Varsóvia foi uma oportunidade perdida para definir um caminho claro para aceitar um acordo climático global, ambicioso e vinculativo. Ao não conseguir traçar um calendário alargado no tempo para ir transpondo barreiras e atingindo consensos, tornou 2014 num ano decisivo (o ano da ambição)
A 19ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, que terminou passado sábado, 23 de Novembro, reuniu milhares de delegados em Varsóvia, durante quase duas semanas. O principal objectivo da reunião era preparar um caminho tão rápido e exequível quanto possível, mas também comprometedor, para que em 2015, na Conferência a ter lugar em Paris, seja possível assinar um novo acordo global que entre em vigor em 2020, e que tenha acções e/ou metas para todos países, tendo em vista a redução de emissões. Os países desenvolvidos e as economias emergentes são os mais responsáveis, historicamente ou na actualidade, por maiores emissões de gases com efeito de estufa, causadoras do aquecimento global e consequentes alterações climáticas. Porém, Varsóvia foi uma oportunidade perdida para definir esse caminho claro para aceitar um acordo climático global, ambicioso e vinculativo. Ao não conseguir traçar um calendário alargado no tempo para ir transpondo barreiras e atingindo consensos, 2014 passou a ser um ano decisivo (o ano da ambição). Desta Conferência das Partes também não saíram indicações claras sobre o nível de exigência para a limitação de emissões de cada um dos países, aliás a palavra “compromissos” deu lugar a “contributos”. Perante isto podemos vir a ter, em 2015, um final de insucesso semelhante à conferência de Copenhaga, em 2009. Temos assim um roteiro demasiado frágil para o futuro. Mais ainda, não se deu relevo suficiente às acções que são necessárias tomar ainda antes de 2020 para se evitar o contínuo aumento das emissões de gases com efeito de estufa à escala global, tornando-se mais difícil inverter a tendência de subida que conduzirá a um aquecimento superior a 2 graus Celsius por comparação com a era pré-industrial. Nesta Conferência houve, porém, aspectos positivos a salientar: foram assegurados os compromissos de financiamento de longo prazo, em particular para o Fundo Verde para o Clima, essenciais para permitir a muitos países lidar com a adaptação a um clima em mudança, bem como apoiar tecnologias menos poluentes, investimentos em energias renováveis e eficiência energética. Quanto a perdas e danos, um princípio que considera que os países desenvolvidos que têm já um histórico de emissões são em grande parte responsáveis pelas alterações climáticas, foi criado o mecanismo internacional de Varsóvia que, no futuro, enquadrará esta questão. Relativamente ao REDD+, um esforço para criar um valor financeiro para o carbono armazenado nas florestas, incluindo para além do REDD (Redução de Emissões por Desflorestação e Degradação Floresta), a conservação e gestão sustentável das florestas, conseguiu-se um compromisso de 280 milhões de dólares. Entre os países que mais desiludiram contam-se o Japão, a Austrália e o Canadá. O primeiro, com a justificação de não poder recorrer à energia nuclear, ao invés de um limite inicialmente traçado de redução em 25%, entre 1990 e 2020, prevê aumentar em 3% as suas emissões no mesmo período. A Austrália, que não enviou nenhum ministro à reunião, tomou um conjunto de decisões à escala nacional que desmantelam grande parte da política climática em curso. O Canadá, ao investir nas areias betuminosas, será sempre um campeão de uso de combustíveis fósseis, tendo sido o único país a abandonar o Protocolo de Quioto. Quanto à União Europeia (UE), apesar de ter tido diversas iniciativas, não conseguiu fornecer os incentivos necessários para desbloquear as discussões sobre acções climáticas de curto prazo. Poderia tê-lo feito, movendo a sua meta de redução das emissões até 2020 para 30% e proporcionando uma promessa ambiciosa de financiamento climático. Porém, os Estados-Membros, com destaque para os obstáculos da própria organizadora da Conferência (a Polónia), não conseguiram chegar a acordo sobre tais iniciativas. Portugal, ao ter ficado classificado em 3º lugar no índice de performance climática dos países industrializados, foi considerado um exemplo de como lidar com a crise económica, obtendo resultado das políticas climáticas e reduzindo a dependência de recursos, lucrando com investimentos feitos em governos anteriores, em áreas chave como as energias renováveis (ainda que alguns destes investimentos comprometam a biodiversidade e a integridade de áreas classificadas e relevantes para a conservação da natureza). Por enquanto, Portugal melhorou a sua posição, a qual pode estar contudo ameaçada pela política menos construtiva do actual governo, que já abrandou alguns dos investimentos benéficos, em particular nas energias renováveis. É fundamental também que Portugal defenda metas ambiciosas de redução de emissões para a Europa e apoie legislação em prol do clima – ultimamente o País tem tido diversas tomadas de posição pouco progressistas nesta matéria, nomeadamente no que se refere à política de biocombustíveis, emissões de automóveis e gases fluorados. Em 2014, duas reuniões marcarão o futuro da política climática global – a Cimeira de Líderes Climáticos organizada pelo Secretário-Geral da ONU, a 23 de Setembro, e a reunião anual, na sequência de Varsóvia, que terá desta vez lugar no Perú. Espera-se que sinais como o recente tufão Haiyan sejam mais que suficientes para percebermos que temos de mudar. |
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