O Papa convoca os jovens para um encontro de compromisso. E aqui começam as diferenças de paradigma. A Economia de Francisco não é um think tank que emite opiniões e não é, seguramente, um novo modelo económico que vai ser apresentado. A Economia de Francisco é um compromisso desenhado pelos jovens para jovens
POR RICARDO ZÓZIMO

Em Setembro deste ano, a reputada revista Inglesa The Economist fazia uma manchete fácil com o título Popenomics. O texto focava-se no encontro de Assis que o Papa organiza em Março de 2020 com economistas, jovens lideres e empreendedores sociais. Popenomics expressava, de uma forma vaga, o que poderia ser esperado do pensamento económico deste Papa e como esse pensamento pode ser considerado particularmente desafiador de diversas correntes económicas contemporâneas.

O texto do The Economist mostra um pouco a surpresa dos economistas em relação à falta de teoria económica expressa por um Papa que tem como foco trazer a mensagem da Igreja para dentro da família e da casa de cada um. Este é um Papa que invade o espaço social e económico com facilidade e, quiçá por isto, vários pensadores de economia têm expressado a sua surpresa pela falta de uma mensagem económica mais clara do Papa.

Ao analisar esta questão penso que é certo afirmar que o Papa Francisco tem uma forma muito própria de se expressar sobre as questões que afetam a vida das famílias. Claramente o Papa fala do mundo através da sua experiência, das suas visitas e, sobretudo, daquilo que vai observando no mundo visto através da rede que é a Igreja. Uma rede que congrega ricos e pobres, afortunados e desafortunados, jovens e não tão jovens. Esta visão muito alicerçada na realidade tem um potencial enorme de entrar em choque com o pensamento de muitos economistas que tentam explicar o que acontece no mundo de uma perspetiva teórica sem nunca terem experienciado parte do mundo e as dificuldades a que o Papa se refere.

Ao contrário da perspetiva do The Economist, quem tem seguido mais de perto os escritos do Papa Francisco nota que o pensamento económico está bem articulado desde 2015 na encíclica Laudato Si. Claro que esta encíclica – uma das maiores alguma vez escrita durante um pontificado – tem um foco muito particular na ecologia integral e de como todos devemos olhar para a missão de cuidar da casa comum. Mas, na verdade, o Papa vai bastante mais longe ao ligar, de uma forma direta e articulada, todo o movimento de cuidar da casa comum a conceitos económicos. Só para contextualizar com um exemplo, a palavra ‘economia’ é usada 22 vezes na encíclica em contextos distintos. Por exemplo, na nota 16 que resume os eixos fundamentais da mensagem do Papa, a economia é vista como central para que se pense o progresso de toda a sociedade. O que este pequeno exemplo mostra é que, a partir desta forma de estar tão característica, o Papa Francisco vem, mais uma vez, mudar o paradigma e desta vez olhar com fé para as questões da economia.

Mas o mais especial e talvez até surpreendente desta proposta de Assis é mesmo a forma e, por ora, não o seu conteúdo. Ao mudar a forma, o Papa Francisco pede-nos para colocar os jovens no centro da mudança. E pede que esta nova economia seja revisitada a partir do pensamento dos jovens. Aqui, arrisco-me a dizer que o Papa Francisco se inspira na irreverência do sempre jovem S. Francisco de Assis, cujo o nome tomou e que norteia este encontro. A história do jovem S. Francisco mostra-nos o que pode fazer a combinação de força interior, ingenuidade e sonho!

Tudo começa no convite dirigido aos jovens. O Papa convoca os jovens para um encontro de compromisso. E aqui começam as diferenças de paradigma. A Economia de Francisco não é um think tank que emite opiniões e não é, seguramente, um novo modelo económico que vai ser apresentado. A Economia de Francisco é um compromisso desenhado pelos jovens para jovens. E claramente é no espaço e tempo de Assis que este compromisso vai ser desenhado, conversado e aceite pelos jovens. Mas num mundo que impõe tantas vezes aos jovens o que eles devem ser ou pensar, o Papa muda o paradigma ao colocar os jovens e o seu compromisso no centro do encontro de Assis.

E esta centralidade dos jovens atravessa toda a forma como o programa está desenhado. O Papa pediu ao Professor Luigino Bruni para organizar este encontro, motivando-o a que colocasse os jovens no centro. Bruni e a sua equipa assim o fizeram convocando 25 jovens do mundo inteiro para serem os principais organizadores do encontro. Mas eles não o fazem com as suas opiniões, pois o encontro está a ser desenhado com base na motivação expressa nas milhares de candidaturas já recebidas pela organização.

Bebendo deste espírito, bastantes atividades têm acontecido em Portugal. Em particular a ACEGE, através do seu braço ACEGE NEXT e em parceria com a Universidade Católica Portuguesa, a AESE e a NOVA SBE, propuseram um curso de preparação para a economia de Francisco. Através de sessões e experiências desenhadas nestas Universidades, os mais de 50 jovens entre 25-40 anos, iniciaram uma viagem que levará a voz de Portugal ao encontro de Assis. Esta viagem coletiva até Assis está desenhada nos pilares da proposta da Economia de Francisco: o desenvolvimento de um modelo económico que gere uma economia inclusiva, que seja centrada nos jovens e que cuide do ambiente de uma forma sustentada.

A esta distância, é difícil prever a transformação que o encontro de Assis pode operar nos sistemas económicos globais. Penso até que os economistas do The Economist podem estar descansados ao nível da mudança dos conteúdos teóricos subscritos e defendidos pelo Papa Francisco. O que não é possível antecipar é a transformação que 50 jovens portugueses, em partilha com mais de 1500 jovens de todo o mundo, trarão para as suas empresas, organizações e vidas pessoais depois deste encontro com a Economia de Francisco(s). De uma coisa tenho a certeza. Este encontro vai transformar e esta transformação está em boas mãos!

Professor Universitário de Empreendedorismo e Sustentabilidade na Nova SBE