Durante uma crise não são apenas as ideias que são desafiadas mas também a cultura e as relações. As instituições que se preocuparam por criar uma cultura solidária e formar um ambiente colaborativo onde todos se sentem parte de algo comum, estão melhor preparadas para enfrentar as dificuldades
POR MARTA LINCE DE FARIA
Será que os momentos de crise são aqueles onde verdadeiramente se põe à prova a “fibra ética” de uma instituição?
Há dois modos de responder a esta pergunta. A resposta pessimista e parcial, resume-se a dizer “óbvio que sim”. Nas crises as dificuldades aumentam, a pressão sobre os decisores é maior e, portanto, quando fazer o que está mal for mais fácil ou conveniente do que fazer o que está certo, as pessoas menos firmes nos seus valores vão muito provavelmente ceder.
A resposta realista e abrangente parece-me, no entanto, ser a mais interessante. Em qualquer crise, todas as dimensões da gestão são postas à prova: a estratégia, o marketing, as finanças, etc. Durante uma crise não são apenas as ideias que são desafiadas mas também a cultura e as relações. As instituições que se preocuparam por criar uma cultura solidária e formar um ambiente colaborativo onde todos se sentem parte de algo comum, estão melhor preparadas para enfrentar as dificuldades.
Em primeiro lugar, se em circunstâncias normais as pessoas se sentem apoiadas e valorizadas é muito natural que quando a situação se complica queiram apoiar-se mutuamente e apoiar a instituição. Se, pelo contrário, se sentiram constantemente postas em causa e ameaçadas, não chegaram a considerar que faziam parte de um projeto comum e, por isso, agora o seu único objetivo vai ser defender o seu bem privado. Em segundo lugar, é importante considerar que mais pesado do que enfrentar problemas graves é a solidão de os termos que enfrentar sozinhos. Quando as relações estão desgastadas, a direção fica isolada com os problemas do negócios, aos quais se acrescem os problemas derivados do facto dos colaboradores pressentirem os riscos da crise. Em terceiro lugar, porque são os desafios que nos fazem crescer enquanto pessoas e enquanto instituições. Quando o ambiente é colaborativo todos estão dispostos a fazer sacrifícios para salvar o todo, assim como as partes do corpo atuam de modo a proteger o bem do todo. Ultrapassar desafios em conjunto consolida ainda mais uma cultura colaborativa e dá provas de que um projecto é genuinamente comum, independentemente das circunstâncias serem favoráveis ou adversas.
Além disso, é importante considerar que numa sociedade em que perdemos demasiado tempo a criticar quem se empenha e quem faz, deveríamos aprender a valorizar as pessoas que assumem risco, que assumem a responsabilidade pelos seus colaboradores e pelas suas famílias. Alguns gestores e empresários, sobretudo de empresas de média e pequena dimensão, têm trabalhado sobre grande pressão desde o começo desta crise. Deveríamos admirar mais e valorizar mais estas pessoas. Deveria existir mais “espaço” para o elogio do bem do que para a crítica do mal. Porquê? Porque é uma atitude humanamente mais saudável, é uma atitude que favorece um clima criativo e empreendedor.
Professora de Comportamento Humano e Macroeconomia da AESE Business School Cátedra de Ética na Empresa e na Sociedade AESE/EDP