Decorre desde há algum tempo em alguns círculos uma discussão – não só fascinante, mas também relevante para o nosso futuro comum – respeitante à designada “Carbon Bubble” (Bolha de Carbono) e que, na nossa opinião, não tem vindo a merecer a devida atenção por parte dos media e, consequentemente, da opinião pública. Mesmo após a realização da última Cimeira do Clima de Paris, a COP 21. Seguem-se algumas das suas implicações
POR CARLOS OLIVEIRA AUGUSTO

“We`re not going to be able to burn it all” – Barak Obama, 2014

O conceito da “carbon bubble” foi introduzido pela Carbon Tracker Initiative, um think-tank de especialistas financeiros dedicado à análise das consequências e riscos associados ao mercado de capitais na transição ordenada para uma economia de baixo carbono.

Neste contexto, e no pressuposto que o incremento da temperatura relacionada com o aquecimento global não deverá exceder 2ºC (2050), coloca-se a questão de saber qual a quantidade de combustíveis fósseis que poderá ser utilizada.

As estimativas apontam para um valor total de emissões derivadas da combustão de carvão, petróleo e gás natural de 2,795 GtCO2, contra apenas 565 GtCO2 permitidos pelas restrições decorrentes dos compromissos internacionais assumidos até 2050, ou seja, cerca de 80% das reservas conhecidas de energia fóssil não poderão ser utilizadas (unburned), sob risco de se ultrapassar o limite estabelecido para o aumento de temperatura.

De acordo com esta perspectiva, as empresas do sector petrolífero estarão, portanto, potencialmente sobrevalorizadas em cerca de 80%, originando os chamados “activos improdutivos” (stranded assets), o que representaria um risco elevado para os investidores institucionais (e.g., fundos de pensões e seguradoras) que nelas procuram, tradicionalmente, elevados dividendos.

Apesar da evidência, da pressão dos investidores e da evolução tecnológica que permite atingir cada vez mais elevados patamares de eficiência para as energias renováveis, aparentemente, tudo segue igual. Parece que a “bubble” ainda não tem assento nos board-rooms das multinacionais petrolíferas, tendo em conta as últimas movimentações do sector.

A Agência Internacional de Energia (IEA) prevê um aumento da procura global de energia em 30% no período de 2013 a 2035, sendo que a quota global das energias fósseis será de (ainda) 76% no final desse período, devido principalmente às necessidades energéticas das economias emergentes. Neste cenário, o aumento previsto da temperatura global por causas antropogénicas passa a ser de 3.6ºC (!) o que é inviável, tendo em conta o acima mencionado.

Como agir de modo a actuar de modo eficaz e a tempo de mitigar as naturais (e catastróficas) consequências daí advindas? Certamente, alinhando todas as partes interessadas de modo a desenhar uma estratégia global de mitigação das alterações climáticas, em nome do “Cuidado da Casa Comum”, o que não tem necessariamente acontecido até agora.

O que nos une, como Humanidade, são as consequências devastadoras de eventos meteorológicos extremos, a destruição massiva de ecossistemas e de biodiversidade, a acidificação dos oceanos, a escassez de água e de alimentos, a educação e a pobreza materializada no facto de 2,7 mil milhões de pessoas viverem com menos de 2 USD por dia, entre outros, o que nos conduz directamente à questão da urgente e inevitável adopção e implementação do paradigma do Desenvolvimento Sustentável.

O alinhamento de todos os stakeholders envolvidos – empresas, instituições, ONGs, governos e cidadãos – deve ser alcançado de modo a evitar crises ambientais, sociais ou económicas, como também poderá ser o caso, futuramente, da Carbon Bubble. No contexto actual, a “neutralização de carbono” é uma das ferramentas mais eficazes para contribuir, em simultâneo, para a satisfação das necessidades energéticas globais e para a contenção do Aquecimento Global.

Como exemplo prático deste alinhamento, deixamos um caso concebido e implementado pelo nosso parceiro nesta área, a consultora holandesa Face the Future com a introdução no mercado de “carbon neutral fuels”, nomeadamente, gás natural.

De modo a obter um significativo efeito de escala, a neutralização deve ser feita a montante, a partir das empresas produtoras/distribuidoras, com o objectivo de compensar as emissões dos automóveis, casas ou instalações dos consumidores finais. Desta maneira, pretende-se o seu envolvimento consciente num processo ambiental e socialmente responsável, possibilitando o financiamento de projectos de reflorestação, regeneração de solos, agricultura sustentável, e de apoio às populações através da implementação de tecnologias de biogás e de fornos solares em regiões desfavorecidas do globo.

Na Holanda, algumas empresas decidiram aderir a este modelo e decidiram neutralizar a totalidade do gás natural que fornecem aos seus clientes privados e corporativos, ao mesmo tempo que oferecem serviços que estimulam os clientes a reduzir os respectivos consumos, levando-os, deste modo, a identificarem-se com a filosofia da empresa no sentido da construção de uma sociedade mais equilibrada e equitativa.

A estratégia de comunicação é orientada para o facto de a neutralização respeitar exclusivamente às emissões de carbono que não se podem evitar, alertando ao mesmo tempo para as boas praticas como uma oportunidade de mitigar as alterações climáticas e de economizar. É também comunicado que – de acordo com estudos levados a efeito com a colaboração do Imperial London College – a compensação com créditos de carbono cria significativamente mais valor (cerca de 100 vezes) do que o seu custo.

Para quando em Portugal?

Nota: este artigo não teria sido possível sem a visão e o apoio de Kees Hoogendijk, CEO da Face the Future.

Engenheiro e CEO da FACTOR4Sustainability®

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