Aproximando-se o final do ano letivo, é tempo de avaliações, exames e escolhas para milhares de alunos, nomeadamente para os estudantes que frequentam o secundário ou a faculdade. Este artigo é dedicado a eles
POR MARIA DE FÁTIMA CARIOCA
Recordo as questões que os alunos, em Harvard, sistematicamente colocavam a Clay Christensen ao despedirem-se da escola. Era um momento privilegiado para equacionar o seu futuro e, naturalmente, na sua maioria, o conselho e orientações que pediam ao professor focavam-se nisso mesmo. Essencialmente, tinham a ver com duas dimensões. Em primeiro lugar, a busca da realização profissional, ou seja: como posso ter a certeza de vir a ser feliz na minha vida profissional? Em segundo lugar, a busca de uma realização mais abrangente enquadrando os outros âmbitos da vida, por exemplo: como posso ter a certeza de que a família que escolher formar será uma fonte permanente de felicidade?
Ao conversar, seja com os alunos universitários que passam, no verão, pela Summer School da AESE, seja com a grande diversidade de profissionais e executivos com uma vida recheada de sucessos notáveis, que recorrem à escola para melhor se prepararem, muitas vezes vejo-os confrontarem-se, e confrontarem-me, com estas mesmas questões. Na verdade, raramente respondo diretamente a estas questões. Vamos conversando, falando sobre exemplos muito variados, em contextos e situações muito diferentes, do que então funcionou ou do que não funcionou. E, na maioria das vezes, há um momento em que se acende uma luz, a resposta ganha clarividência e ele próprio responde às perguntas que colocou e de forma muito mais perspicaz do que eu, provavelmente, o faria. Dito isto, considero que as orientações, muito simples, que Clay Christensen dava aos seus alunos permanecem válidas e relevantes.
Quanto à primeira questão sobre a realização profissional, Christensen aconselhava a refletir na teoria de Frederick Herzberg, segundo o qual o motivador mais forte nas nossas vidas não é o dinheiro, mas sim a oportunidade de aprender, crescer em responsabilidades, contribuir para o bem dos outros e ser reconhecido pela obra que se faz, o sucesso do que se concretiza, a marca pessoal que se imprime nas instituições por que passamos, nas pessoas com que trabalhamos. Este desejo grande, esta visão alargada do futuro profissional é importante à hora de escolher um curso, uma formação, uma profissão, um desafio profissional. Qualquer uma destas decisões não tem porque ser definitiva. Na maioria das vezes não o será. Dentro de 3 / 5 anos, quantos estaremos na mesma situação profissional? Mas, sendo sobretudo instrumental, pode contribuir para o crescimento profissional, pode abrir hipóteses e alternativas de vida, pode preparar-nos melhor para o futuro que ambicionamos viver. Daí que vale a pena ponderar, sem grande drama, mas séria e serenamente, cada uma das decisões que constroem o nosso percurso profissional.
Parênteses. Não resisto a acrescentar que Christensen considerava a gestão, quando bem exercida, uma das mais nobres profissões, por oferecer muitas oportunidades de ajudar os outros a aprender e a crescer, bem como de assumir responsabilidades, de ser reconhecido pelo que se realiza e de contribuir para o sucesso de uma equipa. Fim de parênteses.
Quanto à segunda questão – como posso garantir que a relação com a minha família e os amigos sejam uma fonte duradoura de felicidade? – leva-nos a considerar o nosso sentido de vida, que estratégia seguimos para gerir a vida e as relações que estabelecemos, a que iniciativas dedicamos o nosso tempo, energia e atenção. Ter claro um referencial de valores, um sentido, um propósito de vida é essencial, é estruturante para qualquer pessoa. A escolha e o exercício bem-sucedido de uma profissão deve ser apenas um instrumento para avançar na direção sonhada. Pelo contrário, sem um sentido, a vida pode tornar-se vazia, por muitas atividades que se realizem e sucessos que se atinjam. Para alguns estará enraizado na sua fé, para outros será a família, para outros ainda será contribuir para um mundo mais sustentável e uma sociedade mais próspera, justa e inclusiva. Mas, para todos, constituirá o sentido que preencherá e norteará a vida, desde as decisões quotidianas, às escolhas que nos exigem um maior compromisso, uma maior entrega e coragem.
A maioria destas decisões, em concreto muitas das que assumimos no dia-a-dia, não são decisões conscientes, explícitas. Não estamos sempre a pensar em como gerimos as prioridades e nas atitudes que tomamos. São habituais em nós. Fazem parte da forma como espontaneamente abordamos situações e problemas recorrentes. Fazem parte de nós e da cultura vivida no trabalho e em família. Sim, as famílias têm culturas, tal como as empresas. E essas culturas, as familiares e as empresariais, podem ser construídas conscientemente ou evoluir inadvertidamente. Se queremos que os filhos respeitem os outros, tenham espírito de serviço, brio profissional e confiança de que são capazes de resolver problemas difíceis, essas qualidades não se adquirem nem se desenvolvem por magia. Há que vivê-las no ambiente familiar desde muito cedo. E, tal como nas empresas, as competências desenvolvem-se com desafios exigentes e aprendendo o que funciona, ou não.
Este ponto leva-me a uma última reflexão. Ninguém se propõe conceber a vida ou tomar decisões para o insucesso. Contudo, muitas histórias de sucesso começaram com um fracasso. Henry Ford foi à falência antes de fundar a Ford Motor Company; Thomas Edison e os seus colegas testaram milhares de materiais antes de criarem a lâmpada de filamento de carbono; J. K. Rowling viu os seus livros serem doze vezes rejeitados antes de publicar o primeiro livro de Harry Potter, para dar alguns exemplos. O que torna histórias de insucesso em histórias de sucesso é a capacidade de aprender e aplicar o aprendido, com inteligência e persistência. Thomas Edison dizia que “as pessoas desistem porque não sabem quão perto estão do sucesso”. Em muitas situações é assim, noutras, como num exame ou numa prova desportiva que não corre como desejado, sabemos o que falhámos e porque falhámos, e temos uma ideia clara de aonde queremos chegar e do que podemos fazer para lá chegar. Em ambas as situações, o importante mesmo é refletir e aprender, seja com os sucessos, seja com os insucessos.
A resposta às questões iniciais é sempre pessoal, única. E vamos respondendo com a própria vida. Mais ainda, constituem um exame que vale a pena repetir, de tempo a tempo, sabendo que um verdadeiro determinante do sucesso pessoal é a forma como aprendemos e como incorporamos o aprendido nos nossos hábitos e na vida, tornando-nos melhores profissionais, melhores cidadãos, melhores pessoas.
Artigo originalmente publicado Jornal de Negócios. Republicado com permissão
Professora de Factor Humano na Organização e Dean da AESE Business School