A Associação de Empresários pela Inclusão Social (EPIS) criou, em 2006, um programa de combate ao insucesso e abandono escolares. Sete anos passados e foram 1700 os jovens em risco que se transformaram em bons alunos e adquiriram competências cruciais para as suas vidas. Alargar o âmbito do programa a todo o território nacional e aumentar a taxa de sucesso escolar são os próximos exames que estes empresários ambicionam passar. E com distinção
POR MÁRIA POMBO

A Associação de Empresários pela Inclusão Social (EPIS) apresentou recentemente, numa conferência que teve lugar na Assembleia da República, os resultados do seu projecto “Mediadores para o Sucesso Escolar”. Este é o maior programa privado de combate ao abandono e insucesso escolares em Portugal, o qual pretende oferecer aos jovens em risco um modelo específico de capacitação para o sucesso ao longo da vida.

Numa cerimónia que contou com a presença de parceiros da associação, alunos e familiares, especialistas em educação e representantes de diversos grupos parlamentares, a EPIS apresentou a sua metodologia, testada e comprovada, demonstrando de que forma esta tem sido eficaz e nomeando os seus principais benefícios. O objectivo é alargar a dimensão deste programa, tornando-o público e nacional, com vista a abarcar um maior número de escolas e municípios do País. Como comentou o director geral da associação, Diogo Simões Pereira, a ideia é que este “deixe de ser um programa da EPIS e passe a ser de Portugal”.

O projecto nasceu em 2006 e foi posto em prática no ano seguinte, em resposta a um problema equacionado pelo então Presidente da República, Jorge Sampaio, que apelava à promoção da inclusão social. O presidente da EPIS, Luís Palha, relembrou que a associação elegeu como foco primordial a população em idade escolar e que “a ideia era não deixar de fora as camadas mais jovens da sociedade”, privilegiando “os jovens que já tivessem poder de decisão”. No entanto, o programa foi alargado a outros grupos e actualmente acompanha jovens a partir do segundo ciclo de escolaridade (que começa no 7º ano).

Na sessão de abertura da conferência, o presidente da associação salientou ainda a presença dos deputados como um sinal de que a missão da EPIS, não somente em teoria, mas com acções concretas, tem merecido a devida atenção, referindo que se trata igualmente do “reconhecimento de que há métodos que ainda não estão institucionalizados, mas têm valor para o País”.

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Trabalhar as competências e envolver as famílias
Seis anos passaram desde a implementação do programa e os resultados não deixam margem para dúvidas: são mais de 1700 os novos bons alunos que, com o apoio dos mediadores, contribuíram para a redução das taxas de insucesso escolar de 60 municípios portugueses. Em 2013, 67% dos alunos acompanhados (mais 147 do que no ano anterior) transitaram de ano, um valor que permitiu um aumento de 12% da taxa de sucesso escolar.

O projecto existe actualmente em 120 escolas de 25 concelhos portugueses e prepara-se para registar o maior alargamento de sempre. Já a partir do próximo ano lectivo, os mediadores irão apoiar não só alunos em novas escolas, mas também, através de um outro programa focado na empregabilidade dos jovens, em centros do IEFP (Instituto do Emprego e Formação Profissional) e novas autarquias, fixando-se inclusivamente nos arquipélagos dos Açores e da Madeira. Este alargamento permitirá uma quase duplicação do número de mediadores (que deixam de ser 84 para passarem a ser 150).

No entanto, e segundo as contas dos empresários, esta centena e meia de mediadores permite satisfazer, relativamente à taxa de sucesso escolar, apenas 10% das necessidades do País. Potenciar este programa e torná-lo público é, na opinião dos seus promotores, a única forma de estas necessidades serem totalmente satisfeitas e de o abandono e insucesso escolar passarem a ter uma expressão residual e pouco significativa. Este é o programa mais emblemático da EPIS e “aquele que tem mobilizado a maior parte dos nossos recursos”, salientou Luís Palha.

Os alunos com insucesso escolar “têm um problema transversal, que se traduz em muitas negativas na escola”, explicou Diogo Simões Pereira. Na medida em que é no núcleo familiar que, muitas vezes, “nasce” esta falta de atenção e interesse pela escola e pela vida, é urgente inverter esta realidade, sendo por isso necessária uma ajuda global que se estenda também à família. É aqui que reside a “fórmula mágica” deste programa, potenciando o sucesso escolar dos alunos e a diminuição significativa de abandono escolar, de ano para ano: através deste método, os alunos trabalham individualmente as suas competências não cognitivas (também denominadas soft skills) num triângulo que actua e acompanha estes jovens no contexto familiar, na escola, nas autarquias e/ou nas comunidades onde se inserem.

Segundo a EPIS, estas competências revelam-se de extrema importância por serem aquelas que melhor ajudam a alcançar êxito na vida, permitindo que os alunos sejam organizados, disciplinados, abertos a novas experiências, colaborativos e sociáveis, ao mesmo tempo que fortalecem a estabilidade emocional dos mesmos. No fundo, o que os mediadores fazem é “reeducar” estes jovens, para que sejam capazes de cumprir tarefas, organizar o estudo e controlar a ansiedade, dando-lhes ferramentas que os ajudam a interessar-se mais pelo mundo que os rodeia.

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Um programa que actua “a 360 graus”
Uma das inovações deste programa reside na profissionalização dos seus agentes (os mediadores): estes são profissionais, das áreas da educação, psicologia e acção social, com contrato de trabalho e que exercem funções a tempo inteiro. É desta forma, com profissionais dedicados exclusivamente aos jovens que acompanham, que o programa actua “a 360 graus”, como evidenciou Diogo Simões Pereira para explicar a globalidade, a abrangência e o sucesso do mesmo.

A acção dos mediadores é feita de forma progressiva. Existe a fase de identificação dos alunos de risco, depois da qual se segue um plano individual que permitirá que se treinem as competências, já referidas, de responsabilidade, disciplina e estabilidade emocional. Numa fase posterior, o aluno consegue reduzir o número de negativas e aumentar o seu interesse pela escola, em particular, e pela vida, no geral. Findo este processo, o estudante chega à “zona de aprovação”, adquirindo uma maior autonomia.

A metodologia utilizada pela EPIS tem sido citada em diversos estudos e documentos internacionais. Um dos exemplos mais notáveis é o facto de ter sido referenciada por James Heckman, prémio Nobel da Economia em 2000. Este académico valoriza o facto de o programa da EPIS se focar nas capacidades individuais não cognitivas para incrementar o sucesso escolar, considerando que esta estratégia é igualmente eficiente do ponto de vista económico, tendo em conta a relação entre os seus custos e os benefícios.

Uma outra característica do programa, que Heckman também defende, está relacionada com a “não-fatalidade” do insucesso escolar: o facto de uma criança ter nascido numa família que não a incentiva não é, nem pode ser, impedimento ao sucesso escolar da mesma. O economista considera ainda que este tipo de apoio, em conjunto com o investimento financeiro realizado, têm retornos mais elevados, a par de resultados mais eficazes, se forem aplicados logo desde tenra idade (argumentando, inclusivamente, que a primeira infância é a idade ideal para incutir determinados valores).

Um programa “coerente, consistente e consequente”
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O programa “Mediadores para o Sucesso Escolar” foi criado pela EPIS para combater o insucesso escolar, aumentar o interesse dos jovens pela escola e pelo mundo que os rodeia, com o objectivo de estes se tornarem cidadãos mais informados e conscientes. Alguns destes jovens optam por escolher uma profissão, após a conclusão do ensino obrigatório; outros preferem continuar a estudar e obter uma licenciatura. E muito poucos foram aqueles que ficaram para trás neste caminho. Na cerimónia de apresentação dos resultados do programa, vários foram os convidados, das mais diversas áreas e ideologias, que fizeram questão de dar o seu testemunho sobre a validade e eficácia do mesmo.

Eduardo Marçal Grilo, administrador da Fundação Calouste Gulbenkian, explicou que, desde sempre, foi ensinado a “fazer coisas”, congratulando a EPIS precisamente por este motivo: “porque faz coisas, e coisas com sucesso”. Uma das mais-valias do programa, no seu ponto de vista, é o facto “procurar os talentos que cada um tem, rentabilizando-os”. O antigo ministro da Educação salientou também a importância do papel dos mediadores na aproximação do jovem à família, referindo que, muitas vezes, é com esta mediação que “os pais têm consciência dos reais problemas dos filhos”.

Já Armando Leandro, presidente da Comissão Nacional de Protecção das Crianças e Jovens em Risco (CNPCJR ) optou por enfatizar uma questão mais global, ao considerar que “é fundamental a questão dos direitos humanos e da educação para todos”, defendida e implementada pela EPIS. Referindo que apesar da vontade de este programa se estender a todo o território nacional, a Comissão a que preside “defende o localismo”, na medida em que “cada local tem uma identidade com passado e presente, mas também com futuro”. Para Armando Leandro, as necessidades e os problemas destes jovens não devem ser generalizados, tendo em conta que “cada caso é um caso e isso não se vai perder”.

Por seu turno, Félix Esménio, vice presidente do Conselho Científico do IEFP, usou uma metáfora para ilustrar a importância desta metodologia: “existe um pilar que se chama Educação e outro que se chama Trabalho, e o que falta muitas vezes é uma viga que os una, chamada Afectividade”. Na sua opinião, é esta ligação que, muitas vezes, falta a estes jovens, e que o mediador ajuda a “construir”.

Na qualidade de representante do Partido Socialista, Gabriela Canavilhas reforçou a ideia de que “nós não temos que ser piores que a média europeia no que diz respeito ao sucesso escolar”. A deputada defende que “em tempos de diminuição do investimento público, é ainda mais importante uma escolha acertada desse investimento” e que cabe à comunidade educativa alertar os decisores para a urgência desta opção. A ex-ministra da Cultura terminou o seu testemunho com a ideia de que “o pior défice português é o da educação”, tendo em conta que “quando este for vencido, todos os outros [défices] também serão”.

Por último, Sérgio Figueiredo, vogal da direcção da EPIS e em representação da Fundação EDP (parceira da associação) sublinhou também que “o Estado pode, através das políticas públicas, mudar o chip e gerir as políticas educativas do seu território”.

O antigo jornalista considera que este programa não é, nem pretende ser, uma empresa, mas sim uma resposta social do movimento empresarial português, tendo em conta que “é consistente (porque se mantém, desde que surgiu), coerente (porque tem um foco de actuação) e consequente (porque tem resultados)”. Sérgio Figueiredo terminou a sua intervenção reforçando a ideia de que “o teste está feito, o piloto resultou e a metodologia funciona”, revelando-se confiante e orgulhoso daquela que foi também, um dia, uma sua escolha – abraçar este programa.

Jornalista