POR MÁRIA POMBO
O tema da inclusão de pessoas com deficiência não deveria deixar ninguém indiferente e muito se tem escrito e falado sobre a importância de conceder os mesmos direitos a todos os cidadãos, independentemente da sua condição física ou intelectual. Porém, sabemos que muitas vezes, a distância entre a teoria e a prática é longa, em particular para aqueles que mais precisam de soluções. Exemplo disso são os passeios altos e estreitos ou a falta de rampas na maioria dos edifícios e transportes públicos, os quais constituem uma pequena amostra das contrariedades que as pessoas com dificuldades de locomoção enfrentam diariamente nas ruas de tantas cidades europeias, ficando assim cada vez mais isoladas.
Foi com o intuito de “criar uma Europa sem obstáculos para as pessoas com deficiência” que a Comissão Europeia criou, em 2011, o prémio Cidade Acessível. Esta é uma iniciativa que pretende reconhecer anualmente as cidades que melhor promovem a integração de todos os cidadãos, procurando estratégias que facilitem a mobilidade.
Garantir a igualdade de acesso aos direitos fundamentais, por parte dos cidadãos com deficiência, melhorar a qualidade de vida da população e garantir que todos (independentemente da idade e da condição física ou intelectual) têm a possibilidade de visitar todos os lugares e beneficiar de todos os serviços disponíveis nas cidades europeias é o principal objectivo deste prémio.
Tendo em conta a recente introdução de mecanismos e estratégias que facilitam a vida das pessoas com deficiência, Breda, na Holanda, foi considerada a Cidade Acessível 2019. De acordo com Marianne Thyssen, responsável pelo Emprego, Assuntos Sociais, Competências e Mobilidade Laboral, nesta cidade “os espaços públicos, como parques e lojas, por exemplo, são acessíveis a todos” e “as tecnologias digitais garantem que todos os cidadãos podem utilizar os transportes públicos para se deslocar”.
A cidade holandesa passa assim a ser considerada um modelo a seguir em termos de inclusão, inspirando outras cidades europeias a criarem e a desenvolverem projectos que facilitem a vida de todos os seus cidadãos.
Já na sua 9ª edição, este prémio destina-se a cidades europeias com mais de 50 mil habitantes, cujas estratégias de acessibilidade são avaliadas em quatro domínios: meio edificado e espaços públicos, transportes e infra-estruturas, informação e comunicação (incluindo as novas tecnologias), e equipamentos e serviços públicos.
A edição deste ano contou com a participação de 52 cidades. Para além de Breda, subiram ainda ao pódio as cidades de Évreux, em França, pela especial atenção dada às “deficiências invisíveis”, e a de Gdynia, na Polónia, pela aposta na inclusão de pessoas com deficiências intelectuais. O júri do concurso decidiu ainda atribuir duas menções honrosas: a primeira foi para Kaposvár, na Hungria, devido às melhorias que têm sido feitas na cidade, e a segunda foi para Vigo, em Espanha, tendo em conta a sua “arquitectura inovadora numa topografia difícil”.
Na cerimónia de entrega de prémios, que se realizou no dia 4 de Dezembro, Marianne Thyssen comentou que “num futuro próximo, a Lei Europeia da Acessibilidade complementará os esforços de Breda ao fixar normas europeias de acessibilidade no domínio dos produtos e dos serviços essenciais”, sublinhando que “os nossos esforços combinados a nível local e europeu são um factor de mudança para os mais de 80 milhões de europeus com deficiência”.
Importa explicar que, em Novembro último, o Parlamento Europeu e o Conselho Europeu chegaram a um acordo provisório sobre a Lei Europeia da Acessibilidade, proposta em 2015 pela Comissão, cujo objectivo é que diversos produtos e serviços (como serviços bancários, computadores pessoais, telefones, transportes e livros electrónicos, por exemplo) se tornem acessíveis também às pessoas com deficiência, permitindo que estas possam usufruir de uma maior oferta a preços mais competitivos.
Na mesma cerimónia, e como forma de assinalar o Ano Europeu do Património Cultural a Comissão Europeia decidiu atribuir um prémio a duas cidades – Viborg, na Dinamarca, e Monteverde, em Itália – por estas terem tornado o seu património cultural mais acessível a todos, dando também às pessoas com deficiência a possibilidade de o conhecerem e visitarem.
Ao declarar 2018 como o Ano Europeu do Património Cultural, a Comissão Europeia procurou promover um sentimento de pertença a um espaço comum europeu, reforçando junto dos cidadãos que “o património faz parte da nossa identidade cultural, dos valores e tradições que herdámos de gerações anteriores e que iremos transmitir às gerações futuras”. E quando se fala em património cultural fala-se em edifícios, monumentos, locais históricos, mas também em costumes, desporto, música, dança, folclore, artesanato e património natural (como paisagens, habitats da vida selvagem e biodiversidade).
Capacitar, sensibilizar, incluir
O prémio Cidade Acessível enquadra-se na Estratégia da União Europeia para a Deficiência 2010-2020 que, considerando que a inclusão de pessoas com deficiência é uma questão de direitos humanos, promove a sua total integração e participação na sociedade e reforça que é um tema que “não pode ser deixado à discrição de cada país”.
As pessoas com deficiência fazem parte de uma “enorme minoria” e os números revelam que, só na Europa, são cerca de 80 milhões, sendo que este número aumenta exponencialmente na terceira idade (em que mais de um terço dos cidadãos com mais de 75 anos sofre de algum tipo de limitações).
Esta estratégia (que está já na fase final) tem procurado, acima de tudo, “capacitar as pessoas com deficiência para que possam usufruir de todos os seus direitos e beneficiar plenamente da sua participação na sociedade e na economia europeias, designadamente através do mercado único”.
Com foco na eliminação de barreiras, a Comissão Europeia tem desenvolvido iniciativas em oito grandes domínios.
O primeiro é o da Acessibilidade, através do qual se procura “tornar os produtos e os serviços acessíveis às pessoas com deficiência e promover o mercado dos dispositivos de assistência”. O segundo está relacionado com a Participação e pretende garantir que as pessoas com deficiência têm condições para participar na vida pública e usufruir da sua cidadania, tal como qualquer cidadão que não tenha nenhum tipo de incapacidade. O terceiro domínio é o da Igualdade e, através dele, a Comissão pretende combater a discriminação e promover a igualdade de oportunidades junto de todos.
O quarto domínio – do Emprego – é, talvez, um dos mais difíceis de concretizar e pretende aumentar significativamente a taxa de participação no mercado de trabalho (que é bastante baixa) por parte de pessoas com deficiência. O quinto é o da Educação e procura promover acesso a um ensino de qualidade e à aprendizagem ao longo da vida junto de pessoas com deficiência, dando-lhes assim a possibilidade de participarem plenamente na sociedade e melhorarem a sua qualidade de vida.
O sexto domínio – o da Protecção Social – pretende combater a pobreza e a exclusão social deste segmento populacional. A sétima área de intervenção é a da saúde e procura promover a igualdade de acesso aos serviços e cuidados de saúde, sem discriminar em função da condição física ou intelectual dos utentes. Por fim, o último domínio é o da Acção Externa e pretende que os direitos das pessoas com deficiência sejam tratados no quadro do alargamento da UE e dos programas de desenvolvimento internacional.
A aplicação destes domínios tem passado por várias etapas. A primeira é a sensibilização da população, fazendo com que as pessoas com deficiência tenham conhecimento dos seus direitos e saibam como exercê-los. A segunda é a do financiamento, através do qual a UE pretende direccionar os seus apoios para as questões da acessibilidade e da não discriminação de pessoas com deficiência. A recolha e análise de dados sobre este tema é outra etapa, através da qual a Comissão tem vindo a realizar inquéritos sobre as barreiras (físicas e não só) à inclusão e integração social deste segmento populacional. Por fim, a discussão e o tratamento deste tema tanto pelos Estados-membros, como pelas instituições europeias constituem a quarta e última fase da aplicação desta estratégia.
Capacitar as pessoas com deficiência para uma participação plena na sociedade, independentemente da sua condição e em igualdade com os restantes cidadãos é o principal objectivo desta estratégia, a qual alerta para o facto de a população europeia estar a envelhecer e de serem cada vez mais necessárias estratégias e iniciativas de apoio àqueles que têm algum tipo de incapacidade. No mesmo documento, a Comissão Europeia apela à participação de todos os Estados-membros da UE, desafiando-os a construir uma “Europa sem barreiras para todos”.
Jornalista