A Siemens quer ser a primeira grande empresa industrial a alcançar uma pegada de carbono zero. Para além de constituir “um forte compromisso com as gerações futuras”, esta meta “é também um claro business case positivo”, defende, em entrevista a Environment Health & Safety Manager do departamento Business Development and Excellence da empresa em Portugal
POR GABRIELA COSTA

A Siemens quer ser a primeira grande empresa industrial a alcançar uma pegada de carbono zero até 2030. Para tanto investirá nos próximos três anos cerca de 100 milhões de euros para reduzir as suas emissões de CO2 em 50%, até 2020, e melhorar a sua eficiência energética.

Em entrevista, Ana Teresa Gomes, Environment Health & Safety Manager do departamento Business Development and Excellence da Siemens, explica como combinar a produção de energia – como centrais de produção distribuída, energia eólica e energia fotovoltaica – com soluções de armazenamento e tecnologias inteligentes de gestão de energia é um cenário do futuro que já tem exemplos no presente.

Edifício da nova sede da Siemens em Munique
Edifício da nova sede da Siemens em Munique

Para além dos benefícios para os negócios da Siemens a nível global (redução de custos, reputação, etc.), que vantagens traz esta estratégia de alcançar um impacto neutro no clima nos próximos 15 anos, em termos de crescimento económico e do emprego?

A nossa meta de alcançar uma pegada de carbono zero, para além de ser um forte compromisso com as gerações futuras, é também um claro business case positivo, uma vez que vamos estar a investir em eficiência energética e nas nossas próprias soluções.

Entre outras acções, iremos investir 100 milhões de euros em medidas de eficiência energética nas nossas instalações. Logo aí, haverá dois efeitos colaterais positivos: a maioria destas soluções já faz parte do nosso portefólio, e existe um business case positivo para fazer este investimento, uma vez que esperamos amortizá-lo nos próximos cinco anos, acompanhado de uma poupança anual de 20 milhões de euros.

Vamos ainda utilizar as nossas instalações para demonstrar os benefícios dos sistemas de produção de energia distribuída. Combinar a produção de energia, tal como centrais de produção distribuída de energia, energia eólica e energia fotovoltaica com soluções de armazenamento e tecnologias inteligentes de gestão de energia, é um cenário do futuro que já tem exemplos no presente. Queremos criar demonstradores de tais tecnologias nas instalações da nossa empresa.

Para além disso, a eficiência energética não se limita a instalações de produção. Considerando que a frota de automóveis da Siemens (cerca de 45 mil veículos) é responsável por cerca de 300 mil toneladas de emissões de dióxido de carbono (CO2) por ano, estamos a incluir os veículos de empresa na meta de chegar a uma pegada de carbono zero.

Por fim, vamos mudar as nossas directrizes de compra de energia e avançar para um mix de energia significativamente mais limpo, com um forte foco nas energias renováveis e no gás. Podia até dizer-se que iremos comprar energia produzida nas instalações dos nossos clientes pelas nossas próprias tecnologias.

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A longo prazo, como irá este gigante tecnológico implementar tecnologias inovadoras, como sistemas de gestão, de automação e de eficiência, para garantir uma pegada de carbono neutra em todos os seus edifícios, instalações de produção e unidades de negócio, entre 2020 e 2030?

Neste momento, a nível mundial, as nossas emissões de CO2 rondam os 2,2 milhões de toneladas métricas por ano, um número que esperamos reduzir para metade até 2020. Para concretizar este e outros objectivos, vai ser feito um investimento, durante os próximos três anos, de cerca de 100 milhões de euros para diminuir a pegada de carbono das instalações de produção e dos edifícios que a empresa tem em todo o mundo.

Este desafio é particularmente interessante, uma vez que esperamos alcançar este objectivo fazendo uso de muitas das nossas tecnologias inovadoras. E esta estratégia não só nos permite ser uma empresa mais sustentável, como vai permitir poupar milhões de euros. Os nossos sistemas de gestão de energia, de automação para edifícios e processos de produção, assim como sistemas de accionamento energeticamente eficientes, vão permitir reduzir os nossos custos de energia em 20 milhões de euros por ano.

É ainda importante referir que foram também estas as soluções que, em 2015, permitiram aos nossos clientes reduzir as suas emissões de CO2 em 487 milhões de toneladas, um montante igual a metade do total das emissões de dióxido de carbono na Alemanha. Como resultado adicional, estes clientes conseguiram melhorar a sua eficiência energética e aumentaram a sua competitividade.

[pull_quote_left]Vamos avançar para um mix de energia significativamente mais limpo, com foco nas energias renováveis e no gás[/pull_quote_left]

No âmbito deste programa de redução de emissões, que arranca já este ano, a Siemens vai investir cerca de 40 milhões de euros em 15 unidades de produção de diferentes partes do mundo para melhorar a sua eficiência energética. A nova sede da Siemens em Munique — que já cumpre as normas mais rigorosas de respeito pelo ambiente, conservação de recursos e construção sustentável — afigura-se desde já como um enorme contributo para este objectivo.

Em suma, para reduzir as emissões de CO2 a longo prazo, vão ser desenvolvidas três iniciativas fundamentais: vamos passar a utilizar os nossos próprios sistemas de energia em todas as fábricas e edifícios administrativos para optimizar os custos de energia; vamos passar a utilizar sistematicamente veículos de baixas emissões; e vamos aplicar os conceitos de e-mobilidade a toda a nossa frota de carros e avançar para um mix de energia limpa, utilizando cada vez mais fontes de energia com emissões de CO2 zero ou muito reduzidas — tais como gás natural e energia eólica.

O CEO da Siemens esteve presente na COP 21, Cimeira para a qual a empresa subscreveu a carta aberta do Fórum Económico Mundial, dirigida por 78 CEOs aos líderes mundiais, num apelo ao papel fundamental das empresas sobre a acção climática. O que é prioritário em matéria de soluções empresariais para combater as alterações climáticas?

As soluções e inovações tecnológicas são um dos elementos mais importantes na redução das emissões dos gases com efeito estufa. Estas proporcionam diversas vantagens, que vão além do controlo das emissões de carbono, tais como a segurança energética, a redução de custos e a redução da poluição atmosférica. O desenvolvimento destas soluções é uma das nossas principais prioridades.

Em linha com esta estratégia, reunimos todos os nossos produtos, sistemas, soluções e serviços, passíveis de reduzir impactos negativos no ambiente e emissões de dióxido de carbono ou de outros gases com efeito de estufa, no nosso portfólio ambiental. Este reúne soluções e serviços que visam maximizar a eficiência energética nos sectores que mais dela necessitam, como os edifícios (cerca de 23% dos consumos energéticos mundiais em 2013, incluindo edifícios comerciais e residenciais); indústria (cerca de 50% dos consumos energéticos mundiais em 2013) e transportes (cerca de 27% dos consumos energéticos mundiais em 2013).

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Como comenta as metas do acordo global sobre o Clima alcançado na COP 21?

Foi um acordo histórico e de extrema importância para resolver um dos mais preocupantes flagelos do nosso planeta e é, sem dúvida, um ponto de viragem rumo a um mundo descarbonizado. Conseguir que 195 países estejam alinhados para assegurar que o aumento da temperatura média global fique apenas 2°C acima dos níveis pré-industriais, e prosseguir os esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C, é um importante primeiro passo para garantir que haverá uma redução drástica dos riscos e impactos das alterações climáticas.

E é claro que a Siemens está disponível para apoiar a transição para uma economia de baixo carbono, tanto com o seu portfolio ambiental como com o seu programa de redução de emissões de CO2.

A Siemens Portugal acompanha esta aposta no ambiente há anos, desenvolvendo inúmeros projectos para reduzir a sua pegada. Como comenta esta aposta da filial portuguesa, antes mesmo de beneficiar do financiamento inerente ao programa de redução de CO2 do Grupo (que arranca em 2016), e atendendo à pequena dimensão do País e à estrutura do seu tecido empresarial, essencialmente constituído por PME?

A Siemens em Portugal, tal como no resto do mundo, age com uma perspectiva “Business to Society”, ou seja, acredita que o negócio só faz sentido se estiver ao serviço da sociedade. Dai termos vindo a desenvolver diversas iniciativas, que visam diminuir a nossa pegada ecológica, antes mesmo de a casa-mãe lançar esta iniciativa.

[pull_quote_left]Esperamos reduzir para metade as nossas emissões de CO2 até 2020[/pull_quote_left]

A título de exemplo, estamos actualmente a participar num projecto-piloto, lançado pela ALD Automotive (empresa especializada em aluguer operacional e gestão de frotas do Grupo Société Générale) e pela ADENE, que visa lançar as bases do processo de certificação energética para frotas automóveis.

Já a sede da Siemens em Alfragide, um edifício com mais de 25 anos, tem vindo a ser intervencionada de forma a ser mais eficiente. O edifício da cantina, por exemplo, tem instalado 40 painéis colectores solares que asseguram o aquecimento das águas sanitárias. Foram também substituídas as lâmpadas normais existentes nas instalações da empresa por leds de menos consumo energético e maior eficiência, entre muitas outras iniciativas. Como resultado destas e de outras medidas, em 2014 conseguimos reduzir os nossos consumos energéticos em 4%, comparativamente ao ano anterior.

Concretamente em relação ao projecto de baixo carbono 3i Buildings, apresentado como uma das 32 soluções do BCSD para as alterações climáticas, e que é uma ferramenta de gestão integrada de edifícios, considera que traduz a importância que a Siemens vem dando às cidades inteligentes? Que evolução esperam para as cidades do futuro, nomeadamente ao nível do contributo dado pelas empresas?

O 3i Buildings capta e gere, em tempo real, dados gerados no interior do edifício, provenientes de diferentes sistemas de operação, como por exemplo a qualidade do ar, temperatura ambiente, estudo de percursos ou tráfego, contagem e fluxo de utilizadores, manutenção e segurança. Estes dados contribuem para a optimização do edifício e conforto dos utilizadores e são determinantes, por exemplo, para monitorizar a quantidade de CO2 emitida ou a energia consumida.

Se tivermos em consideração que, a nível mundial, os edifícios são responsáveis por mais de 40% do consumo de energia por parte dos utilizadores finais, então, sem dúvida que o desenvolvimento de ferramentas como o 3i Buildings, entre outras, reflectem a importância que damos às cidades inteligentes. Ao automatizar e integrar diferentes subsistemas nos edifícios podemos ajudar as cidades a alcançar as suas metas de CO2 e a reduzir os custos.

Uma gestão eficiente de energia num edifício pode representar poupanças de até 30%. Por exemplo, ainda recentemente, a Siemens apoiou o município de Copenhaga na tarefa de identificar como as tecnologias poderiam ajudar a reduzir as emissões de CO2. Entre as conclusões, constatou-se que se a cidade trabalhasse com os 40 maiores proprietários de edifícios, e aplicasse nestas infra-estruturas tecnologias modernas, poderia reduzir as emissões de CO2 em mais 10%. Trata-se, na verdade, de investimentos de ganho mútuo, uma vez que a cidade não só reduziria o consumo de energia e respectivos custos, como também as emissões de CO2. Além disso, os investimentos iniciais estariam amortizados em menos de cinco anos.

No futuro esperamos que as cidades sejam mais inteligentes e mais digitais. Na Siemens, temos demonstrado como uma infra-estrutura inteligente é significativamente superior a outros sistemas de infra-estruturas, porque consegue, por exemplo, acelerar o tráfego em 20%, aumentar a capacidade de transporte de comboios em 30%, reduzir o consumo de energia nos edifícios em 30% ou poupar até 40% nas expansões das redes de energia. Desta forma, adicionar uma componente digital às infra-estruturas tem o potencial de reduzir custos, baixar consumos de energia, diminuir emissões nocivas e melhorar a qualidade de vida.

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Jornalista

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