão da equipa e o bem-estar dos funcionários.
É exatamente isso que necessitamos neste mundo distópico, onde a educação e o respeito parecem ter desaparecido, onde o egoísmo parece ter-se tornado abençoado, onde o lucro a dois dígitos se sobrepõe ao bom senso dos objetivos e ao bem-estar psicológico das equipas. Neste mundo onde os que vivem no conforto ignoram aqueles que trabalham por ele, é necessário mais do que nunca que as Mulheres ganhem força para gerir as empresas da forma como elas acham que devem ser geridas: focadas na continuidade do tempo, gerando valor para a comunidade, remunerando o capital a um valor justo e investindo da equipa e na inovação. Para fazer isto é necessário ser empático, pensar a médio prazo, ter um sentido de responsabilidade no que respeita a cuidar dos outros. Os estudos indicam que, de forma geral, os homens não são assim. Um egoísmo e narcisismo levado ao extremo leva-nos a Trump, com todo o impacto negativo que estes comportamentos estão a ter no planeta.
O mundo precisa hoje de gestoras mulheres sem medo de serem mulheres. Sem medo de serem muito diferentes dos homens.
Algumas das fontes utilizadas para escrever este artigo:
McKinsey & Company – “Women in the Workplace” Reports;
Catalyst Research – “Women in Leadership”;
The Female Leadership Advantage, December 2003, Harvard Business Review;
Eagly, A. H., & Carli, L. L. (2003). The female leadership advantage: An evaluation of the evidence;
The Leadership Quarterly, 14(6), 807–834;
Catalyst (2007) Catalyst Census of Women Board Directors of the Fortune 1000;
Glick, P., & Fiske, S. T. (1996). The Ambivalent Sexism Inventory: Differentiating hostile and benevolent sexism. Journal of Personality and Social Psychology, 70(3), 491–512 ;
What Every Leader Needs to Know About Followers, by Barbara Kellerman, December 2007 Harvard Business Review;
Sofia Santos é CEO da Systemic. É economista e especializada em sustentabilidade e financiamento climático, com 27 anos de experiência profissional entre bancos, empresas, ONG, setor público, e agências bilaterais e multilaterais em Portugal e em África. É licenciada em Economia pelo ISEG, mestre em Economia pelo Birkbeck College na Universidade de Londres e Doutorada pela Middlesex University em Londres sobre o papel dos bancos na promoção do desenvolvimento sustentável