O final das reuniões internacionais anuais das alterações climáticas é sempre um anticlímax. Depois de duas semanas de reuniões intensas de negociação, os resultados são sempre, e por natureza, pouco convincentes: cada Parte considera sempre que há alguns avanços, mas que o total é sombrio. Faz parte. É da natureza da negociação, se bem conduzida, que todos se possam rever apenas parcialmente no resultado final
POR PEDRO MARTINS BARATA

Serve isto para dizer que a COP27, apesar de mais uma vez deixar um travo amargo, representou sem dúvida alguns avanços importantes na agenda internacional.

O mais ovacionado, sem dúvida, e com razão, é a constituição de um fundo internacional para as perdas e danos sofridos pelos países em desenvolvimento, em particular os mais vulneráveis. Constate-se que pelo menos desde 2012, em Doha, que a agenda internacional tinha este ponto por cumprir. Depois de muitos “diálogos”, muitos “workshops” e pelo menos uma “Framework”, temos finalmente um compromisso dos países desenvolvidos em financiar este fundo que permitirá, em moldes a acordar, fazer face aos impactos mais severos das alterações climáticas. Não como reparações pelo mal sofrido, mas como forma de responder aos legítimos anseios de países que mais sofrem com a alteração climática sem nada ou pouco ter contribuído para ela.

O segundo avanço, menos falado, foi a formalização do processo internacional que empenhará os bancos e agências multilaterais de desenvolvimento na ligação entre os processos de perdão de dívida e a ação climática. Um dos maiores entraves atuais à ação climática – mitigação, infraestruturas, adaptação – em países altamente endividados, é a de que muito do financiamento obtido contribuirá, de uma forma ou de outra, para o seu endividamento futuro. Em países altamente endividados, o perdão de dívida e a sua ligação, através de debt for climate swaps com a ação climática, pode ser uma forma hábil de contornar este entrave.

Em paralelo, e apesar de todos os esforços dos países produtores de petróleo, se ainda não foi possível classificar o petróleo e o gás natural como combustíveis a evitar e cujo “phase out” é imprescindível para as metas da neutralidade carbónica, não há dúvida de que não há retorno possível do ponto de vista científico e técnico. A menção das energias “de baixo teor de carbono”, i.e. gás natural, como uma tecnologia a explorar não irá deixar rasto: no momento em que a dependência europeia e de outras regiões no gás natural se tornou numa questão económica de primeiro plano, é impossível continuar a advogar no longo prazo pela manutenção do gás natural como “gás de transição”. A transição está a acelerar.

Por isso, no meio do deserto do Sinai, e apesar das dificuldades logísticas e de planeamento da COP27, o processo multilateral de negociação e a procura de soluções para a crise climática deu um passo em frente. A Agência Internacional de Energia reviu a sua projeção em relação à temperatura global do planeta após Sharm el Sheik. Com os atuais compromissos, o Mundo está 0,1ºC mais próximo da meta (no cenário mais otimista, chegaríamos coletivamente aos 1,7ºC em vez dos 1,8ºC pré-Sharm). Progresso, mas em passos pequenos.

Pedro Martins Barata, membro do Expert Adisory Group SBTi Net Zero Standard, co-presidente do Painel de Peritos da Task Force para o Mercado Voluntário de Carbono e Partner da Get2c