Colecciona prémios nas mais diversas áreas relacionadas com responsabilidade social e sustentabilidade e acredita no poder combinado das redes humanas e tecnológicas. O VER falou com Manuel Posser Andrade e Lídia Cardoso, ambos Customer Relationship Managers da empresa em Portugal, que afirmam que “no centro dos nossos esforços de responsabilidade social, usamos os mesmos conhecimentos, tecnologia e parcerias que usamos no trabalho com nossos clientes”. E os resultados estão à vista
POR HELENA OLIVEIRA

Apesar de parecer uma questão já muito explorada, o tema da “responsabilidade social corporativa” tem diversas interpretações, em conjunto também com acções diversificadas, o que nem sempre torna fácil a sua definição. Para um gigante como a Cisco, como é definida a vossa estratégia nesta área?
A Responsabilidade Social na Cisco enquadra-se no âmbito da actividade das empresas multinacionais enquanto actores de uma relevância cada vez maior no contexto da governação global. Consideramos que se encontra ainda pouco sistematizado o estudo da empresa como agente da governação global através das suas práticas de Responsabilidade Social Corporativa. O tema, embora presente nos meios de comunicação social, divulgado pelas iniciativas globais, definido e reconhecido no seio dos Estados e das organizações internacionais de carácter intergovernamental ou até mesmo supranacional, aparece abordado ainda de forma pouco sistematizada e divulgada ao nível da relação da multinacional enquanto agente catalisador da governação global e do desenvolvimento.

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A Cisco tem contribuído para a Responsabilidade Social Corporativa (RSC) nas suas vertentes endógena e exógena. Em primeiro lugar, ao nível dos seus recursos humanos, fomentando o respeito pelos direitos humanos, pela diversidade étnico-cultural e de género, pelo ambiente, bem como fornecendo as condições adequadas a um equilíbrio entre a vida laboral e pessoal dos colaboradores. Em segundo lugar, associando-se a iniciativas lançadas no seio de organizações internacionais, pelo sector privado e outras, de carácter não-governamental, lançadas no seio da sociedade civil. Todas estas reconhecem a importância da intervenção do sector privado na promoção e execução de acções social e ambientalmente responsáveis, visando ao desenvolvimento global, porquanto todos são agentes da governação global. É no seio destas iniciativas, ainda, reconhecida a crescente importância da Responsabilidade Social Corporativa como veículo para o movimento na direcção de um desenvolvimento sustentado; as entidades do sector privado têm o reconhecimento, no seio destas iniciativas, da sua capacidade de influenciarem e agirem em direcção àquele.

Temos testemunhado o impacto positivo que a RSC tem tido sobre os nossos colaboradores, comunidades, meio ambiente, e também no nosso negócio. É por isso que acreditamos que a RSC é uma responsabilidade nossa e um diferencial competitivo, fornecendo também a evidência de como operar de forma consistente com o nosso apoio contínuo ao Pacto Global da ONU e os seus 10 princípios que cobrem direitos humanos, trabalho, meio ambiente e combate à corrupção.

No centro dos nossos esforços de responsabilidade social, usamos os mesmos conhecimentos, tecnologia e parcerias que usamos no trabalho com nossos clientes. Acreditamos que esta é a melhor maneira para termos um maior impacto, porque sabemos que uma rede inteligente não é apenas uma ferramenta poderosa para fazer negócios, mas também para transformar a vida das pessoas, construir comunidades e proteger o meio ambiente.

Por exemplo, no ano passado completámos nosso compromisso de três anos em Sichuan, na China, onde se construiu uma rede humana de múltiplos parceiros para ajudar a região a  recuperar e a reconstruir-se depois do terremoto devastador de 2008.

Trabalhando juntos, implementámos tecnologias de redes colaborativas em 66 centros de saúde e em 102 organizações de ensino.

Noutra vertente, temos a sustentabilidade ambiental, reforçada através dos nossos produtos e soluções, que ajudam a Cisco e os seus clientes a reduzir o consumo de energia e a economizar dinheiro. Por exemplo, os produtos Cisco Smart Grid, Cisco EnergyWise, Cisco Connected Workplace, Cisco TelePresence, e as nossas soluções de teletrabalho contribuem activamente para reduzir as emissões de gases de efeito estufa em todos os sectores da indústria, tais como serviços públicos, edifícios e transporte.

Mas quais as principais áreas de RSC a que se dedica a Cisco?
As principais áreas são o voluntariado, a Doação de Produtos, o Alívio em Situações de Fome e o Apoio nos Desastres Naturais.

É comummente afirmado que a Fundação Cisco tem um modelo inovador de actuação nestas áreas. Em que é que este se distingue das demais?
Mais do que um “passar um cheque” com um donativo para determinada instituição, a Fundação Cisco promove o envolvimento dos trabalhadores da empresa num tipo de voluntariado mais inovador que paga/doa à instituição 10 dólares por cada hora de voluntariado. A título de exemplo, um trabalhador Cisco que passe 4 horas de uma manhã a fazer voluntariado no Banco Alimentar (que faz parte da Fundação), para além do seu trabalho enquanto voluntário, está a beneficiar o BA com 40 dólares. Isto suscita uma determinação e sentido de responsabilidade acrescidos por parte dos colaboradores da Cisco, tendo em conta que se multiplicarmos este valor por vários voluntários, o impacto pode ser muito positivo para as instituições, até porque muitas delas, para além de trabalho de voluntariado, necessitam efectivamente de donativos para fazer face aos seus custos operacionais.

No entanto, também é possível a um trabalhador da Cisco fazer um donativo para uma instituição que faça parte da Fundação Cisco que, por seu turno, duplica esse valor.

Actualmente pertencem à Fundação Cisco [em Portugal], as Aldeias SOS, Associação Salvador, Cruz Vermelha, Fundação PT e Banco Alimentar.

A Cisco trabalha as questões da RSC com organismos internacionais como o UN Global Compact, com o World Economic Forum ou com a Global Education Initiative. Que grandes dividendos são retirados deste tipo de colaboração estreita?
Do apoio que a empresa dá a iniciativas como o UN Global Compact, podemos concluir que os dividendos se reflectem na aplicação dos seus princípios às políticas da empresa (princípios estes que cobrem direitos humanos, trabalho, meio ambiente e combate à corrupção).

Por exemplo, a Iniciativa Global de Educação (GEI, na sigla em inglês) foi estabelecida em 2003. A GEI aproveita parcerias público-privadas e tecnologias de colaboração para apoiar a implementação de modelos relevantes, sustentáveis e escaláveis para a educação. Foi reconhecida como um das mais bem-sucedidas iniciativas de trabalho e colaboração público-privada na área de promoção da educação. A GEI visa agora socializar, amplamente, conceitos com maior ênfase na qualidade e relevância da educação, tendo também lançado um novo fluxo de trabalho em 2008 para promover a educação para o empreendedorismo como um capacitador chave do desenvolvimento social sustentado e da recuperação económica. A GEI enfatiza o compromisso da Cisco relativo às parcerias público-privadas para a transformação da educação. Através desta iniciativa, a Cisco ajuda a demonstrar o papel que o sector privado pode desempenhar na concretização de um paradigma que reflecte a necessária mudança na educação. Para o sector privado, um sistema educacional eficiente é um factor crítico para o crescimento económico e para o desenvolvimento, para a construção de uma força de trabalho qualificada, aumentando o poder de compra dos cidadãos e melhorando a produtividade.

Com a ajuda da Cisco e da Intel, a UNESCO lançou um portal, na reunião do WEF, em 2010 que, através da colaboração virtual e do diálogo internacional, com a participação de líderes em educação, promover a Transformação Global na Educação (GET, Global Education Transformation). O portal é baseado na plataforma GETIdeas.org  – Cisco Global Education.

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Os Civic Councils constituem uma das formas de envolvimento com as comunidades. Como funciona o Civic Council em Portugal e que trabalho tem já no currículo?
Onde quer que exista um escritório da Cisco a nível mundial, existe a hipótese de ser criado um grupo de RSC denominado Civic Council que pretende desenvolver o envolvimento entre os trabalhadores e a comunidade circundante, especialmente com instituições e bairros mais necessitados. Trata-se de dar uma expressão local a uma estratégia global, no que diz respeito à responsabilidade Social da Cisco.

Apesar da Cisco Portugal já ter diversas iniciativas de voluntariado, o Civic Council de Lisboa foi formado em 2008 e, desde então, as iniciativas têm-se multiplicado, não só com as instituições que fazem parte da Fundação Cisco, mas também com outras como a Ajuda de Berço, o Bairro da Quinta da Fonte ou o Centro Recreativo do Talude. A Cisco permite aos seus trabalhadores fazer horas de voluntariado, mesmo em horário de expediente e que se envolvam com a comunidade.

Por outro lado, os Civic Council coordenam o Product Grant Program, no qual a Cisco doa equipamentos do seu portefólio, desde soluções de redes e telecomunicações, a instituições que precisem, para o seu funcionamento. A Entrajuda (ao qual pertence o Banco Alimentar) foi o mais recente beneficiário com uma solução de rede wireless no valor de 26 mil dólares, desenhada e implementada por engenheiros da Cisco.

O crescimento do Civic Council em Portugal ao longo do anos e as instituições que tem vindo a apoiar valeram-lhe o prémio de “Empresa Mais Socialmente Responsável” atribuído pelo Great Place to Work Institute, nos últimos três anos.

Nomeadamente em Portugal, que critérios utilizam para a escolha de instituições nas quais pretendem ter impacto?
O critério de proximidade é importante. A Cisco Portugal tem apoiado diversas instituições localizadas no Concelho de Oeiras, onde se situam os seus escritórios. No entanto, a escolha das cinco instituições que actualmente estão registadas na Fundação Cisco, prende-se com o facto de serem de natureza diversa, apelando a diferentes perfis de voluntariado. Assim, há quem prefira ajudar o Banco Alimentar e quem prefira trabalhar com crianças das Aldeias SOS. Outros preferirão dedicar-se à Associação Salvador ou à Cruz Vermelha. Também a Fundação PT, através do Programa Mão na Mão, organiza actividades de voluntariado com idosos, reclusos, crianças, etc.

E de que forma é feito o acompanhamento destas iniciativas?
Um dos aspectos de RSC que consideramos mais importantes é o facto de, ao contrário de outras empresas, não existir ninguém cujo trabalho a tempo inteiro seja o de coordenar as diversas iniciativas. Na Cisco existe uma equipa “core” do Civic Council que define a estratégia e planeia as actividades, mas sempre numa base de voluntariado, muitas vezes trabalhando horas extraordinárias, o que reflecte a máxima de que “quem corre por gosto não cansa”. Esta equipa conta com o apoio da gestão de topo e é constituída por 13 elementos que têm como missão envolver a restante empresa nas campanhas de voluntariado e donativos.

No actual clima de incerteza, as empresas verdadeiramente socialmente responsáveis devem ter uma particular atenção no que respeita aos seus colaboradores ou à sua RS interna. A Cisco possui algum programa específico nesta área?
Inserido na política de Recursos Humanos, a Cisco apoia todos os seus colaboradores em necessidades específicas que possam ter e existem casos de pessoas com problemas visuais ou motores que beneficiam de condições adaptadas às suas situações. Também ao nível da maternidade e paternidade, existem condições mais flexíveis, como a possibilidade de se trabalhar a partir de casa, o que assume especial relevância em certos casos mais difíceis como os de famílias monoparentais que podem acompanhar os seus filhos em casa, por exemplo em caso de doença. Para tal, a Cisco oferece aos seus colaboradores Internet em casa.

Existe ainda um shuttle que transporta os trabalhadores da Cisco de Lisboa para Oeiras (onde são os escritórios da Cisco) e de volta para Lisboa, como forma de fazer face aos custos crescentes de transportes e combustíveis.

Como comentam a evolução da RS em Portugal? Consideram que já está suficientemente “sistematizada” e integrada no mindset das empresas ou continuamos a assistir a muitas acções isoladas, sem verdadeiro impacto para os stakeholders?
Há uns anos atrás havia muito o marketing da Responsabilidade Social, com uma forte componente apenas na imagem e “branding”. Julgo que essa realidade está a mudar: apesar de não termos conhecimento de causa profundo de RSC noutras organizações, temos observado inúmeros bons exemplos de Responsabilidade Social que criam um impacto positivo para os stakeholders. As organizações portuguesas começaram a perceber que, envolvendo os seus trabalhadores de uma forma consistente em iniciativas de Responsabilidade Social, retiram daí benefícios, pois estes passam a respeitar mais a organização, para além da criação de uma forte componente motivacional que os leva a “vestir a camisola” e a criar laços com a própria cultura empresarial. Consideramos, no entanto, que este mindset existe mais nas empresas de maior dimensão que nas PME.

Editora Executiva