A minha vida tem-me feito repensar muito o exemplo de vida do apóstolo Pedro. É real esta amizade que Jesus tem por cada um de nós, mas são muitas as vezes em que falho. E a tentação é deixarmo-nos ficar aí longe d’Ele, porque não nos sentimos merecedores de tanta Amizade, não nos sentimos dignos, não nos sentimos à altura, porque vamos falhar… e centramo-nos em nós próprios, desligando-nos desta fonte de Amizade. No seu extremo, temos o exemplo do apóstolo Judas, que abriu caminho à sua própria morte
POR MARGARIDA TEIXEIRA DE SOUSA

«A paz esteja convosco». Foi assim, em dia de Pentecostes, que Jesus Ressuscitado se apresentou aos seus amigos. Convido o leitor a mergulhar nesta frase e a contemplar algumas passagens do Evangelho.

Por duas vezes, Jesus diz-nos «A paz esteja convosco». Os apóstolos, fechados e escondidos numa casa desde Sua morte, estavam cheios de medo, tal como eu estaria. Medo acompanhado pela descrença, por um coração (ainda) não disponível para abarcar todo este Amor e Amizade que Ele tem por cada um de nós. Mas voltemos um pouco atrás. 

Antes de se entregar, Jesus retirou-se para um lugar, Getsémani, para orar. Mais à frente, em Mt 26, 40-41, diz: «Vocês não poderiam vigiar comigo, nem por uma hora?» perguntou Ele a Pedro. «Vigiem e orem para que não caiam em tentação. O Espírito está pronto, mas a carne é fraca». Jesus pede aos seus melhores amigos que fiquem com Ele na hora da sua entrega ao Pai. Porque também Ele precisa de nós. Não é extraordinário? 

Torna-se claro que para estar com Jesus é necessário um ‘êxodo’ de nós próprios. Ainda assim, fica um ‘sabor’ a ‘falhanço’ deste momento dos apóstolos para com Jesus. 

Noutra passagem, Judas, um dos 12 apóstolos traído por Satanás, em Lc 22, 4-6, «[…] foi ter com os chefes dos sacerdotes e com os oficiais do templo e combinou com eles a forma de lhes entregar Jesus. Ficaram muito contentes e com isso prometeram dar-lhe dinheiro. Judas concordou e começou a procurar a melhor ocasião para o entregar».

Mais à frente, após a Última Ceia, em que Judas dá um beijo a Jesus e o entrega, Pedro diz: «Senhor, por que razão não te posso seguir agora? Estou pronto para morrer por ti!», ao que Jesus replicou: «Pronto a morrer por mim? Fica sabendo que antes de o cantar do galo me vais negar três vezes».

A história de amizade de Jesus com os apóstolos parece estar cheia de falhanços, ao ponto de O terem entregado. E pensamos «Como é que é possível? Eram os seus maiores amigos, eram os seguidores de Cristo Vivo!»

Mas, e nós? E a nossa Amizade, a nossa história com Deus? Não terá também tantas falhas? Não terá tantas traições como Judas quando deixamos de amar os outros à nossa volta? Não terá tantos silêncios e negações, como Pedro, quando o nosso propósito devia ser anunciar o Evangelho através da nossa vida? Não terá tanta falta de fidelidade, como os discípulos, quando Jesus foi entregue, e deixamo-nos tantas vezes levar pelos nossos medos e prazeres? As histórias não mudam assim tanto em 2000 anos.

De facto errar é desumano, e não como a expressão nos diz. 

Mas Jesus dá-nos a outra face da moeda, sabendo que o ia trair e entregar, Jo 17: «Pai, chegou a minha hora […] Dei-te a conhecer àqueles que me confiaste, tirando-os do mundo. Eles eram teus, mas tu entregaste-mos e eles guardam a tua palavra. Agora sabem que tudo quanto eu tenho é de ti que vem. Confiei-lhes as palavras que tu me deste e eles aceitaram-nas. […] Peço-te por eles; não pelos que são do mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus […] Enquanto estava com eles no mundo, protegi-os em teu nome, nome que tu me deste. Guardei-os e nenhum deles se perdeu, a não ser aquele que se havia de perder, para que se cumprisse o que diz a Sagrada Escritura […] Não te peço apenas por eles, mas também por aqueles que crêem em mim por meio da sua pregação e para que todos sejam um. Pai, que eles estejam tão unidos a nós como tu me estás a mim e eu a ti. Desta maneira, o mundo há-de acreditar que tu me enviaste […]» É de uma beleza enorme este gesto de oração de Jesus pelos seus amigos e pelos seus apóstolos.

A minha vida tem-me feito repensar muito o exemplo de vida do apóstolo Pedro. É real esta amizade que Jesus tem por cada um de nós, mas são muitas as vezes em que falho. E a tentação é deixarmo-nos ficar aí longe d’Ele, porque não nos sentimos merecedores de tanta Amizade, não nos sentimos dignos, não nos sentimos à altura, porque vamos falhar… e centramo-nos em nós próprios, desligando-nos desta fonte de Amizade. No seu extremo, temos o exemplo do apóstolo Judas, que abriu caminho à sua própria morte. 

Mas temos o apóstolo Pedro, que apesar de todas as suas falhas e fragilidades, sabe que o Amor de Deus por nós é maior que tudo, que não julga e nos recebe sempre de braços abertos, dizendo «Segue-me!» Mas voltemos à passagem inicial. 

Jesus Ressuscitado aparece aos apóstolos. No lugar do medo, dos receios, dos momentos de tribulação, Jesus aparece e fala aos discípulos. E pela graça do Espírito Santo, eles saem de si próprios e lançam-se ao mundo e às suas missões. Há uma viragem de página, porque voltaram a confiar em Deus e a ter um coração disponível, voltados para fora e a olhar o mundo com Esperança. É este o poder da Amizade de Jesus com cada um de nós: confiar. Por mais que os apóstolos não soubessem ‘como’ fazer nascer uma Igreja nem o que seria viver em comunidade (e tratar de todos os planos que Deus tinha para cada um deles!), lançaram-se abertos à vida nesta confiança de uma Amizade Maior. 

Que possamos saborear a alegria da vida, relembrando no nosso coração as Suas palavras sempre Vivas «A paz esteja convosco».

MARGARIDA TEIXEIRA DE SOUSA

Licenciada em Gestão e Mestrado em Empreendedorismo e Inovação Social. Trabalha na ACEGE