Pouco ambicioso para uns, suficientemente promissor para outros, o novo plano de combate às alterações climáticas anunciado por Barack Obama na passada terça-feira será a última oportunidade para cumprir uma das suas promessas eleitorais. Resistindo aos bloqueios republicanos e aos senhores do carvão, Obama tem também de convencer o resto do mundo que, desta vez, a América joga a sério na cruzada contra o aquecimento do planeta É costume dizer-se que quando não se consegue vencer o inimigo, o melhor é juntarmo-nos a ele. Mas não foi exactamente isso o que aconteceu com o Presidente Obama com a apresentação de um plano abrangente para as alterações climáticas cumprindo, finalmente, uma das promessas da sua primeira campanha eleitoral, reiterada novamente no seu discurso de reeleição em Janeiro último. Neste caso, o”inimigo” é o Congresso que, desde sempre, se tem vindo a escusar reconhecer a urgência de um verdadeiro plano de acção ambiental e o que Obama conseguiu fazer foi “fintar” os republicanos que, de acordo com a imprensa norte-americana, mais depressa aboliriam a Agência de Protecção Ambiental (EPA, na sigla em inglês), do que deixariam passar a legislação ambiental. Assim, Obama concentrou-se num conjunto de medidas executivas que podem ser implementadas sem a ajuda do Capitólio e foi na Georgetown University, em Washington D.C. que, na terça-feira passada, apresentou o seu novo plano para o combate às alterações climáticas. A nova estratégia identifica três objectivos por excelência: a redução das emissões de carbono nos Estados Unidos, a preparação da nação para os efeitos provocados por um planeta em aquecimento e a liderança dos esforços globais para o combate às alterações climáticas. O VER apresenta as principais medidas unilaterais anunciadas em conjunto com algumas reacções que já se fizeram sentir face ao plano anunciado.
O corte nas emissões de carbono Sob as ordens directas de Obama, a EPA deverá propor a regulamentação para as centrais já existentes até 2014 e implementá-la até Junho de 2015. Para muitos dos observadores, é este é o principal eixo do plano apresentado pelo presidente norte-americano, o qual, contudo, não deixa de gerar polémica e críticas, nomeadamente por parte dos republicanos e dos grupos lobistas da indústria. Um dia antes do anúncio do plano, sete senadores enviaram uma carta ao presidente pedindo para abandonar a ideia, que consideram como “uma perfeita maluquice” numa iniciativa patrocinada por uma organização denominada “Count on Coal” [Conte com o Carvão]. Os críticos argumentam eu as novas regulamentações propostas servirão apenas para aumentar os preços da energia para os consumidores e reduzir postos de trabalho. Como se queixava um senador republicano do Kentucky, Mitch McConnell, “declarar uma guerra ao carvão é o mesmo que declarar uma guerra aos empregos” [os Estados Unidos possuem mais de 6500 centrais termoeléctricas]. Grande parte deste objectivo não é mais do que a continuação dos progressos levados a cabo no primeiro mandato de Obama, incluindo a aceleração do licenciamento das energias renováveis em terras públicas (com aposta particular na energia solar e eólica), a modernização da rede eléctrica e a implementação de normas mais rígidas de economia de combustível para os veículos. Se os ambientalistas aprovam estas novas medidas, a verdade é que criticaram o facto de Obama não ter estabelecido um “preço” para o carvão, algo que reivindicam há vários anos. Ainda neste eixo em particular, Barack Obama comprometeu-se a investir oito mil milhões de dólares em iniciativas inovadoras relacionadas com combustíveis fósseis e em projectos de eficiência que apoiem mais investimentos em tecnologias limpas. O plano do presidente estabelece ainda como meta a redução da poluição de carbono em pelo menos 3 mil milhões de toneladas, cumulativamente até 2030, com a implantação de parâmetros de eficiência para vários tipos de instalações e prédios federais. Como comentou Nicholas Stern, presidente do Grantham Research Institute on Climate Change and the Environment na London School of Economics, o discurso de Obama foi extremamente claro no que respeita à escala dos perigos provenientes das alterações climáticas e da responsabilidade dos Estados Unidos e dos demais países para agirem o mais rapidamente possível. Para Stern, “os Estados Unidos, com a sua tecnologia e empreendedorismo, têm toda a capacidade para liderar esta nova ‘história de crescimento com base em baixos níveis de carbono’”, afirmando também que o presidente esteve certo em colocar uma enorme ênfase na nova regulamentação para centrais termoeléctricas mais limpas, acelerar as renováveis, as normas de eficiência energética nos edifícios, veículos e aparelhos eléctricos, em conjunto com a importância da liderança, por parte do sector público, na implementação destas normas. O especialista da London School of Economics afirmou ainda que a visão do presidente para o papel do gás natural – enquanto projecto de médio prazo – está correcta e que poderá constituir a ponte necessária para as tecnologias limpas. Para os políticos e media norte-americanos que têm por hábito limitar a questão das emissões de carbono a uma “guerra” entre duas facções opostas – a promoção do crescimento e do emprego versus a protecção do ambiente – Obama tem também resposta: a criação de novos postos de trabalho está assegurada pela aposta nas tecnologias limpas e mais eficientes e as oportunidades de investimento em todo o mundo são igualmente muitas. “A economia pobre em carbono pode criar um enorme potencial de crescimento para o sector privado nos Estados Unidos e em todo o mundo”, assegura Nicholas Stern.
Preparar os Estados Unidos para o impacto das alterações climáticas Obama prometeu igualmente a construção de hospitais sustentáveis e resilientes para fazer face às condições climáticas extremas através de uma parceria público-privada com a indústria da saúde. Um “toolkit” centralizado que ofereça as ferramentas e a informação necessárias para os líderes estaduais, locais e do sector privado poderem trabalhar junto das comunidades é outra das iniciativas, em conjunto com a denominada Climate Data Initiative, que visa o acesso à partilha de “informação transparente” que possa estimular o empreendedorismo, a inovação, a descoberta científica e os benefícios públicos.
Liderar os esforços internacionais numa luta que é de todos No palco internacional, e de acordo com os observadores, um dos pontos mais substantivos das intenções da administração é negociar o fim das barreiras comerciais com vista a estimular o livre comércio de bens ambientais, incluindo as tecnologias de energias limpas como a solar e a eólica. Por outro lado, Obama fez saber que os Estados Unidos não planeiam financiar qualquer empreendimento movido a carbono fora das suas fronteiras, com excepção para os países mais pobres e sem alternativas e, em paralelo, apostar em instalações que sejam capazes de capturar o carbono emitido. Por outro lado, o interesse de Obama em dedicar uma grande parte do seu plano climático ao envolvimento internacional (e ter os Estados Unidos a liderar os esforços – depois da vergonhosa posição da América nos protocolos e cimeiras climáticas anteriores) deve-se à verdade dolorosa de que, sem a cooperação dos países mais poluidores do mundo, nenhum esforço realizado pelo seu país servirá de muito. A China, cujo poderoso crescimento económico tem vindo a ser literalmente estimulado por quantidades gigantescas de carvão, é agora responsável por mais de um quarto das emissões mundiais de acordo com a US Energy Information Administration. Os Estados Unidos foram responsáveis por “apenas” 17% das mesmas. Ou seja, convencer a China, bem como outras economias de rápido desenvolvimento como a índia, por exemplo, a limitar as suas emissões, é tão crucial para combater o aquecimento global como é a tarefa de convencer o resto do mundo desenvolvido a desistir da sua dependência face ao petróleo e ao carvão. E se Obama realmente deseja ficar na história como o presidente norte-americano que mais contribuiu para a mitigação dos danos ambientais, a sua última hipótese será a de o fazer na próxima cimeira climática das Nações Unidas que terá lugar em 2015, em Paris. O papel da China é, como habitualmente, dúbio nesta questão. A gigantesca nação tem vindo a defender uma maior margem de manobra para os países em termos de emissões, comparativamente com as nações ricas da Europa e da América do Norte. Adicionalmente, e apesar de Beijing já se ter comprometido a diminuir a intensidade do carbono na economia chinesa, o responsável pelas negociações climáticas, Su Wei, já veio rejeitar qualquer compromisso, anunciando que as emissões de carbono por parte do seu país continuarão a crescer até que o seu produto interno bruto per capita atinja uma dimensão cinco vezes superior à que tem na actualidade. O mundo precisa que a China se comprometa com reduções significativas o mais rapidamente possível, o que nos leva de volta ao plano de Obama para os Estados Unidos. Como é sobejamente conhecido, os esforços já efectuados para se chegar a um acordo internacional sobre as alterações climáticas descarrilaram sempre devido a uma substancial falta de confiança (e de vontade) entre os países e, em particular, devido à total ausência de empenho por parte de América de refrear os seus próprios excessos. Mas, a não ser que os Estados Unidos cumpram realmente as intenções anunciadas pelo seu Presidente, não parecem existir razões para que o governo de Beijing ou de outras nações potencialmente emissoras contribuam para um sucesso que só assim poderá ser denominado se for realizado a nível global. |
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Editora Executiva