Estados Unidos da América, Europa e mercados emergentes constituem três rotas distintas para os caminhos económicos a percorrer em 2011. Se os motores da retoma parecem estar a aquecer em terras americanas, a Europa continua a braços com défices astronómicos e com um euro assombrado. Já os BRIC continuarão a ser recordistas no crescimento
POR HELENA OLIVEIRA

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Depois de um 2010 complexo, o que é que se pode esperar para o novo ano no que respeita ao comportamento económico global? O VER foi à procura de previsões que, apesar de valerem o que valem, poderão ajudar a enfrentar um 2011 que, para já, está a atemorizar muita gente.

Se existe um ponto sobre o qual os apostadores de tendências parecem estar unanimemente convencidos é aquele que indica que a economia mundial irá crescer de acordo com duas ou três velocidades distintas: a América, a zona euro e as economias emergentes seguirão trajectórias distintas e divergentes serão também os destinos dos seus habitantes.

Contudo e voltando uns dias atrás, o ano parece ter fechado com umas contas melhores do que as esperadas. De acordo com a revista The Economist, a produção mundial cresceu para perto dos cinco por cento, um valor bem mais elevado do que o previsto há 12 meses. E a maioria dos medos falharam em materializar-se, a não ser a penosa realidade em que se encontram as economias periféricas da zona euro mas, mesmo assim, e animada pelo gigante alemão recordista em crescimento, a Europa acabou por revelar uma taxa de crescimento decente. Resta saber se 2011 seguirá o mesmo padrão. Vejamos, então, algumas das previsões para o ano que agora se inicia.

A Primavera do descontentamento europeu
Talvez não seja necessário esperar pela Primavera para que a zona euro enfrente uma (nova) crise, altura em que a Espanha e Itália terão de refinanciar os seus títulos de dívida. O euro poderá enfrentar novos problemas, apesar de os políticos europeus estarem habitados a enfrentar este tipo de “ataques”. Mas há já quem perspective que o fracasso do euro terá como origem a falha da maioria dos países no que respeita a tomar o remédio amargo essencial para que as suas economias voltem a ser competitivas a longo prazo. De acordo com previsões do Centre for Economics and Business Research (CEBR), um think tank europeu independente, existe apenas uma em cinco possibilidades de o euro conseguir sobreviver, tal como o conhecemos hoje, num período de 10 anos. E, caso não entre em colapso, este poderá ser o ano em que o seu enfraquecimento poderá vir a dar origem a uma paridade com o dólar. A zona euro continua a ser uma fonte óbvia de stress, não só a nível financeiro, como também macroeconómico. Pelo menos no curto prazo, prevê-se um abrandamento do crescimento, nem que seja por causa dos cortes nas despesas governamentais. Se, como afirma o The Economist, a consolidação fiscal na Alemanha é “voluntária e até masoquista”, países da periferia como a Irlanda, Portugal e a Grécia não têm qualquer alternativa e o seu futuro permanece muito negro. São várias as evidências empíricas que sugerem que a esmagadora maioria dos países que partilham a moeda única não serão capazes de aumentar a sua competitividade, dada a diminuição ou congelamento de salários, sem esquecer o aumento dos preços. Mais terríveis ainda poderão ser as consequências de uma mudança para um mundo no qual um país pertencente à zona euro entre em falência. E se 2010 já foi caracterizado por uma enorme confusão no Velho Continente, a tendência é que em 2011 esta possa vir a ser muito maior.

Assim, um crescimento económico (ainda) mais baixo é prognosticado pela maioria dos analistas, principalmente no que respeita aos primeiros seis meses do ano e muito concentrado na Europa. O medo inflacionista, combinado com os efeitos das consolidações orçamentais, constituirão a principal causa para esta desaceleração económica. Fora deste contexto está a Alemanha, que continuará a ser a estrela da companhia das economias ocidentais. Com o custo da reunificação gradualmente absorvido e com uma taxa de juros extremamente competitiva, não existem dúvidas de que é a Alemanha que está a estabelecer o ritmo europeu e a liderá-lo. Estima-se que o seu crescimento ao longo de 2010 tenha rondado os 3,7 por cento, o valor mais elevado desde a reunificação. Um dos elementos interessantes apontados pelos analistas no que respeita ao sucesso económico germânico diz respeito ao facto de este estar a ser estimulado pelos imigrantes, de uma forma similar ao que aconteceu na Inglaterra nos últimos 20 anos. No entanto e de forma não esperada, de acordo com dados divulgados ontem, a taxa de desemprego alemã subiu pela primeira em 17 meses, situando-se nos 7,5 por cento, continuando a ser a mais baixa desde a reunificação do país, em 1990.

Em entrevista è edição online da Vanguard, Olivier Blanchard, economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), afirma que o mantra do reequilíbrio económico que tem vindo a vigorar nos últimos dois anos terá de se manter para 2011. Ou seja, sem este reequilíbrio, interno e externo, não existirá qualquer tipo de recuperação económica saudável na zona euro. Blanchard explica que, antes da crise, o crescimento em muitos dos países desenvolvidos foi proveniente de uma procura doméstica excessiva, fosse através do consumo ou do investimento imobiliário. O que, obviamente, não pode continuar a acontecer. Para o economista, estes países têm agora de confiar em outras fontes de procura. Até agora, a sua utilização de políticas fiscais para estimular a procura interna era necessário, mas tornou-se insustentável.
Os países deficitários têm que começar a confiar mais na procura externa, ou seja, nas exportações. E, pelo contrário, aqueles com excedentes, vários pertencentes aos mercados emergentes, terão de fazer o inverso e reduzir a sua dependência nas exportações.

E, como seria de esperar, para os consumidores europeus, não existem dúvidas de que 2011 será um ano muito complexo. Com a subida do IVA, combinada com o aumento dos preços das commodities, com os cortes de salários (em vários países da Europa) e com o desemprego a subir, o rendimento disponível irá sofrer um significativo colapso.

EUA: desemprego continua a preocupar
No que respeita à América, espera-se igualmente uma mudança de direcção económica. Ao contrário da Europa, a política macroeconómica norte-americana tem vindo a afastar-se, de forma aparentemente decidida, de cenários de austeridade. O acordo para a redução de impostos alcançado em Dezembro último entre Obama e os republicanos do Congresso foi muito mais importante do que o esperado. Ao contrário do Velho Continente, a economia americana está a injectar novas doses de esteróides, ao passo que a Europa “se encontra em pleno período de reabilitação”. As notícias são boas mas, em princípio e para já, não serão suficientes para reduzir, pelo menos rapidamente, o desemprego. E se os analistas optimistas dão como certo o reaquecimento dos motores da economia americana, outros há que manifestam serias preocupações relativamente ao astronómico buraco fiscal da América. O Nobel da Economia Paul Krugman alertava, no seu editorial de Domingo no NYTimes, que temia um optimismo exacerbado, apesar de os sinais serem positivos. Para o economista, ainda não existem dados que comprovem que a crise imobiliária passou ou que as famílias endividadas irão voltar aos seus velhos hábitos de gastar tudo o que ganham. E, apesar de um crescimento na ordem dos quatro por cento parecer possível para 2011, a questão do desemprego – que é a que realmente interessa aos cidadãos – continua um problema demasiado complexo, pese embora o facto de os pedidos para o subsídio terem finalmente descido abaixo dos 400 mil por semana. O que não deixa, todavia e nas palavras de Krugman, a América “muito longe da beira do buraco”.

Nos mercados emergentes, o cenário é diferente. Se há quem preveja um abrandamento também nestes países, a tendência é que estes continuem a crescer pelo menos três vezes mais do que os países desenvolvidos. Entre os maiores mercados emergentes, a China e o Brasil poderão ser aqueles onde esta tendência de abrandamento será mais visível, o que não acontecerá em princípio com a Índia e a Rússia. De acordo com o think tank de economia global IHS Global Insight, os mercados emergentes crescerão cerca de seis por cento, comparativamente a uns magros dois por cento previstos para os países desenvolvidos. Espera-se, igualmente, uma subida dos níveis de inflação para estes mercados. No que respeita ao dólar e para outros analistas, o seu também enfraquecimento poderá estimular as exportações e, espera-se, os motores económicos nos Estados Unidos serão mais fortes no segundo semestre do ano, com a esperada correcção no mercado imobiliário.

Prognosticada está também uma crise no Japão que, prevêem os especialistas, poderá vir a ser muito dura. De acordo com o CEBR, a dívida japonesa representa agora 200 por cento do seu PIB e, caso cresça ainda mais, será necessário recorrer a financiamento estrangeiro o que, como sabemos, está complicado de obter. Muito provavelmente, o governo japonês não terá outra alternativa senão a de embarcar numa rigorosa contenção orçamental. Em paralelo, o crescimento previsto para a maioria dos mercados exportadores da Ásia irá abrandar e o preocupante envelhecimento da população irá forçar o governo a aumentar, mais uma vez, a idade de reforma, desta vez para os 75 anos de idade.

Mas o que significam, então, estes caminhos tripartidos? Para alguns economistas, a divergência existente entre estes três blocos poderá vir a concentrar os diferentes riscos num só. A política monetária flexível da América e as preocupações sobre a insolvência de algumas economias da zona euro poderão encorajar os capitais a fluírem para os mercados emergentes, o que aumentará a relutância dos bancos centrais em aumentar as taxas de juro e em manter a inflação a níveis baixos. Prevê-se que nos próximos cinco anos as economias emergentes sejam responsáveis por cerca de 50 por cento do crescimento global, mas só 13 por cento pelo divida pública global líquida. E, assim, em vez de um reequilíbrio, tão reclamado por Olivier Blanchard, a economia mundial irá balançar ainda mais entre um Ocidente endividado e um leste mais frugal. Se o Ocidente evitou a depressão em parte devido ao facto da Europa e da América terem trabalhado em conjunto e partilhado uma filosofia económica similar, como escreve o The Economist, ambos estão agora obcecados com problemas internos, apesar de terem adoptado estratégias diametralmente opostas para lidar com ele. O que poderá constituir um problema no que respeita à cooperação internacional. Contudo e como sabemos, prognósticos… só no fim do ano.

 

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