A humildade, a resiliência e a empatia são ingredientes essenciais para uma liderança de sucesso. Adoptar uma abordagem à liderança centrada no ser humano – que dê prioridade às necessidades e ao bem-estar dos colaboradores, que promova a inspiração e lhes dê um sentido de propósito – é agora mais importante do que nunca. No entanto, para impulsionar eficazmente as equipas e as organizações para novos patamares, os líderes devem, em primeiro lugar, embarcar numa viagem voltada para o seu interior. Estas são algumas das conclusões de um novo livro publicado pela McKinsey & Company
POR HELENA OLIVEIRA

A noção de “dentro para fora” significa que qualquer mudança começa por nós próprios. Temos de ter a capacidade de estar conscientes de nós próprios – das nossas palavras, dos nossos comportamentos e acções – e depois refletir sobre os nossos pontos fortes e fracos. Podemos chamar-lhe auto-desenvolvimento, que exige a adopção de comportamentos humanos como a empatia, o cuidado, a compaixão, a humildade e a vulnerabilidade – e, por vezes, a determinação, a confiança e a resiliência. Equilibrar estes diferentes conjuntos de comportamentos depende realmente da situação em que se encontra o líder”

The Journey of Leadership: How CEOs Can Learn to Lead from the Inside Out

“The Journey of Leadership: How CEOs Learn to Lead from the Inside Out”, escrito por Dana Maor, Hans-Werner Kaas, Kurt Strovink e Ramesh Srinivasan, é um guia abrangente que analisa as complexidades da liderança moderna e a forma como os CEOs se podem transformar a si próprios e às suas organizações. Publicado pela McKinsey & Company, o livro abarca décadas de experiência e insights dos programas de desenvolvimento de liderança da empresa de consultoria, particularmente o reconhecido Fórum Bower. Este fórum já orientou mais de quinhentos CEOs a nível mundial, incluindo líderes de empresas de topo como a Delta Air Lines, a Nissan, a Moderna, entre muitos outros e é com base nas suas histórias que uma boa parte do livro foi escrita.

A tese central da obra sublinha que o papel de um CEO ou de um executivo de topo mudou radicalmente. No passado, os líderes actuavam frequentemente como figuras de autoridade, tomando decisões com um mínimo de consulta. Actualmente, este modelo é inadequado para as exigências de um mundo interligado e em rápida evolução. Os autores defendem que os líderes devem evoluir desta abordagem “de cima para baixo” para uma abordagem mais centrada no ser humano, adaptável e empática.

Como se pode ler num excerto do livro, “a nossa experiência e investigação demonstram que liderar de ‘dentro para fora’ é o ingrediente chave para causar um impacto duradouro nas equipas e na organização em geral. Esta viagem de dentro para fora é matizada e complexa. Exige crescimento pessoal, o que significa que é imprescindível estar constantemente a aprender, a ouvir, a inspirar e a preocupar-se. A liderança não é apenas uma questão de tarefas aparentemente intermináveis relacionadas com a empresa, das quais tem de se ocupar quando se é um CEO eficaz. É igualmente importante ter consciência de quem somos e dos nossos defeitos, de modo a podermos mudar-nos a nós próprios e depois liderar os outros”.

Embora a imprensa especializada tenda a centrar a atenção em forças macro estratégicas como a IA, a geopolítica e as alterações climáticas, uma das maiores tendências actuais entre os especialistas em desenvolvimento da liderança é, talvez surpreendentemente, a concentração no desenvolvimento de capacidades mais profundas e mais “humanas”. O apelo para que os líderes abracem a sua humanidade não é novo. No próximo ano, recorda a revista Forbes, comemora-se o trigésimo aniversário do livro de Daniel Goleman, Inteligência Emocional, que popularizou competências como a autorregulação, a empatia e as aptidões sociais como essenciais para o sucesso da liderança. No entanto, mais recentemente, muitos dos principais pensadores sobre o desenvolvimento da liderança sugeriram a necessidade de os líderes realizarem um trabalho interno ainda mais profundo que, em anos anteriores, era visto mais como o domínio da psicoterapia ou mesmo da espiritualidade.

Kurt Strovink, um dos autores do livro, observou, numa entrevista concedida à Forbes, que um dos elementos surpreendentes das discussões dos CEO que participaram no Fórum Bower foi a prevalência de tópicos relacionados com o que ele chama de “lado pessoal e emocional de como liderar”. Strovink observou que “quase 60% dos desafios levantados não eram questões de negócios, mas questões centradas no ser humano sobre como operar com as suas equipas, conselhos de administração, famílias e com eles próprios”. Isto levou os autores a centrarem-se na “liderança de dentro para fora” como a sua estrutura central para líderes de sucesso.

A liderança de dentro para fora

Esta nova forma de liderança implica que os líderes desenvolvam primeiro um profundo sentido de auto-consciência e se envolvam numa introspecção para compreenderem os seus pontos fortes, fraquezas, preconceitos e motivações. Esta auto-descoberta é crucial, pois permite que os líderes alinhem os seus valores pessoais com os seus papéis profissionais. Os autores sublinham que só se compreendendo a si próprios é que os CEOs podem liderar eficazmente os outros e criar organizações que sejam resilientes, inovadoras e orientadas para os objectivos.

O livro fornece uma abordagem estruturada para cultivar esta auto-consciência. Os líderes são encorajados a trabalhar com coaches, mentores e conselheiros de confiança que possam fornecer feedback e reflexão imparciais. O objetivo é construir uma base de recursos psicológicos e emocionais a que os líderes podem recorrer quando enfrentam situações difíceis. O desenvolvimento de tais atributos – resiliência, empatia, autenticidade e humildade – é essencial para uma tomada de decisões eficaz e para a construção de relações.

Para ilustrar estes princípios, “The Journey of Leadership” inclui estudos de casos de CEOs proeminentes como Ed Bastian [Delta Airlines], Makoto Uchida [Nissan] ou Stéphane Bancel [Moderna]. Estes líderes partilham as suas experiências de navegação em crises, como a pandemia da COVID-19 e as perturbações tecnológicas nos seus sectores. Por exemplo, Bancel discute como a resposta rápida da Moderna à pandemia foi possível graças a um estilo de liderança que enfatizava a transparência, a confiança e a colaboração. Do mesmo modo, a abordagem de Bastian na Delta Air Lines reflecte a importância da liderança orientada para objectivos na manutenção da moral dos trabalhadores e da resiliência organizacional em tempos de incerteza.

Estas histórias oferecem uma perspetiva prática, demonstrando como os diretores executivos aplicaram com êxito os princípios da liderança de dentro para fora, não só para enfrentar desafios complexos, mas também para impulsionar a transformação e o crescimento. Estas ideias tornam o livro simultaneamente relacionável e acionável para os leitores que aspiram a liderar com autenticidade e impacto

O papel da tecnologia e da IA na liderança moderna

Como escrevem os autores, outro tema fundamental é a integração da tecnologia, especialmente da inteligência artificial (IA), nas estratégias de liderança. O livro destaca a forma como a IA está a transformar as funções de gestão tradicionais, assumindo tarefas de rotina como a análise de mercado, a gestão de projectos e os processos de tomada de decisão. Esta mudança tecnológica liberta os CEO para se concentrarem mais nos aspectos humanos da liderança – construir relações, motivar equipas e promover um sentido de propósito.

Ou seja, a partir de agora, o factor diferenciador será a liderança humana que dá às pessoas um sentido de propósito, as inspira e se preocupa com o que elas querem alcançar. Atualmente, muitos trabalhadores acreditam que grande parte da orientação técnica e analítica de que necessitam é mais facilmente obtida através de soluções de IA. De facto, um inquérito realizado pela empresa de investigação Potential Project concluiu que os trabalhadores já confiam mais na IA do que nos seus chefes humanos em determinadas áreas de liderança e na gestão de determinadas tarefas.

No entanto, os autores alertam para o facto de que tirar partido da tecnologia por si só não é suficiente. A verdadeira liderança na era da IA requer o equilíbrio entre os conhecimentos tecnológicos e o toque humano. Os líderes que conseguirem combinar eficazmente a tomada de decisões baseada em dados com empatia e compreensão estarão melhor posicionados para inspirar as suas equipas e criar organizações sustentáveis e de elevado desempenho.

“The Journey of Leadership” também fornece estruturas accionáveis para os líderes avaliarem o seu estilo de liderança e desenvolverem um ‘plano de compromisso pessoal’. Este plano envolve a definição de objectivos específicos para o crescimento pessoal, alinhando-os com a missão da organização e criando estratégias para envolver e motivar as equipas. O livro descreve as etapas para revigorar o líder e a organização, enfatizando que a liderança bem-sucedida não é estática, mas envolve aprendizagem e adaptação contínuas.

Esta abordagem é particularmente relevante no contexto atual, em que os CEOs devem não só responder aos desafios externos, mas também modelar comportamentos que inspirem e sustentem as suas equipas. Os autores sugerem que o desenvolvimento de um plano de compromisso é essencial para a construção de um legado de liderança com impacto que se estenda para além do mandato do CEO.

As dimensões psicológicas e emocionais da liderança

Os autores debruçam-se sobre os aspectos psicológicos da liderança, argumentando que a resiliência e a adaptabilidade se constroem através da compreensão dos próprios estímulos e respostas emocionais. Ao praticarem a atenção plena e a reflexão, os líderes podem cultivar a capacidade de se manterem calmos e concentrados, mesmo em situações de grande pressão. Esta maturidade emocional permite-lhes interagir com as partes interessadas de forma mais eficaz, gerir conflitos e criar ambientes em que as equipas se sintam apoiadas e valorizadas.

O livro também aborda a forma como os líderes devem ser capazes de lidar com diversas perspectivas e incentivar o diálogo aberto nas suas equipas. Ao fomentar uma cultura em que os empregados se sintam com poder para falar e partilhar as suas ideias, os líderes podem impulsionar a inovação e garantir que as suas organizações se mantêm dinâmicas e competitivas.

O livro “The Journey of Leadership” sublinha que o cultivar destas qualidades não tem apenas a ver com o sucesso imediato, mas também com a manutenção da excelência da liderança ao longo do tempo. Os autores citam a investigação da McKinsey, que mostra que as organizações que investem no desenvolvimento do capital humano – para além do desempenho financeiro – têm mais probabilidades de se manterem com elevado desempenho e maior resistência à volatilidade económica. Essas empresas estão mais bem posicionadas para se adaptarem, crescerem e manterem a rentabilidade a longo prazo.

Ao apresentar um modelo holístico e integrador de liderança, os autores defendem uma mudança na forma como os CEOs e as organizações pensam sobre o crescimento e o sucesso. Defende que os líderes que irão prosperar no futuro são aqueles que abraçam o desenvolvimento pessoal, dão prioridade às pessoas e utilizam a tecnologia estrategicamente para melhorar – e não substituir – os elementos humanos da liderança.

Em suma, “The Journey of Leadership: How CEOs Learn to Lead from the Inside Out” é mais do que um guia para CEOs; é um manifesto para a transformação da liderança na era moderna. Os autores fornecem uma abordagem detalhada e baseada em evidências que combina inteligência emocional, visão tecnológica e visão estratégica. Para qualquer pessoa interessada em liderar com objectivos e impacto, este livro oferece lições valiosas e passos práticos para embarcar numa viagem de liderança transformadora. Quer seja um CEO experiente ou um aspirante a líder, os conhecimentos contidos neste livro equipá-lo-ão com as ferramentas necessárias para prosperar num mundo cada vez mais complexo e interligado.

Fontes consultadas:

The ‘inside out’ leadership journey: How personal growth creates the path to success

The Journey of Leadership

The Urgent Call For More Human Leaders

Author Talks: A transformational approach to leadership

How CEOs learn to lead from the inside out

Imagem: Ben Sweet/Unsplash.com

Editora Executiva

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