Como é possível um economista júnior não conhecer os Objectivos para o Desenvolvimento Sustentável? Como é possível que um financeiro recém-licenciado não saiba que o risco ambiental pode ter um impacto financeiro significativo? Como é possível que um designer de moda não conheça o conceito de economia circular? Como é possível ter um sistema de ensino que não ensina os seus alunos a serem indivíduos conscientes e com consciência?
POR SOFIA SANTOS

A sustentabilidade é um tema da agenda internacional e nacional. Disso não há dúvidas, sendo evidente o número crescente de notícias associadas às alterações climáticas, à economia circular, aos Objectivos para o Desenvolvimento Sustentável, entre outros.

Portugal, em 2016, foi o primeiro país a assumir o compromisso de ser neutro em carbono em 2050, sendo assim pioneiro na forma como consubstanciou a ratificação do Acordo de Paris. Atingir este compromisso implica baixar as emissões de Gases com Efeito de Estufa de forma significativa até 2050 em vários sectores, nomeadamente: 95% no sector da energia; 72% na indústria; 85% no sector dos edifícios; 98% no sector dos transportes; entre 38% a 69% no sector da agricultura e uso do solo e 77% a 80% no sector dos resíduos  [estas diminuições comparam com valores de 2005].

Vários países europeus estão também a identificar as mudanças que terão de ocorrer na sua estrutura sectorial e produtiva de forma a poderem também cumprir com o Acordo de Paris. Esta necessidade em reduzir drasticamente as emissões de CO2 constitui também uma imensa oportunidade de reinventarmos a economia e a sociedade: vão ser necessários novos modelos de negócio, novos produtos e serviços, novas formas de reutilização de recursos, novas formas de interdisciplinaridade … vai ser necessário desenvolverem-se competências nas várias áreas do saber de forma a permitir esta mudança.

Também as empresas sentem a necessidade de incorporar de forma efectiva a sustentabilidade no seu negócio, quer na concepção do produto e serviço, quer na ligação com os seus clientes e colaboradores, quer ao nível estratégico e no modelo de governação das empresas. A Comissão Europeia lançou, em 2018, o Plano de Acção para Financiar o Crescimento Sustentável, com o objectivo de alinhar o sistema financeiro com o Acordo de Paris e os Objectivos para o Desenvolvimento Sustentável, através de medidas concretas que induzam a reorientação dos fluxos de capitais para investimentos sustentáveis, a fim de assegurar um crescimento sustentável e inclusivo. Isto significa que a sustentabilidade será um tema essencial e central na área do saber associada aos mercados financeiros.

Em 2019 foi criada a Coligação de Ministros das Finanças para a Ação Climática, à qual Portugal aderiu, que tem como objectivos promover uma acção colectiva forte no tema das alterações climáticas e seus impactos. Os Ministros das Finanças desta Coligação assinaram os Princípios de Helsínquia, onde assumem o compromisso de alinhar as suas políticas e práticas com o Acordo de Paris, entre outros. Isto significa que as alterações climáticas e os objectivos do Acordo de Paris serão essenciais para se saber desenhar políticas fiscais a nível nacional.

Torna-se claro que falar em sustentabilidade, e em particular, de alterações climáticas, é falar-se de temas empresariais.

[quote_center]Todos os cursos deveriam ter uma cadeira sobre sustentabilidade e que estivesse adaptada ao curso em questão. Era essa a oportunidade que se deveria estar a dar aos jovens estudantes, uma vez que no futuro muitos dos empregos vão necessitar destas competências[/quote_center]

Assim, as organizações públicas, privadas e do terceiro sector encontram-se à procura de licenciados que possam ajudá-los a adaptar as suas políticas com os objectivos de sustentabilidade decorrentes da agenda internacional (Robinson, 2015).

Em Portugal esta procura tem vindo a crescer, sendo difícil encontrar e identificar os potenciais candidatos. Apenas os que conseguiram realizar alguma pós-graduação ou um curso de executivos, é que tiveram acesso a esse tipo de conhecimento. O autor Robinson, num artigo que escreveu precisamente sobre a educação e o tema da sustentabilidade, afirma que existe uma aceitação generalizada de que a educação formal tem um papel importante no ensino das competências na área na sustentabilidade, evidenciado, no entanto, que tal é bastante mais comum de ocorrer nos níveis mais seniores de educação, do que nos curricula dos cursos do ensino superior. Afirma também que é comum ver-se cadeiras optativas relacionadas com sustentabilidade em cursos superiores específicos, apelando, no entanto, à necessidade de se colocar o tema da sustentabilidade disponível para todos os alunos de todas as áreas. Todos os cursos deveriam ter uma cadeira sobre sustentabilidade e que estivesse adaptada ao curso em questão. Era essa a oportunidade que se deveria estar a dar aos jovens estudantes, uma vez que no futuro muitos dos empregos vão necessitar destas competências.

A sustentabilidade e a sua interacção com a ciência, tecnologia, design, arte, arquitectura, ambiente, psicologia, economia, gestão, análise financeira, entre outros, torna-se assim fundamental. Como é possível que hoje um arquitecto saia de uma universidade sem conhecimentos de arquitectura bioclimática? Como é possível que um engenheiro civil não conheça o potencial das infra-estruturas verdes? Como é possível que um gestor saído da universidade não saiba do Acordo de Paris? Como é possível um economista júnior não conhecer os Objectivos para o Desenvolvimento Sustentável? Como é possível que um financeiro recém-licenciado não saiba que o risco ambiental pode ter um impacto financeiro significativo? Como é possível que um designer de moda não conheça o conceito de economia circular? Como é possível ter um sistema de ensino que não ensina os seus alunos a serem indivíduos conscientes e com consciência?

Tudo isto deve existir se quisermos, de facto, manter a nossa qualidade de vida e o bem-estar dos nossos filhos e netos. Se quisermos promover a inovação com propósito e assente em princípios éticos. Vários são os exemplos à volta do mundo onde novas abordagens educacionais se vão desenvolvendo: The Camp, o Green FabLab de Barcelona, a UWC Red Cross Nordic, The New School Parsons entre muitos outros.

Como Portugal nunca é excepção á regra, em breve surgirá, com toda a certeza, um projecto audaz que ambicione proporcionar um conhecimento experimental, emocional e técnico com os olhos postos no futuro.

CEO da Systemic