Colocar os países sob o mesmo regime legal e reforçar o compromisso de cada um, com níveis de esforço diferenciados, para controlar a emissão dos gases de estufa, até 2020. É este o novo acordo encontrado após longos e duros dias de negociação, na Conferência climática de Durban (COP-17). Mas daqui a oito anos, “o esforço que seria necessário exigir a cada país, de modo a limitar o aquecimento global só a 2º C, será incomportável”, como comenta, em entrevista, Gonçalo Cavalheiro, partner da CAOS. Estamos pois, e já hoje, aparentemente condenados aos efeitos de “alterações climáticas catastróficas”
Mais de 24 horas depois do encerramento previsto (a 9 de Dezembro), do plenário informal da 17ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas para as Alterações Climáticas (UNFCCC), a ministra sul-africana das Relações Exteriores e Cooperação, e presidente da COP-17, anunciou que os 194 países chegaram a acordo sobre um programa para “definir um novo rumo para combater as alterações climáticas nas próximas décadas”. O acordo alcançado visa iniciar negociações para colocar os países sob o mesmo regime legal e reforçar o seu compromisso para controlar a emissão dos gases de estufa, matéria que deverá estar definida por cada país até 2015, e entrar em vigor até 2020. Ao longo de doze dias de árduas negociações, o apelo de Maité Nkoana-Mashabane para “não (se) fazer de Durban uma oportunidade perdida”, foi acompanhado em uníssono pelos responsáveis da União Europeia, dos Estados Unidos e do Brasil, contra a resistência da Índia e da China. Perante a única proposta de acordo colocada em cima da mesa, a que traduzia a posição da União Europeia em prol do respeito pelas metas traçadas pelo protocolo de Quioto e pela criação de um roteiro que conduza a um acordo, a ser negociado até 2015, abrangendo todas as nações em torno de metas, limites e calendário de redução dos gases com efeito de estufa, o Brasil manifestou o seu apoio inequívoco. E manifestou-o numa declaração assinada com os seus parceiros dos PALOP, em ruptura com o grupo BRIC (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), o que mereceu o comentário da comissária europeia para o Ambiente, Connie Hedegaard: “cabe agora aos Estados Unidos, Índia e China, ‘irem a jogo’”. Esforços diferentes para ricos e pobres A colaboração entre países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento para a obtenção de consenso em Durban terá sido fundamental, pelo menos na perspectiva da presidente da COP-17: “(o acordo) não teria sido alcançado se os países desenvolvidos tivessem posto o seu interesse em primeiro lugar, não teria passado se os países em desenvolvimento tivessem esquecido o espírito de que todos temos responsabilidades comuns, ainda que diferenciadas” na luta contra as alterações climáticas”. Maité Nkoana-Mashabane adiantou que “muitos países em desenvolvimento” afirmaram querer “fazer parte do futuro, mas que não podiam assumir neste momento os compromissos”, e a UE propôs um novo Protocolo de Quioto. Mas Quioto não nos levaria muito longe”, concluiu. Já a secretária-executiva da Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas, Christiana Figueres, considerou que a cimeira, “a mais longa da história”, traça “uma trajectória totalmente nova para o sistema” de combate às alterações climáticas”. E na verdade, para além “desse grande esforço” para alcançar compromissos para a segunda fase do Protocolo de Quioto, a reunião teve o mérito de abrir caminho “para um sistema mais amplo no futuro, aplicável a todos de uma maneira legal, e deu as ferramentas para que os países desenvolvidos ajudem os que estão em desenvolvimento”, como disse Figueres. Mas será que em 2020, quando o acordo alcançado na COP-17 entrar em vigor, os esforços que terão de ser feitos por cada país para controlar o aumento da temperatura global a 2º C – valor a partir do qual “dispara” o termómetro vermelho dos efeitos catastróficos provocados pelas alterações climáticas – serão ainda suficientes? Não. Como afirma Gonçalo Cavalheiro, em entrevista ao VER, deste “acordo histórico em que deixou de haver a clássica divisão ricos e pobres”, nasceu “um novo mundo”. Mas, apesar do compromisso exigido a cada país ser diferenciado “em virtude da sua responsabilidade histórica, da sua capacidade de agir, do nível actual de emissões e de riqueza e das projecções das respectivas emissões no futuro”, os esforços que teriam de ser realizados nessa altura são “incomportáveis”. Será comportável viver em catástrofe com a Natureza?
Quais serão, na prática, as consequências do acordo alcançado entre 194 países, que prevê um regime legal comum e um controlo mais apertado da emissão dos gases de estufa, até 2020? O Pacote de Durban inclui a segunda fase do Protocolo de Quioto, o relatório do AWG-LCA, a criação do Fundo Verde para o Clima e a Plataforma de Durban. Quais são as prioridades face ao possível contributo de cada um destes instrumentos no combate às alterações climáticas? O que pode significar este entendimento tão difícil, encontrado após doze dias de árduas conversações face à resistência da Índia e da China e de uma maratona negocial que prolongou a Cimeira mais de 24h? Significa que o futuro de cada país está em discussão nestas conferências. São relações internacionais no seu mais puro estado de defesa dos interesses próprios, num tema em que o interesse comum é a razão pela qual os países se reúnem em torno da mesa negocial. Como comenta o facto de o apoio do Brasil à proposta da UE colocada em cima da mesa ter sido considerado “de extrema importância” como instrumento de pressão sobre alguns países, tendo mesmo a comissária europeia para o Ambiente sugerido que “cabe agora aos Estados Unidos, Índia e China ‘irem a jogo’”? Como comenta a afirmação da presidente da COP-17 de que este acordo “não teria sido alcançado se os países desenvolvidos tivessem posto o seu interesse em primeiro lugar, nem teria passado se os países em desenvolvimento tivessem esquecido que todos temos responsabilidades comuns, ainda que diferenciadas? Na sua visão de perito, qual é, afinal “o rumo” a tomar para combater as alterações climáticas nas próximas décadas?
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Jornalista