A frase é de Isabel Hidalgo, responsável de comunicação da Fundación Másfamilia, a entidade parceira do Programa AconteSer para o eixo “equilíbrio entre vida profissional e familiar”. E se a sua afirmação parece não deixar espaço para dúvidas, por que motivo é que as empresas não se convenceram ainda dos benefícios inerentes a estas políticas? Talvez porque ainda não conheçam o cardápio de medidas defendidas por esta fundação espanhola
POR HELENA OLIVEIRA

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© Fundación Másfamilia
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Tratar a conciliação como ferramenta para gerir o negócio e melhorar a sociedade é já uma realidade em algumas empresas. Mas não em tantas quanto se gostaria. E dado que, em períodos de crise, as pessoas se sentem muito mais fragilizadas, a família funciona, para a esmagadora maioria delas, como o mais seguro porto de abrigo. Todavia e também em período de crise, as empresas tornam-se muito mais exigentes com os seus trabalhadores, tornando a questão da conciliação ainda mais difícil de abordar.

No âmbito do Programa AconteSer, o equilíbrio entre vida profissional e familiar foi eleito como uma das três grandes temáticas que permitirão às empresas liderar com responsabilidade. Assim, esta iniciativa da ACEGE, em parceria com a CIP, o IAPMEI e a APIFARMA, firmou uma parceria com a Fundacion Másfamilia, entidade espanhola com reconhecida experiência nesta área, no sentido de levar a cabo vários workshops, em todo o país, sobre o que significa “conciliação” e como é possível aplicá-la em empresas de diferentes dimensões. Esta iniciativa permite ainda, às empresas que aderirem ao compromisso em causa, serem certificadas como “empresas familiarmente responsáveis”.

Em entrevista ao VER, Isabel Hidalgo, directora de comunicação da Fundação, explica o que é necessário para que uma empresa embarque numa mudança de paradigma, mudança esta necessária para o abraçar de uma cultura social, laboral e empresarial baseada na flexibilidade, no respeito e no compromisso mútuos.

Em linhas gerais, o que se entende por “equilíbrio entre vida profissional e familiar” no âmbito do Programa AconteSER, na medida em que esta temática constitui um dos três eixos por excelência do programa em causa?
Consiste em colocar “de acordo”, em reunir vontades em torno de um mesmo fim, em mediar aspectos aparentemente incompatíveis, em alcançar a harmonia em todos os processos. Conciliar significa compatibilizar o pessoal com o laboral na vida das pessoas ou, em suma, possibilitar uma vida mais plena.

Quais os principais objectivos desta iniciativa?

Com a iniciativa “efr” – empresas familiarmente responsáveis -, a Fundacion Másfamilia [parceira do Programa AconteSer no que respeita ao equilíbrio entre a vida profissional e familiar] pretende incentivar as empresas para que estabeleçam um compromisso na geração de uma nova cultura de trabalho, que permita uma harmonia eficaz entre a esfera laboral, pessoal e familiar, tal como exige a sociedade actual. Esta nova cultura de trabalho incidirá na relação trabalho-pessoa-família e em uma série de indicadores-chave, tanto do ponto de vista da sociedade no seu conjunto, como do ponto de vista da empresa.

Que metodologia está pensada para integrar esta questão na vida das empresas e, em específico, na dos seus trabalhadores?

A iniciativa “efr” responde a uma nova cultura sociolaboral e empresarial baseada na flexibilidade, no respeito e no compromisso mútuos.

Todavia, as alterações na cultura de uma organização são as mais complexas e profundas de todas quantas se podem propor. Assim, em algumas ocasiões, para levar a organização a ser uma entidade familiarmente responsável, será necessário um processo de transformação com base na alteração de paradigma, no qual se exigirá uma nova cultura e numa nova forma de se abordar a administração e gestão das pessoas e as suas necessidades familiares.

Uma forma muito apropriada de enfrentar este verdadeiro desafio é colocando em prática um processo dinâmico de gestão e de melhoria contínua, em que, através de fases distintas – compromisso, diagnóstico, desenho e planificação do modelo, evolução e implantação, sem esquecer a mediação e o seguimento – a organização, possa, gradualmente e passo a passo, avançar para a concretização de esta mudança cultural.

Que acções estão previstas para implementar e disseminar este conceito?
Mediante a sensibilização da sociedade para esta alteração de paradigma no âmbito profissional e na sociedade em geral. E, graças ao Programa AconteSer, podemos torná-lo uma realidade em Portugal.

São várias as realidades sociais que contribuem para que, cada vez mais, vivamos numa cultura de “distância”, em empresas mecanicistas e famílias empobrecidas, o que torna cada vez mais premente esta necessidade de se conciliar o projecto familiar com o profissional. No momento particular que atravessamos, de crise, que principais obstáculos identifica no conflito entre estas duas realidades (trabalho-familia)?
Com a chegada da crise mundial, os problemas relacionados com a conciliação entre trabalho e família agravaram-se. Estes âmbitos, o profissional e o pessoal, têm de estar salvaguardados para tornar as sociedades mais ricas e com uma quota maior de felicidade que resulte num aumento da produtividade e da riqueza do próprio país.

A incompatibilidade dos horários laborais e escolares, a falta de políticas empresariais que promovam esta conciliação, as habituais pressões quotidianas, a falta de apoio por parte de superiores e colegas mas, não menos importante, a própria forma que cada um de nós constrói para combinar trabalho e família contribuem negativamente para uma aposta nesta temática. Como convencer os empregadores que a prática de politicas familiarmente responsáveis pode ter benefícios inegáveis para a produtividade e envolvimento dos colaboradores na missão da empresa?

Se tivéssemos de destacar apenas uma característica da nossa iniciativa seria a do compromisso. Uma entidade com o certificado efr®, não significa que seja “a” melhor empresa, mas sim aquela que se compromete, desde a administração aos seus empregados e vice-versa, numa melhoria contínua na gestão de pessoas, contando com a sua opinião e submetendo-se a uma auditoria externa para verificar esse compromisso e o cumprimento da normativa que temos desenvolvido na nossa Fundação.

Que “fórmulas” existem para ajudar também o colaborador a melhorar a questão da conciliação entre trabalho e família?
As entidades que pretendem comprometer-se com esta iniciativa “efr” devem trabalhar em cinco linhas:

Qualidade do emprego: são medidas que perseguem o fomento da estabilidade e redução da temporalidade, com o desenvolvimento de posições “flexi-seguras”, com programas específicos de compensações flexíveis e com programas de benefícios, pondo em marcha programas dirigidos a melhorar a saúde e o bem-estar pessoal.

Flexibilidade temporal e espacial: São medidas para conceder flexibilidade de horários laborais e distribuição da jornada de trabalho em outros períodos de tempo, o teletrabalho, licenças remuneradas, licenças sem vencimento mas com o posto de trabalho assegurado, entre outras.

Apoio à família dos colaboradores: incluem-se neste ponto as medidas concebidas para respeitar, facilitar e fomentar as relações dos colaboradores com o seu ambiente familiar. Estas medidas são dirigidas à maternidade, paternidade, ajuda a menores e a outros dependentes dos trabalhadores.

Desenvolvimento e competências profissionais: as medidas integrantes deste ponto são desenhadas para conceber carreiras profissionais de longo prazo que sejam compatíveis com a vida privada dos colaboradores.
Igualdade de oportunidades:
são medidas pensadas para o contexto da diversidade com o fim de fomentar a igualdade de oportunidades e, em especial, as que estão relacionadas com o género, incapacidade, idade, raça, nacionalidade, entre outras, tendo sempre em conta a liderança e os estilos de gestão e a própria perspectiva do género.

Para finalizar e a título de exemplo, gostaríamos de enumerar algumas políticas “efr” que empresas certificadas têm vindo a colocar em marcha:

  • Horários de trabalho contínuos, com saída às 16 horas;
  • Horários “à medida”, nos quais, por exemplo os empregados decidem quando levar a cabo 40% desse horário, tendo que cumprir 60% do tempo em comum com os demais;
  • Teletrabalho durante dois ou três dias por semana com os custos tecnológica  a cargo da empresa;
  • Teletrabalho diário para que uma parte da jornada laboral, por exemplo das 8h30 às 10h30, se realize a partir de casa.

A questão da “felicidade” tem vindo a ser crescentemente introduzida no contexto organizacional da actualidade. O que é afinal, uma empresa feliz com trabalhadores felizes?
Está confirmado que uma empresa que fomenta a felicidade entre os seus trabalhadores consegue uma maior quota de produtividade e de benefícios.

Um dos fenómenos mais preocupantes da nossa sociedade actual, exactamente porque não conseguimos encontrar um equilíbrio familiar e profissional, integra questões tão graves como a baixa taxa de natalidade, a deterioração da educação dos filhos e o pouco tempo que dispomos para eles e também a diminuição de cuidados com os idosos. Numa Europa a enfrentar um dos maiores desafios da sua mais recente história, que abordagens defenderia para invertermos esta tendência que, em alguns casos, põe até em causa as gerações futuras?
Segundo alguns estudos, em 2050, Espanha será um dos países mais envelhecidos do mundo [Portugal já é o terceiro], o que implica que não haverá substituição de gerações para fazer face às questões sociais que nos são impostas no dia-a-dia. E é por isso que pensar num futuro com medidas que possam solucionar esta problemática tão importante trará solidez aos projectos empresariais.

A seu ver e numa altura em que muitas das empresas estão simplesmente a tentar sobreviver, que abordagens mais simples (e, preferencialmente, com poucos custos) podem estas implementar para melhorar os níveis de conciliação?
Para a nossa Fundação, a conciliação é um eixo transversal que se deve utilizar como ferramenta para gerir o negócio e melhorar a sociedade. São mais os benefícios da conciliação do que os da não conciliação. As empresas que apostam em medidas neste sentido são mais produtivas e com muito maior retenção na guerra pelo talento.

Que principais problemas podemos esperar, nesta matéria, para este futuro próximo que se afigura tão “sem esperança”?
Precisamos de ser mais felizes na nossa vida pessoal e no nosso ambiente laboral. Com pessoas comprometidas e felizes, conseguiremos enfrentar um futuro com esperança.

Editora Executiva