A citação é do director geral do portal Universia, a grande aposta de responsabilidade social corporativa do Banco Santander. Em entrevista, Bernardo Sá Nogueira traça o percurso desta rede que chega já a 14 milhões de estudantes e professores. E, com uma aposta premente no Emprego, avança a criação de uma nova plataforma que irá reunir universidades e empresas e “criar uma oportunidade única de melhorar o mercado de emprego em Portugal”
POR HELENA OLIVEIRA
Como e quando surgiu a rede Universia e por que motivo a aposta no espaço ibero-americano?
A Universia começa a sua actividade em 2001 e é uma aposta clara por parte do Presidente do Banco, em termos de responsabilidade social corporativa, na qual opta por eleger o ensino superior. É igualmente importante perceber que o banco tem uma presença fortíssima na América do Sul, com um contacto com esses países e respectivas sociedades, e com uma disparidade social muito visível. Para além de se questionar a forma de ajudar esses países nos quais estamos a trabalhar e da questão do retorno à comunidade, existe uma vontade de certa forma “egoísta” que preconiza também o objectivo de crescer com a comunidade. Como é que, enquanto empresa, posso, a longo prazo, ajudar a comunidade onde estou inserido e a beneficiar-me também? Se a comunidade cresce, eu também vou crescer com ela. E qual é a melhor maneira de se ajudar uma comunidade a evoluir de forma positiva? É, obviamente, através da educação e das ferramentas que possamos disponibilizar para que esta cresça e se eduque. E é assim que nasce o Universia, como responsabilidade social corporativa e que pretende apostar nas universidades, através de uma plataforma online, para poder partilhar conhecimento, conteúdos, informação. Em suma, para contribuir para o crescimento dessas classes socialmente desfavorecidas.
Com uma comunidade que integra mais de 1200 universidades, de 23 países distintos e que chega a 14 milhões de estudantes e professores, como se gere todo este manancial de informação, culturas distintas e relacionamentos de cariz internacional?
A forma como conseguimos fazê-lo é, obviamente, devido ao facto de termos uma plataforma online. Através da criação de uma rede global de partilha de informação – sendo que o mundo online permite ser imediato e acessível a partir de qualquer parte do mundo – é possível facilitar tudo o que é intercâmbio de ideias ou partilha de conteúdos, de uma forma organizada e eficaz, em que é possível fazer downloads e uploads. Ou seja, é uma plataforma ideal para integrar esta comunidade enorme de professores e estudantes. A aposta em conteúdos de qualidade, nas parcerias com terceiros – seja ao nível da educação ou das empresas – permite-nos manter os conteúdos frescos e interessantes para a comunidade académica. A título de exemplo, posso focar uma parceria que temos com o MIT, através de uma plataforma que se chama OpenCourseWare, que visa a partilha de material docente entre professores: se um professor português está a fazer um trabalho sobre a civilização maia, por exemplo, é natural que um professor no México tenha acesso a outros recursos que o português não tem. E esta partilha de material e conhecimento através de uma plataforma comum é muito importante para os professores que se dedicam ao ensino e à investigação. Outro exemplo de parceria, em termos de informação de gestão e economia, é a que estabelecemos com a Wharton School of Management.
E no que respeita aos alunos?
Ao nível dos estudantes, o Universia tem um conjunto alargado de informações ao nível de cursos, bolsas, agendas culturais, entre muitas outras áreas. Ou seja, existe também uma partilha muito importante de conteúdo informativo para o estudante, mais ao nível local: um brasileiro, um argentino, um português ou um espanhol poderá ter acesso ao tipo de cursos, bolsas, candidaturas, médias de entrada existentes, entre variadíssimos tipos de informação, e localmente.
Um dos objectivos da rede Universia é apoiar as universidades no desenvolvimento de novos projectos. Que tipo de apoio é mais comum e que projectos são possíveis eleger nesta área?
Servimos, sobretudo, de ponte de ligação entre a universidade e a empresa. Ao estarmos associados a um grande grupo económico temos o conhecimento de como funciona uma empresa. Por outro lado, o facto de termos esta ligação com as universidades permite conhecê-las bem por dentro. E, mais ainda, ao termos universidades como sócias, temo-las do nosso lado. E é nesta dualidade que reside a nossa mais-valia: juntar as duas partes. Se hoje temos 1000 universidades sócias, por que motivo não termos, no futuro, 1000 empresas associadas a este projecto? Ou multiplicar mil por mil e fazer um milhão? O nosso futuro passa, a meu ver, por multiplicar este potencial. É unir ambos os lados e desenvolver projectos e iniciativas, que respondam e juntem os seus interesses. Tanto as universidades como as empresas são “bichos” relativamente complexos. Uma universidade tem formas de trabalhar e de ser que são complicadas. Mas uma empresa também não é simples, sobretudo para quem está de fora deste meio empresarial. Ambas têm regras e costumes diferentes entre si. Portanto e conhecendo as duas, podemos servir como esse elo de ligação de uma forma privilegiada.
É costume afirmar-se que, em Portugal e ao contrário, por exemplo, do que se passa nos Estados Unidos, as universidades e as empresas constituem-se ainda e em muitos casos como espaços sem ligação entre si. Todos sabemos que este relacionamento é fulcral para o desenvolvimento do país. De que formas é que a Rede Universia contribui para este estreitar de relações?
As universidades nos Estados Unidos são geridas muito mais como empresas do que em Portugal. Têm fundos, têm uma gestão e o facto de a própria universidade ter muito mais uma cultura empresarial, ajuda à aproximação das empresas e promove um entendimento mais útil. Penso que já é possível afirmar que existe, em Portugal, uma tendência crescente de aproximação, a par de uma profissionalização da gestão nas universidades. E, em vez de continuarem de costas viradas como aconteceu durante longos anos, há uma maior consciência da necessidade dessa aproximação. E a Universia pretende fomentar esse progresso e cooperação, constituindo-se como o motor que ajude a que isso aconteça. Desde 2002 que estamos, em Portugal, a tentar juntar as empresas e as universidades. E já se verifica que as empresas têm um crescente interesse em comunicar com os alunos e com as universidades. E, sendo por vezes complicado, nós conseguimos alavancar esse contacto com determinados projectos. O mais óbvio, por exemplo, é a área do Emprego: através de uma plataforma de emprego, que cria uma mais-valia para empresa, para a universidade e obviamente, para o estudante. E este é um eixo estratégico do Universia, sendo a Bolsa Virtual de Emprego, claramente, um exemplo disso. E depois existem outros projectos.
Está a referir-se ao Innoversia?
Exactamente. O Innoversia é um portal especialmente criado para fazer a ligação entre as empresas, as suas necessidades de inovação tecnológica e os investigadores ibero-americanos. No Innoversia, empresas de todo o mundo podem publicar as suas necessidades de desenvolvimento tecnológico e inovação, para que investigadores e cientistas proponham soluções pelas quais podem receber uma remuneração no caso de serem seleccionados. Este portal está a agora a ser criado e desenvolvido em Portugal e vai arrancar ainda este ano.
E no que respeita ao ciclo de conferências que também querem implementar?
Sim, uma outra ideia é criar um ciclo de conferências com conteúdos que sejam relevantes para os alunos e onde possa haver um patrocínio por parte de uma empresa que pretenda posicionar-se, do ponto de vista institucional, como uma marca dos alunos. E o facto de haver um patrocínio dessas conferências faz com que estas se tornem uma realidade. Ou seja, o patrocinador torna a conferência uma realidade, os alunos e as universidades beneficiam dessa experiência e a empresa dá exposição à sua marca junto de uma comunidade que lhe interessa, do ponto de vista institucional. Mais uma vez juntamos três partes e em que todas ganham. E esta é a nossa filosofia.
A rede Universia assume-se como uma referência internacional de RSC e conta com o patrocínio do Santander. Que produtos e serviços são de destacar para o fomento do primeiro emprego e da formação contínua?
Neste aspecto temos de voltar a falar da Bolsa Virtual de Emprego. Esta iniciativa está a funcionar desde Dezembro de 2007 e é uma feira presencial de emprego em 3D. A plataforma está muito bem feita, é dirigida essencialmente a estudantes universitários e jovens profissionais à procura do primeiro emprego, mas também oferece estágios, ou part-times. E, há duas bolsas atrás, criámos também aquilo que chamámos Bolsa Virtual de Emprego e Empreendedorismo. Ou seja, à medida que está cada vez mais complicado a pessoa encontrar um emprego qualificado, muitas vezes a única forma é a criação do seu próprio emprego. Assim, a iniciativa de empreendedorismo é também uma área que pretendemos trabalhar e apoiar. Ou seja, se não há soluções de emprego, há que o criar.
Por outro lado, e ainda na secção Emprego, e na troca de currículos e ofertas, temos também uma área importante de ferramentas, de ajuda aos alunos, que visa responder a questões de que são exemplo “como preparar o currículo”, “como preparar-se para uma entrevista”, ou seja, que tem como objectivo de ajudar o recém-licenciado ou o aluno que ainda está a estudar, a preparar-se para esse salto para o mundo real que é a procura de emprego.
Que resultados podem divulgar relacionados com a Bolsa Virtual de Emprego?
Nas sete edições de Bolsa Virtual, tivemos mais de 3,5 milhões de pageviews, mais de 250 mil pessoas passaram por elas e criámos mais de 5500 oportunidades de emprego. E, a partir de finais de 2010, a bolsa passou a estar disponível online a tempo inteiro. Até essa data, ficava online apenas duas semanas online, geralmente entre Abril e Maio e mais duas semanas em Novembro. Agora está permanentemente online, apesar de, em termos de comunicação, continuarmos com dois picos: por exemplo, fazemos “chats-colóquios”, com convidados que, através de uma webcam, respondem a perguntas dos alunos . Este ano contámos com a Laurinda Alves, com o Tiago Forjaz, da rede StarTracker, ou seja, procuramos convidar personalidades que são interessantes para os jovens e com as quais se conversa sobre o futuro, o talento, a procura de emprego, ou seja, de temas que são relevantes para os jovens.
Um dos projectos que já está em desenvolvimento, na área do Emprego, é um observatório para o futuro da Ciência e do Ensino Superior. Que objectivos tem este projecto e que resultados podem ser já apresentados?
O facto de nós estarmos presentes numa série de países e de sermos imparciais na nossa actividade – representando a grande maioria da educação em Portugal – e o mesmo acontecendo nos restantes países, permite-nos ter uma visão “helicóptero” da educação não só na Península Ibérica, como na América do Sul. Por exemplo, o Universia organiza, de cinco em cinco anos, encontros de Reitores das universidades que fazem parte da rede. Em 2010, o Universia deu continuidade ao Primeiro Encontro Internacional de Reitores celebrado, em 2005 na Universidad de Sevilla, com a organização do Segundo Encontro Internacional de Reitores em Guadalajara, México.
Este é um exemplo típico do nosso observatório, por assim dizer. Reunimos mais de 1000 reitores, ou seja 1000 universidades representadas ao mais alto nível, com o objectivo de debater os desafios que um mundo globalizado em profunda transformação, e cujas conclusões que saem desse fórum podem mudar a educação em várias partes do mundo. Um dos objectivos deste último encontro foi discutir a mobilidade das universidades na América do sul. Encontrar novas formas de melhorar a qualidade do ensino a longo prazo e um compromisso das universidades para trabalharem nesse sentido, e efectivamente, seis meses, nascem desta reunião uma série de compromissos, sejam eles a uniformização de currículos, a abertura de quotas para a transferência de alunos de um sítio para outro, ou seja, a mobilidade entre alunos das diversas universidades que não existia.
Mas existe já um intercâmbio efectivo entre alunos de países diferentes?
Sim, existe um enorme intercâmbio de estudantes, reconhecido pelas próprias universidades e professores que fizeram parte desta reunião, para além de um processo de convergência em termos de estudos e titulações, um sistema de avaliação comum que fomenta a confiança mútua entre os países, um programa para o impulso das redes universitárias de investigação associadas ao desenvolvimento conjunto de projectos, à formação de professores e doutores e à transferência do conhecimento.
Ou seja, é um poder, no melhor dos sentidos, que o Universia consegue ter nesta parte do mundo, sendo o nosso papel enquanto observatório, ao nível macro, internacional. A nível nacional, os nossos objectivos passam por criar espaços físicos e virtuais de debate e reflexão sobre as tendências do ensino superior que implica a participação de todos (empresas, instituições, universidades, governos, etc.) e ajudar os jovens universitários no processo da transição para as novas tecnologias (Universidade 2.0).
O nosso Conselho de Administração tem um conjunto de reitores que dele fazem parte e que podem reunir e partilhar ideias e isso já é criar uma parte desse observatório, pois permite aos reitores opinar sobre projectos e ideias que pretendemos implementar e afinar as nossas estratégias.
Está prevista, para 2011, a construção de uma plataforma que permite melhorar a forma como as universidades trabalham o mercado de trabalho. Que funcionalidades terá essa plataforma?
Considero que esse é um dos projectos mais relevantes que podemos desenvolver agora. Para além desta ligação empresa-universidade, o emprego é uma plataforma fundamental para nós. Há uns anos, entrámos no capital de uma empresa chilena que se chama trabajando.com e que tem uma plataforma excelente de emprego. Sendo o emprego um dos nossos pilares estratégicos, temos vindo a implementar e a desenvolver esta plataforma. Estando já em funcionamento em vários países, em Portugal, o meu objectivo é implementá-la este ano, ou nos próximos 18 meses. E a ideia é que todas as universidades possam partilhar a mesma plataforma de emprego, sem que percam o controlo da mesma – a plataforma é das universidades e não nossa – controlando tudo o que está na mesma, mas permita, automaticamente, uma partilha a nível nacional das ofertas. Se conseguirmos que as empresas passem a ter apenas um ponto de contacto para colocarem uma oferta que esteja visível em todas as universidades, será muito mais eficaz do que uma empresa ter que falar com 14 universidades, ou falar com as três mais obvias, podendo estar a desperdiçar o talento de outras 20 universidades que têm o mesmo potencial ou até melhor do que as mais obvias. Só essa possibilidade permite-nos criar uma oportunidade única de melhorar o mercado de emprego em Portugal. Mas podemos subir ainda mais um nível. Vamos imaginar que não só temos todas as universidades a partilhar os conteúdos de ofertas de emprego e de currículos dos seus alunos, como também vamos acrescentar aqui várias empresas que tenham as suas online e que alimentam automaticamente esta plataforma. E depois passemos ao nível estatal. Por que não as câmaras municipais, por exemplo, poderem usar também esta plataforma? Por um custo pequeno podem adquiri-la e passam a integrar esta rede. E mais ainda: por que não os alunos portugueses terem acesso às ofertas de emprego que existem em Espanha ou no Brasil? Ou seja, é um potencial enorme. Este é, sem dúvida, um dos grandes projectos que temos previsto para este ano na área de Emprego. É ambicioso, mas temos apoio de todas as universidades e existe um consenso geral de que isto é extremamente positivo e que todos ganham com esta rede de partilha de ofertas e currículos.
Vão também lançar o denominado Programa Athenea. Em que consiste?
É um projecto interessante, de e-commerce, que consiste uma loja online criada para dar ofertas muito boas aos alunos a nível informático. Ao juntar os seus esforços às universidades e a um fabricante de computadores, o Universia pretende lançar este projecto que permite a aquisição de computadores portáteis, a preços muitíssimo competitivos, aos integrantes da comunidade universitária de forma vantajosa, facilitando os estudos e a exploração de possibilidades de acção e avance na consolidação da sociedade de informação. Permite também às universidades canalizar uma parte do seu orçamento para apoiar o desenvolvimento das tecnologias de informação dos seus estudantes, através do subsídio directo dos PCs.
E que outros projectos e/ou iniciativas têm previstos para 2011?
A aposta contínua em conteúdos de valor para a comunidade académica, que é um dos nossos objectivos diários. Uma das formas que o Universia consegue garantir a qualidade dos seus conteúdos, é através do estabelecimento de parcerias que permitem a partilha e a divulgação de conteúdos interessantes e imediatos. Com tal, identificação e promoção de novas parcerias passa pelos objectivos do Universia para 2011.
Outras iniciativas importantes são a aposta local no Innoversia, de que já falámos, e o lançamento do novo projecto de emprego e organização de eventos e acções específicas nas universidades, como por exemplo o Netversia. Trata-se de um projecto que visa facilitar o dia-a-dia aos estudantes universitários disponibilizando portáteis nas bibliotecas das várias universidades envolvidas. Ao todo, serão disponibilizados 130 portáteis Acer (a mesma marca que está a trabalhar o projecto Athenea connosco) distribuídos por 65 bibliotecas universitárias, que podem ser usados gratuitamente pelos seus alunos e professores. O facto de alguns alunos ainda não possuírem um computador portátil, ou terem receio por motivos de segurança de o levar para a faculdade, faz com que este projecto se apresente como uma mais-valia para as universidades e para os seus alunos. Além dos portáteis Acer que irão estar disponíveis nas várias bibliotecas universitárias, irão ser também distribuídos diariamente 30 jornais “Público” nos expositores Netversia, para além de termos também estabelecido uma parceria com a Galileu, que promove cursos de profissionalização e outra com DBInforma, que nos disponibilizou uma série de bases de dados interessantes na parte de investigação de gestão e economia para os alunos. Tudo isto são parceiros que visam trazer mais-valias aos alunos.
Para além das conferências que queremos desenvolver, organizamos também eventos lúdicos que podem ser concursos de fotografia, de música, de bandas universitárias ao nível internacional e com óptimos prémios. E é algo que fazemos todos os anos e que é para “além-ensino”, contribuindo com uma parte lúdica para o aluno.
Falou também em novas parcerias…
Fechámos um conjunto de ovas parcerias, de que são exemplo a MyWay, na área da música ou com a CiênciaHoje, em termos de conteúdos para o portal. De sulinhar que a ideia não é só aumentar os conteúdos, mas ter conteúdos de qualidade e criar comunidades, sendo que a tendência é para que os conteúdos sejam cada vez mais criados pela própria comunidade que se move dentro do portal. Como sabe e com as alterações a que temos vindo a assistir particularmente nos últimos dois anos, é a própria comunidade que dita aquilo que deseja ver, em vez de ser ao contrário. Um portal estático que apenas indica que conteúdos é que as pessoas têm que ler já não funciona. Ou seja, têm que ser eles próprios a criar as suas comunidades de interesse, serem eles próprios a alimentar o portal…
Nota: Uma versão reduzida desta entrevista foi publicada originalmente no suplemento OJE Mais Responsável, do jornal OJE, a 15 de Março de 2011. |