Todas as famílias que, após o término da moratória, percecionem que terão dificuldade em cumprir com a prestação por inteiro, deverão já hoje procurar uma solução junto do seu banco ou de alguma instituição que dê apoio nestas matérias. A este respeito aconselho que conheça a RACE (Rede de Apoio ao Consumidor Endividado) onde estão inúmeras instituições que poderão ser uma ajuda em todo este processo
POR JOÃO RAPOSO

Os impactos nas famílias portuguesas devido às moratórias de crédito são variados, na mesma medida em que são variados os motivos pelos quais os clientes recorreram a elas. Creio que se generalizou a ideia que os clientes que recorreram às moratórias fizeram-no como um comportamento de prevenção de risco de incumprimento, quando essa realidade é uma minoria. A maior parte das famílias que pediram moratórias nos seus créditos fizeram-no apenas porque lhes foi dada a opção e nalguns casos até foram incentivadas a tal.

Os dados mais recentes que temos (setembro de 2021) dizem-nos que os principais bancos em Portugal não estão preocupados com o impacto do fim das moratórias, embora não neguem que haverá aumento do crédito malparado. A expectativa é que será mais significativo nos créditos empresariais do que nos créditos a particulares.

Mesmo não sendo tão significativo como se previu há 1 ano atrás, qualquer situação de dificuldade de cumprimento de responsabilidades de crédito é algo que nos deve preocupar e levar a agir. Por isso gostava de me debruçar sobre o impacto para as famílias quando estas se encontram em situação financeiramente frágil e lançar algumas pistas de possíveis formas de atuação nestes cenários.

  1. O tempo não cura tudo – Agir hoje.

O ditado “o tempo cura tudo” neste caso não se aplica. Diria mesmo que o tempo agrava tudo. Estar em situação de risco de incumprimento, ou mesmo já em incumprimento, não é uma fatalidade e é algo que acontece a muito mais famílias do que aquelas que imaginamos. Desengane-se quem pensar que as dificuldades em pagar os créditos é apenas para quem tem poucas posses. Ter consciência que o problema não é original nem exclusivo deve ajudar-nos a tomar a decisão de atuar hoje! Não serve de nada enterrar a cabeça na areia à espera que algum milagre aconteça. Tudo o que vier a acontecer fruto das negociações com os credores será tanto mais fácil quanto mais cedo atuarmos.

  1. Combata a “infidelidade financeira” – Seja verdadeiro.

Ao longo do tempo tenho encontrado muitas famílias que se encontram naquilo que chamo de “infidelidade financeira”. Isto é, pessoas que vivem juntas, partilham responsabilidades, decisões, sonhos, etc., mas não são capazes de partilhar que estão com problemas financeiros. Não são raros os casos em que alguém pede ajuda na reestruturação dos seus créditos e pede para que a mulher, ou o marido, não saibam desta situação! É essencial sermos honestos com quem partilhamos a nossa vida. Podemos achar que estamos a proteger o outro lado mas isso é claramente uma ilusão. Mais cedo ou mais tarde a realidade vai bater à porta e não há como disfarçar quando se entra num processo de penhora de salário ou mesmo de bens. Não é vergonha nenhuma estar numa situação de descontrolo com o cartão de crédito. Vergonha é esconder e deixar de ser verdadeiro com quem prometemos partilhar a vida em todas as circunstâncias.

  1. O credor tem interesse em resolver a sua situação – Seja transparente.

Desde 2012 que existe legislação que protege o devedor que esteja em dificuldade de cumprimento dos créditos (Decreto Lei 227/2012 – PARI/PERSI). Esta legislação quer promover meios justos para credor e devedor chegarem a um entendimento. Poderá passar por alargamento de prazo, período de carência, redução taxa de juro, entre outras possibilidades. Não é uma boa estratégia esconder informação. O que se pretende é que o devedor espelhe a sua vida financeira para conseguir chegar a uma solução em que seja possível cumprir com o resto do contrato. Lembre-se que os bancos não podem agravar as condições que tem atualmente nem cobrar qualquer valor por este processo de reestruturação. Por isso deste processo só poderá sair melhor do que entrou.

  1. Tudo tem solução – Seja positivo.

Como procurei defender acima, quanto mais cedo atuar mais fácil será a solução. Mas mesmo que esteja numa situação de aparente beco não se deixe levar pelo desespero, pois tudo tem solução. Quando estão esgotadas todas as possibilidades de negociação com os credores existe sempre a possibilidade de recorrer a um processo judicial, onde fazemos prova que mesmo querendo não temos possibilidades de pagar todos os créditos que contraímos. Esta situação é, evidentemente, dura mas permite que fiquemos sem dívidas. Por mais duro que seja um processo de insolvência é sempre preferível a fugir.

Gostava de terminar apelando a que todas as famílias que, após o término da moratória, percecionem que terão dificuldade em cumprir com a prestação por inteiro, então procurem já hoje uma solução junto do seu banco ou de alguma instituição que dê apoio nestas matérias. A este respeito aconselho que conheça a RACE (Rede de Apoio ao Consumidor Endividado) onde estão inúmeras instituições que poderão ser uma ajuda em todo este processo.

Percebo que estas situações deixam-nos numa situação tão frágil em que até duvidamos do nosso valor enquanto pessoas. Mas lembre-se que em nada fica diminuído enquanto ser humano por ter estes desafios na sua vida. O nosso valor em nada depende daquilo que temos ou não temos. Nós valemos pelo que somos e não pelo que temos.

Fundador e administrador do Grupo Reorganiza que, através de uma equipa de consultores especializados nas áreas de crédito, seguros e coaching financeiro, dedica os seus dias a ajudar os seus clientes a poupar dinheiro e a aumentar a sua segurança financeira