As autoridades não devem apenas exigir mais reporte de informação não financeira, mas sim que os dados relativos aos três pilares ESG sejam devidamente auditados. Neste aspeto, a Europa vai no sentido certo. Mas mais relevante é a vontade dos conselhos de administração das organizações. As promessas de descarbonização ficam bem nas conferências de imprensa e nos relatórios de sustentabilidade. Porém, valem de pouco se as organizações não passarem à ação
POR BRUNO PROENÇA

Pascual Berrone, professor do IESE Business School da Universidade de Navarra, levantou uma questão que é difícil de responder (cabalmente): tendo em consideração todas as promessas e compromissos de empresas e países relativamente à redução das emissões de gases com efeitos de estufa, como é que ainda não conseguimos resolver o problema do aquecimento global? A realidade mostra uma evolução em sentido negativo. Os últimos números da Agência Internacional de Energia revelam que, em 2023, atingiu-se novo recorde nas emissões de CO2 resultantes da produção de energia. O novo valor máximo fixou-se em 37,4 mil milhões de toneladas de carbono, mais 1,1% (ou 410 milhões de toneladas) do que em 2022.

O professor do IESE Business School coloca a questão no seu livro “Green Lies: How Greenwashing can destroy a company (and how to go green without the wash)”. Para Pascual Berrone, há um enorme abismo entre o que os países e organizações dizem e o que fazem na prática. Nem tudo será “greenwashing” deliberado e doloso, em muitos casos será somente incapacidade ou falta de determinação para cumprir as promessas assumidas junto dos “stakeholders”.

As informações mais recentes da Science Based Targets initiative (SBTi), uma organização apoiada por várias entidades não lucrativas que verifica os planos de descarbonização das empresas, comprovam isso mesmo. No âmbito da COP26, em 2021 em Glasgow, mais de 1.000 empresas, que representavam uma capitalização bolsista de 23 biliões de dólares, comprometeram-se com a meta do “net zero” em termos de emissões de gases com efeitos de estufa. Passados quase três anos, centenas ficaram pelo caminho por terem falhado a apresentação de planos para atingirem o “net zero” ou por terem avançado com medidas insuficientes. Na lista dos falhanços estão gigantes como a Microsoft ou a Unilever.

Em resumo, das 1.045 empresas que se juntaram, entre 2019 e 2021, à campanha para se fixar o aquecimento global em 1,5 ºC, mais de 230 não submeteram os devidos planos, pelo que foram retiradas da iniciativa pela SBTi.

Um estudo feito por investigadores do MIT, a partir de dados relativos a empresas enquadradas na iniciativa da SBTi, chega também a uma conclusão interessante. Apesar de todas as empresas se comprometerem com a redução das emissões de gases com efeitos de estufa, na verdade somente as que estão sujeitas a uma auditoria do seu processo de descarbonização é que apresentam resultados positivos. Estas empresas reduziram a sua intensidade carbónica em 3,3% por ano, em média.

Por outro lado, as organizações que se sujeitam a auditorias registam uma intensidade carbónica 9,5% superior às empresas que não são auditadas. Para os investigadores, isto significa que as organizações auditadas têm um reporte mais verdadeiro do que as outras. Por outras palavras, seguem menos práticas de “greenwashing”.

Perante estes estudos e dados, que políticas devem ser seguidas? Parece óbvio que as autoridades não devem apenas exigir mais reporte de informação não financeira, mas sim que os dados relativos aos três pilares ESG sejam devidamente auditados. A última diretiva da União Europeia sobre as obrigações de reporte de informação não financeira exige precisamente que as informações das empresas sejam auditadas. Neste aspeto, a Europa vai no sentido certo.

Porém, talvez mais relevante seja a vontade dos conselhos de administração das organizações. As promessas e compromissos de descarbonização são importantes e ficam bem nas conferências de imprensa e nos relatórios de sustentabilidade. Mas valem de pouco se as organizações não passarem à ação. E isso depende dos CEO e colegas do “board”.

Ciências e Factos

Banco Europeu de Investimento

O Banco Europeu de Investimento (BEI) é a entidade europeia que promove o desenvolvimento multilateral. No passado recente, fez um compromisso forte com o financiamento de projetos ESG. Agora, 14 países europeus, incluindo Alemanha, França e Itália, exigem uma alteração radical de prioridades: o BEI deverá financiar a política militar europeia. Mais um sinal da mudança dos tempos.

União Europeia

No início de Abril, o Conselho Europeu aprovou duas diretivas importantes na área ambiental: a diretiva da diligência em sustentabilidade corporativa e a diretiva que coloca restrições às importações de plástico reciclado. Ainda assim, os textos finais mostram um recuo relativamente às exigências iniciais da Comissão Europeia.

Artigo originalmente publicado no Jornal de Negócios >>. Republicado com permissão.

Professor de Política de Empresa e Prof. Responsável do Short Program
“Sustentabilidade: implementar ESG nas empresas”