Ciente de que perante uma situação tão crítica como a que vivemos não é possível identificar soluções de indubitável eficácia, Arménio Rego afirma, em entrevista, que não devemos, contudo, perder a esperança de vencer o problema. Para o Director do LEAD.Lab da Católica Porto Business School, não dourar a pílula é igualmente importante, apesar de acreditar que “do veneno se pode fazer o remédio”
POR CATÓLICA PORTO BUSINESS SCHOOL
Se estivesse a gerir uma empresa e/ou organização quais as três primeiras decisões que tomaria?
Responderei que tomaria as medidas que gostava de tomar, mas respeito outras escolhas de quem está perante esta realidade crítica. Primeiro: seria transparente a propósito da situação da empresa. Segundo: mostraria, com actos, que a empresa é um empreendimento colectivo, para o melhor e o pior. Apoiaria, pois, colaboradores em situação de fragilidade. Essa acção veicularia uma mensagem empática, não apenas para quem recebe o apoio mas também para os restantes colaboradores. Terceiro: procuraria revelar confiança e tenacidade, mas mostraria disposição para fazer ajustamentos de acordo com a evolução das circunstâncias.
Que conselhos daria a um líder para preparar o futuro numa altura de incerteza como a que vivemos actualmente?
Sugerir-lhe-ia duas coisas. Primeira: que avaliasse devidamente a situação para deliberar de modo tão sábio quanto possível e sem precipitações. Segunda: que veiculasse uma mensagem de esperança, sem dourar a pílula. Perante uma situação tão crítica como a que se vive, não é possível identificar soluções de indubitável eficácia. Mas convém assinalar às pessoas que, apesar das dificuldades e dos riscos de fracasso, há possibilidades de vencer o problema – e essas possibilidades não devem ser desperdiçadas. A equipa de resgate dos 33 mineiros da mina de San José, no Chile, sabia que eram diminutas as probabilidades de resgatar os mineiros soterrados a 700 metros de profundidade. Mas foi a janela de esperança que energizou todas as pessoas e entidades envolvidas. Sem essa esperança, energizada por um propósito nobre, a desistência teria vencido. O fracasso pode sempre emergir. Mas a probabilidade de o mesmo ocorrer é menor se, com tenacidade, as possibilidades (ainda que modestas) de sucesso forem aproveitadas.
Que características um líder deve ter para ser bem-sucedido mesmo em momentos de crise?
Determinação e perseverança para prosseguir apesar dos obstáculos. Resiliência para lidar com fracassos e prosseguir orientado para o futuro. Humildade para reconhecer que não tem respostas para tudo, que pode cometer erros, e que os outros podem ajudá-lo. Autoconfiança para energizar a equipa. Sabedoria para não se precipitar. Empatia e compaixão para com as pessoas que com ele trabalham. Autocontrolo emocional para manter a calma e a serenidade.
Ser um bom líder hoje, numa altura de crise, é diferente do que era ser um bom líder há dez anos?
Há competências transversais a todos os tempos. Mas as situações hipercríticas requerem competências diferentes das necessárias em tempos de bonança. As que antes referi são importantes em qualquer momento, mas adquirem especial relevância nestes tempos conturbados. Ademais, alguns líderes com perfil ajustado a momentos de “guerra” (como Churchill) são menos eficazes em tempos de “paz”. Isso ocorre porque a liderança não é apenas ser “líder”. Antes é um processo que envolve líderes e liderados numa dada situação. Perante diferentes situações, os liderados esperam diferentes acções de liderança – e alguns líderes dão mais mostras do que outros de que correspondem a esses anseios. Dito isto e considerando as razões apontadas: não há perfis ideais. Pode mesmo suceder que, nestes momentos críticos, alguém sem “perfil de líder” dê mostras de que possui dotes de liderança ao corresponder aos anseios dos liderados. As situações também “fazem” os líderes.
Uma mensagem de esperança a todos os líderes…
Responderei de modo paradoxal. Sempre houve crises, sempre as haverá. Não controlamos tudo. Somos mortais. Estes momentos lembram-nos da nossa finitude e mostram que todos precisamos de todos. Essa é a realidade – negá-la não nos ajuda. Cientes dessa circunstância, podemos melhorar a nossa condição. Se outras pessoas e outras sociedades lidaram com crises muito mais graves do que a actual, nós também podemos atravessar este momento com a noção de que do veneno se pode fazer remédio. Mas devemos aprender: quanto tudo ficar bem, convém que guardemos “recursos” para os momentos críticos que, mais dia menos dia, acabarão por surgir.
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LEAD.Lab, Católica Porto Business School