Distinguida de forma inédita com prémio europeu “Civil Society Prize” pelos seus projectos de empregabilidade social, a Associação que desperta consciências vê confirmada na distinção do CESE “que a pobreza se combate através de um projecto pessoal e de vida”, onde o acolhimento e a valorização da experiência e potencial de cada um, aliados à formação profissional e ao acesso ao trabalho são “obrigatórios” para erradicar “seriamente a fome e a indigência”. Num país onde ainda impera a esmola, a CAIS revela, na maioridade dos seus 18 anos, que só assim é possível quebrar um ciclo que tende a persistir, como diz ao VER o seu director, Henrique Pinto A CAIS foi distinguida com o prémio “Civil Society Prize 2012” pelo Comité Económico e Social Europeu (CESE), em reconhecimento pelos seus projectos de empregabilidade social. A Associação, que em 2012 assinala dezoito anos de existência, é a primeira instituição portuguesa a ser reconhecida com o prémio europeu, tendo sido seleccionada entre outras organizações dos 27 estados membros da União Europeia. O CESE, que instituiu este galardão para reconhecer e encorajar iniciativas de organizações sociais que contribuam significantemente para promover a identidade, integração e cidadania europeias, atribuiu este ano à CAIS um meritório segundo lugar, pelos seus projectos de empregabilidade social no âmbito do Programa CAHO – Capacitar Hoje, destinados a pessoas desempregadas e em situação de pobreza extrema. Para Henrique Pinto, director da Associação CAIS, esta distinção do Comité Económico e Social Europeu “vem sobretudo confirmar que a pobreza se combate através de um projecto pessoal e de vida, onde o acolhimento afectuoso construído em habitação própria e o bom uso da experiência e potencial de cada um, aliados a espaços de formação profissional e, por fim, o acesso ao trabalho, são momentos cruciais obrigatórios, que a esmola, os bancos alimentares e a cantinas sociais nunca poderão vez alguma subestimar, se desejarem seriamente erradicar a fome e a indigência”.
A única receita Nem a propósito, o Eurostat divulgou há dias que, em 2011, 2,6 milhões de portugueses viviam em risco de pobreza ou exclusão social – um número que equivale a praticamente um quarto do total da população (24,4%). Ainda assim, segundo os dados do gabinete de estatística da União Europeia, verifica-se uma redução da pobreza em Portugal já que, em 2010, 25,3% dos habitantes estavam em risco de pobreza, contra os mais de 26% registados em 2008. Nos últimos três anos, este indicador caiu 1,6%, aponta o Eurostat. No que respeita à zona Euro, e considerando exclusivamente o indicador do risco de pobreza, Portugal é ainda o terceiro país com maior percentagem de pobres, a seguir à Espanha (21,8%) e à Grécia (21,4%). De referir que o risco de pobreza ou exclusão social é medido pelo gabinete da UE através da identificação de pessoas que vivem em, pelo menos, uma de três situações: risco de pobreza, carências materiais graves ou reduzida intensidade de trabalho. No caso de Portugal, para além dos 18% de população que se encontra em risco de pobreza, 8,3% sofre de carências materiais graves e 8,2% vive em lares em que apenas um ou nenhum membro da família está empregado (manifestando, assim, reduzida intensidade de trabalho). No total, 24,4% da população portuguesa preenchia, em 2011, pelo menos um dos requisitos tidos em conta pelo gabinete de estatística. Mesmo apresentando uma ligeira melhoria, os números sobre a pobreza entre os portugueses continuam acima da média europeia: no ano passado foram identificados 119,3 milhões de pessoas no espaço da EU como estando em risco de pobreza e exclusão social – o que representa uma média de 24,2% da população dos 27 Estados-membros (um valor pouco abaixo dos 24,4% da população portuguesa que vivia com o mesmo risco em 2011 ). De resto, e ao contrário da tendência em Portugal – ainda que muito pouco expressiva -, o fenómeno nos restantes países europeus agravou-se no ano passado, depois de se cifrar nos 23,5%, em 2008, e nos 23,4%, em 2010. Já em 2011, e segundo os números do Eurostat, 17% dos cidadãos residentes no espaço da União Europeia estavam à beira da pobreza, 9% enfrentavam carências materiais graves e 10% viviam em lares com reduzida intensidade de trabalho. Também no ano passado, a Bulgária (49%), a Roménia e a Letónia (40%), a Lituânia (33%), a Grécia e a Hungria (31%) foram, respectivamente, os países que registaram as percentagens de exclusão mais elevadas, enquanto a República Checa (15%), a Holanda e a Suécia (ambas com 16%), o Luxemburgo e a Áustria (17%) foram os países que melhor desempenho tiveram, perante este drama. Economia solidária com a pobreza
Já esta semana, o ministro da Solidariedade e da Segurança Social admitiu que os números do Eurostat apontados para Portugal são “muito preocupantes”. Recordando a actuação do governo no sentido de “atenuar sistematicamente as taxas de pobreza em Portugal”, Pedro Mota Soares sublinhou o “reforço de 100 milhões de Euros da linha de crédito acessível a instituições de solidariedade social, disponibilizada no âmbito do Plano de Emergência Social (PES). Referindo-se ao sector da economia social e solidária como “fundamental para equilibrar” a balança comercial e “manter a coesão” territorial e social, Mota Soares explicou que “o sector da economia social e solidária, misericórdias, IPSS e mutualidades representa 5,25% do nosso produto, de toda a riqueza que é gerada”. E se, por um lado, os maiores empregadores no interior do país fazem parte do sector social, por outro, não sendo este um sector que exporta, “evita muitas importações porque a maior parte das contratações e dos consumos que faz são consumos que estimulam a economia local”, adiantou Mota Soares. Face a este cenário, a atribuição do Civil Society Prize a uma organização portuguesa é, como diz o director da Associação CAIS, “um sinal de maturidade na luta pela erradicação da pobreza e exclusão social, através de projectos e iniciativas criativas, voluntárias ou co-financiadas, que procuram “a sustentabilidade e a qualificação pessoal e profissional da população mais desfavorecida”. O reconhecimento por parte do Comité Económico e Social Europeu “confirma o valor do trabalho das instituições sociais neste sentido, e encoraja o nosso dever de nos mantermos firmes e determinados na construção de uma cidadania e de uma maior coesão social e económica», remata. Por seu turno, Carlos Pereira Martins, conselheiro Europeu de Portugal no CESE e CES, sublinha o seu desejo de que nesta distinção da CAIS “se revejam tantas outras instituições sociais nacionais que ajudam a minorar os sacrifícios, o desalento e a falta de meios da população mais desfavorecida”, corroborando que esta iniciativa “significa que as organizações da sociedade civil europeias e portuguesas estão atentas e activamente empenhadas no objectivo do bem comum e na defesa do interesse público”. Sob o tema “Inovar para uma Europa sustentável”, a 5ª edição do prémio do CESE teve como principal objectivo premiar a excelência de projectos e iniciativas inovadoras no campo da responsabilidade social e da sustentabilidade desenvolvidos por organizações sociais. A cerimónia de entrega do prémio, no valor de 10 mil euros, terá lugar em Bruxelas, no próximo dia 12 de Dezembro, durante o Plenário do Comité Económico e Social Europeu.
Uma história de vida(s) E foi assim, com esta consciência, que a CAIS nasceu há quase duas décadas: “pequena, como talvez tudo na vida”, com uma equipa de cinco pessoas (incluindo Diogo Vasconcelos) que, em Maio de 1994, assinaram a constituição da Associação. Somadas as vontades multiplicou-se a estrutura e “de pequenos fomo-nos tornando uma força crescente, em número e estatura”, recorda Henrique Pinto. Hoje, a Associação CAIS é, acima de tudo, uma parceria com a sociedade (ou melhor, uma parceira das pessoas) que atingiu a maioridade nos projectos que desenvolve: “para lá de uma impessoal e inconsequente solidariedade da esmola”, a actual dimensão da CAIS “não está no facto de estarmos hoje presentes em duas cidades (Porto e Lisboa), com dois centros, mas no facto de fazermos parte do planeamento anual da vida de muitas pessoas, organizações e empresas, nacionais e estrangeiras”, esclarece o director da Associação. Pessoas e organizações cujas ‘casas’ são também “centros a partir dos quais pensamos, debatemos e actuamos a missão de erradicar da superfície da nossa terra todo o traço de pobreza e exclusão social”. Para Henrique Pinto, a CAIS é “uma relação de forças” ou “uma partnership fora de portas, sem ego próprio, e por isso, a prova mais que real e evidente que a sustentabilidade (havendo ainda quem a procure), só será possível na intersubjectividade, ou em rede”. A Associação de Solidariedade Social sem fins lucrativos, cuja missão é apoiar a (re)construção da autonomia de pessoas em situação de pobreza extrema e exclusão social, em particular as que se encontram em situação de sem-abrigo, actua ao nível da inclusão – apoiando as pessoas em extrema vulnerabilidade social no seu processo de autonomia e de diminuição das desvantagens e necessidades sociais através da capacitação e desenvolvimento de competências, e da intervenção – promovendo a reflexão e o debate das questões que se ligam aos fenómenos da pobreza e exclusão, em Portugal e no mundo, com vista à mudança de políticas e à visibilidade do fenómeno. A capacitação, fundamental para gerar alternativas de emprego para estas pessoas, surte os seus efeitos. Mas em tempos de crise, infelizmente “nem todos os que anualmente são acolhidos pela CAIS encontram trabalho: em 2011, de um universo de 374 pessoas, apenas 34 conseguiram uma ocupação”, adianta Henrique Pinto. Ainda assim, paralelamente à venda da revista, os projectos CAIS Recicla, CAIS Auto, CAISBuy@Work e Tradição Engraxadores, vencedores do EESC Civil Society Prize 2012 (ver Caixa), são soluções de empregabilidade “pensadas e construídas em parceria, quando lá fora, ainda que com vagas, o mercado de trabalho se fecha aos nossos desafios, ou às pessoas que lhe propomos estarem aptas para trabalhar”, critica o director. E é por isso que “num contornar de dificuldades”, estes cinco projectos são ao mesmo tempo, “expressão de um não-desistente processo de capacitação e autonomização de pessoas” e, numa ligação à economia e ao empreendedorismo social, uma “manifestação do espírito criativo e inovador da CAIS, hoje tão necessário à transformação e sustentabilidade das organizações”.
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Jornalista