No dia 21 de março foi o Dia Internacional contra a Discriminação Racial. Mas será que em 2021 faz sentido haver um dia Internacional deste tipo? Sim, muito. Que o digam as pessoas que todos os dias são alvo de racismo
POR CLÁUDIA PEDRA
Os dias internacionais vêm e vão, muitas vezes sem a reflexão necessária por detrás da efeméride. Este dia internacional, muito imbuído pela necessidade de combater atrocidades como as que eram cometidas durante o regime do apartheid, infelizmente ainda não é anacrónico. O apartheid como regime pode ter desaparecido ainda no século 20, mas o racismo estrutural e os incidentes de discriminação diários são constantes ainda no século 21.
Como qualquer ideologia assente em preconceitos e estereótipos, combater o racismo implicaria um profundo investimento em educação para os direitos humanos (EDH) e na desconstrução das narrativas racistas. A ausência dessa EDH consistente e de campanhas públicas de informação, traduz-se em gerações que crescem sem noção dos mais elementares princípios de dignidade e direitos humanos, com atitudes discriminatórias recorrentes. Mais tarde estas pessoas tornam-se dirigentes de organizações e organismos (públicos, privados e da economia social), que não promovem verdadeira igualdade de oportunidades. Pessoas que olham para a cor da pele, a etnia ou a nacionalidade como fatores negativos, e que impedem pessoas qualificadas de aceder a funções para o qual têm todas as competências necessárias (humanas e profissionais).
Infelizmente estas pessoas encerram em si uma cegueira provocada por esses preconceitos e estereótipos, que as impedem de ver os inúmeros benefícios organizacionais de ter uma força de trabalho diversa. A realidade é que uma organização diversa é uma organização mais eficiente, mais eficaz, e até mais competitiva. Uma organização diversa consegue ser mais criativa e inovadora, mais atrativa para os mercados, mais credível. Uma organização diversa consegue tomar decisões estratégicas assente em perspetivas diferentes e consegue resolver problemas complexos, assente na experiência que a sua diversidade lhe traz. Atrai investidores e parceiros e tem as bases que permitem mais sucesso na sua escalabilidade.
Outro fator interessante prende-se com as dinâmicas internas. Uma organização diversa tem melhores processos de recrutamento e seleção, consegue manter as pessoas mais motivadas para trabalhar e permite uma maior aprendizagem e desenvolvimento pessoal e profissional. É claramente um melhor sítio para trabalhar.
Contudo, a diversidade e inclusão em contexto organizacional não pode ser algo desenvolvido apenas para fazer um check numa lista invisível de boas práticas, ou por razões de mera visibilidade e cumprimento de obrigações regulamentares. Há que garantir que todas as camadas da organização (desde a liderança de topo) estão verdadeiramente investidas no processo e que estão dispostas a fazer as mudanças necessárias para o conseguir. Isso vai implicar muitas vezes repensar, de raiz, programas de recrutamento e seleção, a condução de entrevistas, o modo como se faz o processo de indução, a integração em equipas, as lideranças, a formação ou o processo de aprendizagem organizacional. Implica pensar nas dinâmicas do dia-a-dia, identificar as micro agressões que fazemos muitas vezes sem consciência (no fluir da conversação), ou as atitudes discriminatórias que os nossos preconceitos e estereótipos nos conduzem a fazer. Há que tomar consciência. Contrariar o que o nosso cérebro primitivo nos insta a fazer e ripostar com atitudes conscientes de diversidade e inclusão.
Voltando ao dia internacional, podemos sempre lembrar-nos que a mudança sistémica – a mudança de mentalidades e comportamentos que provocam transformação social – começa sempre com pequenas mudanças que se traduzem em grandes transformações ao longo do tempo. Comecemos por nós e pela nossa organização e depois virá o mundo.
Managing Partner da Stone Soup Consulting e Directora da Associação de Estudos Estratégicos e Internacionais (NSIS - Network of Strategic and International Studies)