POR PEDRO CURVELO
© Jornal de Negócios
Os CEO das empresas que integram o PSI-20 auferiram uma remuneração de mais de 18,2 milhões de euros no ano passado. Este valor traduz uma subida de cerca de 14,5% face a 2016. Seis dos presidentes executivos das empresas ganharam mais de um milhão de euros em 2017, tal como havia sucedido no ano anterior. A componente variável representa 36% dos salários dos CEO.
No que toca aos presidentes dos conselhos de administração, o valor ascendeu a 9,8 milhões de euros, uma subida de 8,6%, influenciado por Pedro Queiroz Pereira, “chairman” da Navigator e Semapa, que é o único não executivo destas empresas a receber uma componente variável, por ser considerado um administrador próximo da direcção executiva das sociedades. A remuneração de Queiroz Pereira nestas duas empresas representa quase um terço (32%) do total.
Os membros dos conselhos de administração das 18 empresas analisadas pelo Negócios embolsaram no total 65 milhões de euros, mais 8,6% do que em 2016. Assim, a remuneração dos CEO representa mais de um quarto (28%) do total dos encargos suportados pelas empresas com os seus administradores. Os custos com pessoal, por seu turno, cresceram 9%, para 5,4 mil milhões de euros, tendo o número de trabalhadores ficado ligeiramente acima dos 248 mil, mais 7,7% do que em 2016.
[quote_center]“Existem valores que são escandalosos e que não são justificáveis do ponto de vista do negócio, não há nada que os sustente”– José Bancaleiro, Managing Director da Stanton Chase Portugal[/quote_center]
A importância e relevância da comparação entre as remunerações dos administradores, em particular dos CEO, e a remuneração média dos trabalhadores divide opiniões. As empresas tendem a desvalorizar este indicador, argumentando que se presta a leituras simplistas. Os especialistas em recursos humanos ouvidos pelo Negócios consideram que é um indicador relevante, quer do ponto de vista organizacional quer do ponto de vista social.
“O aumento médio dos trabalhadores de uma empresa situa-se abaixo dos 5%, enquanto o aumento salarial nos CEO das empresas (a nível nacional e internacional) situam-se sempre acima de dois dígitos. Neste sentido, assistimos a um agravamento deste rácio e com uma tendência concreta de continuidade”, diz Carlos Andrade, “executive manager” da Michael Page Porto.
A comparação entre empresas de diferentes sectores, com características muito diferentes, tem um impacto assinalável no “ranking” que se estabeleça. As empresas que utilizam de forma intensiva mão-de-obra menos qualificada tendem a apresentar um rácio mais elevado entre as remunerações dos administradores e as dos trabalhadores. O recurso ao “outsourcing” para os trabalhadores menos qualificados e mais mal pagos também distorce os números.
[quote_center]“Os bónus pagos aos CEO deveriam estar sempre directamente ligados aos resultados líquidos da empresa e ao valor criado para os accionistas”– Carlos Andrade, Executive Manager da Michael Page Porto[/quote_center]
Peter Drucker, um autor incontornável no tema da gestão, defendia que o rácio entre a remuneração do CEO e o salário médio na empresa não deveria exceder um valor de 20 ou 25. Drucker considerava que a partir destes números existia o risco de algum mal-estar e desmotivação dentro das empresas.
A limitação deste rácio por via de legislação ou regulamentação é defendida por sindicatos e, por exemplo, pela Deco Proteste. A via fiscal ou através do agravamento das contribuições para a Segurança Social é uma solução preferível, considera José Bancaleiro, “managing director” da Stanton Chase Portugal.
Carlos Andrade e José Bancaleiro coincidem na opinião de que a desigualdade vai agravar-se.
Disparidade salarial nas empresas agrava-se
O custo médio dos trabalhadores diminuiu em sete empresas do PSI-20 no ano passado, enquanto a remuneração dos CEO – juntando a componente fixa e a variável – apenas foi inferior face a 2016 no caso dos CTT, tendo permanecido inalterada na F. Ramada e Pharol. Na Altri e Sonae Capital, o aumento foi inferior a 0,5%.
No conjunto das 18 empresas analisadas pelo Negócios, a remuneração média dos CEO (presidente executivo) – sendo que em algumas empresas estes acumulam o cargo com o de “chairman” – cifrou-se em cerca de 830 mil euros no ano, quase 38 vezes superior ao custo médio por trabalhador do total destas empresas (21.936 euros).
Este rácio é, ainda assim, significativamente inferior ao registado, em 2016, em países como Espanha (62), França (76), Reino Unido (102), Alemanha (148) ou EUA (188), segundo dados da Deco Proteste.
Nos EUA, as empresas cotadas passaram este ano a ter de divulgar o rácio entre a remuneração do CEO e o salário médio dos seus trabalhadores, havendo cinco empresas em que os presidentes executivos ganham mais de mil vezes o salário médio dos trabalhadores. O maior fosso pertencia à empresa de componentes automóveis Aptiv, cujo CEO, Kevin Clark, recebeu 2.526 vezes mais do que o salário médio dos trabalhadores, segundo foi noticiado pela imprensa internacional.
[quote_center]“É inegável que a disparidade salarial no nosso grupo existe e é muito elevada. Ninguém é indiferente a isso”– Jerónimo Martins (Fonte oficial)[/quote_center]
Algumas cidades e/ou estados norte-americanos estão a aplicar ou a preparar legislação que penaliza as companhias que tenham este rácio particularmente elevado. Por exemplo, a cidade de Portland aprovou uma taxa de 10% sobre as empresas em que os CEO ganhem mais de 100 vezes o salário médio dos trabalhadores e de 20% para as empresas onde o rácio exceda 250.
“O rácio da remuneração do CEO face à média dos trabalhadores é relevante. É importante quer do ponto de vista organizacional quer do ponto de vista social”, defende José Bancaleiro, “managing director” da Stanton Chase Portugal, consultora de recursos humanos. “O aumento desse rácio é uma tendência a que se tem assistido globalmente nos últimos anos. Existem valores que são escandalosos e que não são justificáveis do ponto de vista do negócio, não há nada que os sustente”, refere.
Por cá, a maior disparidade regista-se na Jerónimo Martins. Pedro Soares dos Santos, que acumula o cargo de CEO com o de presidente do conselho de administração, recebeu no ano passado 160 vezes mais do que o custo médio que teve com os seus trabalhadores. “A Jerónimo Martins é uma empresa bem gerida. No entanto, um rácio de 160 não fica bem para a imagem da empresa”, considera Bancaleiro, salientando, no entanto, que “os salários no sector serem baixos… é o mercado a funcionar”.
Carlos Andrade, “executive manager” da Michael Page Porto, empresa de recrutamento especializado, considera o rácio “excessivo”. Mas, “não acredito que prejudique a imagem da empresa apenas porque tem o maior rácio. Não creio que alguém deixe de comprar um determinado produto de uma empresa, tendo como referência este indicador”, destaca.
© Jornal de Negócios, 16 de Maio de 2018. Republicado com permissão.
Jornalista do Jornal de Negócios