A ilha de São Miguel, nos Açores, proporciona-me a plenitude que não consigo encontrar na cidade e na confusão profissional e pessoal que nos envolve no dia a dia. Gerir prioridades é difícil num contexto de estímulos imparáveis, pressões diárias e urgências constantes, esquecendo-nos da importância extrema que o nosso bem-estar tem para o nosso desempenho. Num mundo em que tudo é para ontem e em que a noção do tempo necessário para fazer as coisas tende a ser negligenciada, assumindo-se que os outros são super-heróis com energia infinita, a importância de valorizarmos o tempo de contemplação é cada vez maior
POR SOFIA SANTOS

Contemplar a natureza pode ser uma forma de alcançar um sentimento de plenitude e de conexão com o mundo que nos rodeia. Ao pararmos para apreciar a beleza dos ambientes naturais, como florestas, montanhas ou oceanos, entramos num estado de presença que nos afasta das preocupações diárias. Este momento de pausa não só nos permite refletir sobre as nossas vidas, como também nos ajuda a reconhecer a vastidão e a complexidade do mundo.

Ao observarmos a natureza, lembramo-nos da interconexão de todas as coisas, o que pode resultar numa maior apreciação da vida e do momento presente. Estudos indicam que os momentos de contemplação podem aumentar os nossos níveis de gratidão e contentamento, promovendo uma sensação duradoura de bem-estar, felicidade e satisfação pessoal. Assim, a contemplação pode ser vista não só como uma prática de relaxamento, mas também como um caminho para cultivar um profundo sentido de plenitude e de ligação interior, que nos proporciona um sentimento de pertença e de propósito na vida.

Passar tempo em ambientes naturais está associado a uma melhor saúde mental e a um aumento da capacidade de concentração. Contemplar a natureza não só revigora o espírito, como também fornece a energia necessária para um melhor raciocínio e criatividade, criando um ciclo positivo que beneficia tanto o indivíduo como a sociedade.

A Ilha de São Miguel é um ótimo local para contemplar a natureza e os sons que esta nos oferece: o chilrear das cagarras à noite, que nos leva a fechar os olhos para tentar perceber o que estarão aquelas aves a dizer com tamanho alarido; os cachalotes, que, antes de mergulharem a mais de mil metros de profundidade durante 45 minutos, expelem um jato de água inesquecível; os golfinhos, que saltitam e, nesta época, vêm acompanhados dos filhotes, expirando de forma graciosa, simpática e afável.

Estar em sintonia com estes sons é um convite para abrandar o ritmo, para parar por um momento e apreciar o que nos rodeia. Ao ouvir os sons da natureza, como os das cagarras, dos cachalotes e dos golfinhos, estamos, de facto, a sintonizar as nossas emoções com a harmonia do mundo à nossa volta. Esta ligação pode ter um efeito terapêutico, permitindo-nos encontrar um espaço de calma no meio do caos da vida moderna.

Viver em harmonia com a natureza não só nos beneficia individualmente, como também contribui para um mundo mais equilibrado. A preservação dos habitats naturais e a proteção das espécies que habitam o arquipélago dos Açores são essenciais para garantir que as gerações futuras possam continuar a desfrutar da beleza e dos benefícios que a natureza oferece. Cada som que ouvimos é um lembrete da nossa interdependência com o meio ambiente e da necessidade de o protegermos.

As caminhadas pelos vários pontos de São Miguel — proponho o Trilho Circular das Sete Cidades, com 21,5 km — fortalecem a nossa ligação com o mundo natural, ajudam-nos a relativizar a nossa vida e a perceber o que é mais importante para cada um de nós. No meu caso, sem dúvida, a plenitude e o sentimento de pertença e utilidade.

A natureza dos Açores funciona como um poderoso lembrete da importância de nos ligarmos ao mundo que nos rodeia. Os sons das cagarras, dos cachalotes e dos golfinhos são mais do que meras notas numa sinfonia: são um convite para procurarmos um estado de bem-estar emocional, de harmonia e de ligação, tanto connosco como com os outros. Ao vivermos mais em sintonia com a natureza, não só cuidamos do nosso próprio espírito como também do planeta que todos partilhamos. E isso só pode trazer coisas boas.

Sofia Santos é CEO da Systemic. É economista e especializada em sustentabilidade e financiamento climático, com 27 anos de experiência profissional entre bancos, empresas, ONG, setor público, e agências bilaterais e multilaterais em Portugal e em África. É licenciada em Economia pelo ISEG, mestre em Economia pelo Birkbeck College na Universidade de Londres e Doutorada pela Middlesex University em Londres sobre o papel dos bancos na promoção do desenvolvimento sustentável

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