A intenção é experimentar diversas soluções e ver o que funciona para que, aos poucos, todos queiram vir ao escritório para se sentirem parte de algo que é muito mais do que um emprego. Sentir que são uma equipa que trabalha em conjunto para a felicidade individual de cada um, aprender a cuidar da saúde mental dos nossos colaboradores, tendo estes últimos que estar à vontade para falar de qualquer tema e nós, gestores, disponibilizarmos as ferramentas e meios para que eles sejam ouvidos atempadamente
POR RUI CRUZ

A primeira pergunta que devemos colocar, enquanto gestores de uma empresa, é se os colaboradores querem voltar a estar permanentemente no escritório. A melhor resposta são os dados e a adesão das pessoas. Ter dados para analisar e ajudar na decisão é sempre melhor do que uma folha em branco.

Na Bsolus / Beevo optámos por não tornar obrigatório o regresso ao escritório, mas demos a liberdade ao colaborador para voltar sempre que achasse necessário para que se sentisse bem e pudesse evoluir.

A liberdade de escolha deu-nos a resposta que precisávamos e, claramente, por vontade própria não querem voltar a tempo inteiro. Num universo de 40 colaboradores, apenas cerca de 2% voltaram a tempo inteiro, 90% vêm ao escritório uma a duas vezes por semana e os restantes 8% nunca vêm. É minha convicção que quando a dúvida do que devemos fazer é muito grande, devemos “deixar o rio correr um pouco” e ficar a observar: a decisão que tomarmos vai ser sempre mais acertada no final.

Com estes dados é natural que qualquer gestor tenha muitos receios. Será que estamos a perder os nossos colaboradores? Será que vamos conseguir que eles mantenham uma relação afectiva com a empresa? Como vamos conseguir manter a produtividade?

Para responder a estas dúvidas, nada melhor que nos colocarmos no lugar dos colaboradores e responder à questão: será que, no lugar deles, eu próprio quereria voltar para o escritório a tempo inteiro?

A resposta é óbvia e também eu não quereria. Durante dois anos estiveram em casa, evitaram filas de trânsito, a remuneração líquida foi maior, porque tinham menos despesas, os dias foram mais bem aproveitados, tiveram a possibilidade de gerir o seu próprio dia sem imposições de horários, não tendo tantas exigências em relação à sua imagem. Teria sido muito engraçado poder ter visto em algumas reuniões, o conjuntinho de uma camisa com umas calças de pijama, entre muitas outras peripécias das famosas reuniões virtuais.

Claro que todos estes privilégios só funcionam muito bem para todos aqueles que os souberem aceitar e assumir a responsabilidade de os ter. Por outro lado, quem não se conseguiu organizar tanto mental como fisicamente, viu a sua vida transformada num verdadeiro caos, onde não se distingue o que é trabalho do tempo de casa e do tempo de lazer. No entanto, nem todas as empresas estavam preparadas para esta mudança tão radical.

Agora que sabemos que os colaboradores, na sua maioria, não querem voltar a tempo inteiro, e também sabemos que não existe um padrão de comportamento uniforme entre eles, o que podemos fazer para agradarmos “a gregos e a troianos”?

A nossa opção foi manter a liberdade de escolha e aprender a tirar o melhor partido dessa liberdade. E como fazer isso? Parece uma equação complexa e, efectivamente, é. Mas existem duas palavras que caminham de mãos dadas, liberdade e responsabilidade.E é no equilíbrio deste binómio que vamos encontrar a melhor solução.

Temos então que trabalhar muito com as diferentes equipas, valorizar estes benefícios, que em algumas empresas são novos, mas que muitas já praticam há alguns anos. Temos que lhes fazer perceber que o crescimento global da empresa depende deles e da forma como usam essa liberdade. É importante que entendam que é o seu crescimento pessoal, enquanto profissionais e seres individuais, que vai tornar esse progresso possível e que, por sua vez, essa evolução vai poder trazer ainda mais liberdade e satisfação pessoal. É um ciclo de crescimento conjunto e contínuo entre o colaborador e a empresa.

Mas será que, se conseguirmos este equilíbrio, o mesmo será suficiente para que a empresa continue a crescer de forma saudável? Não me parece. O que distinguirá a nossa empresa de outra que tenha exactamente o mesmo equilíbrio? Temos que adicionar pelo menos mais duas variáveis na equação: uma dose muito grande de cultura empresarial própria e respeito/ reconhecimento pelas conquistas de cada um.

É precisamente nessa cultura e nos valores que ela representa que cada colaborador se vai identificar ou não com a empresa e é através da compreensão da mesma cultura que vai perceber o que pode esperar da empresa e o que a empresa espera dele. É também com respeito por essa cultura que a empresa vai reconhecer e dar mérito ao colaborador, incentivando cada vez mais o seu crescimento pessoal e individual.

Relembro que é muito importante não achar que a cultura é uma peça rígida e imutável, ou seja, que esta deva estar em permanente evolução para que não comprometa a jovialidade e a receptividade da empresa. Como é óbvio, não vai sempre agradar a todos, mas para o bem da eficácia a evolução deve ser ponderada em conjunto e nunca de forma individual.

Mas como implementar cultura se os recursos não estão no escritório? É aqui que nos devemos adaptar, ir com a corrente, tornar-nos mais receptivos às ideias de todos. Para os gestores, neste momento, o mote mágico é o experimentalismo.

Vamos tornar os escritórios mais agradáveis, vamos mudar a ideia que existia dos escritórios antigos que só serviam para trabalhar, vamos ter mais locais de convívio dentro dos escritórios, vamos abri-los 24/7, deixar que os colaboradores tomem a liberdade de virem a um sábado ao escritório com um amigo jogar ping-pong e mostrar orgulhosamente o local onde trabalham, vamos oferecer pequenos-almoços, vamos desafiá-los a trazer um bolo e a partilhá-lo com os colegas, vamos brincar aos pijamas, aos instrumentos, e até ao dia das pantufas. A intenção é experimentar diversas soluções e ver o que funciona para que, aos poucos, todos queiram vir ao escritório para se sentirem parte de algo que é muito mais que um emprego. Sentir que são uma equipa que trabalha em conjunto para a felicidade individual de cada um.

É também de extrema importância aprendermos a cuidar da saúde mental dos nossos colaboradores, na medida em que dois anos em casa escondem muitas mazelas. Os colaboradores têm de estar à vontade para falar de qualquer tema e nós, gestores, temos que disponibilizar as ferramentas e meios para que eles sejam ouvidos atempadamente.

Claro que todo este experimentalismo é mais fácil para gestores, que como eu, vêm de uma área que há muito que está digitalizada, que há anos trabalha com divisões de tarefas e metodologias scrum. Metodologias que permitem facilmente medir a eficácia dos recursos e se estes estão a cumprir com as suas responsabilidades. Também tornam os nossos colaboradores como alvos muito apetecíveis para multinacionais de todo o mundo da área de desenvolvimento web, porque estão completamente preparados para isso.

Falava há poucos dias com um amigo que tem um restaurante de alguma dimensão e que me confidenciava que tem muita dificuldade em reter e encontrar novos colaboradores. Perante esta situação , caí na ousadia de lhe perguntar por que não criava uma cultura de trabalho de 4 dias apenas? Aumentar o número de colaboradores e dar fins-de-semana a todos. Recorrer a um caminho que o distinguisse dos demais poderia levar à situação ideal para que o procurassem para trabalharem com ele e não para ele. Será que num restaurante uma equipa bem motivada, com a cabeça descansada e bem treinada não vai necessariamente aumentar a facturação? Eu acho que sim, porque vão vender mais e melhor. Como disse e repito, o mote é o experimentalismo!


Beevo investe 250 mil euros em novos escritórios para trazer de volta os colaboradores

“Mudámos de escritório porque sentimos que precisávamos de um espaço com muito mais qualidade do que o anterior. Algo que correspondesse à qualidade dos produtos que desenvolvemos e, apesar de incentivarmos um modelo híbrido de teletrabalho, contribuísse para termos recursos humanos mais felizes. Um espaço onde possamos convidar clientes, outras empresas, possíveis novos colaboradores e onde todos possam sentir a energia de inovação que nos caracteriza. Quando ouvi um colaborador a dizer que estava tudo tão bonito e confortável que lhe apetecia descalçar-se, tal como em casa, senti que o objectivo maior estava cumprido.

É um espaço para o futuro. Um espaço com bons sistemas de climatização, renovação de ar, várias salas de reuniões que se adaptam à nova realidade das conferências web permanentes. A inspiração para a construção e decoração do escritório foi o binómio casa / natureza. Quisemos criar um espaço de extremo conforto, para que os colaboradores se sintam efetivamente em casa, com muita luz natural, com utilização de materiais como madeira e vidro para que o tal binómio funcionasse muito bem. O jardim vertical, as divisórias em madeira, a abundância de vegetação e plantas com uma decoração retro permitem um espaço muito iluminado, sóbrio e de fácil utilização”.


RUI CRUZ

CEO e fundador da Beevo