A COP29, realizada em Baku, Azerbeijão, foi um marco de alguns progressos, mas também de muitas frustrações. Durante a cimeira, países de todo o mundo reuniram-se para discutir o futuro do clima global e as ações necessárias para combater a crise climática. No entanto, apesar dos avanços pontuais, a conferência expôs as tensões geopolíticas e económicas entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, deixando muitos a questionar se o processo está realmente no rumo certo
POR MARIA JOÃO RAMOS
Um dos principais marcos da COP29 foi o acordo para um novo objetivo financeiro: 300 mil milhões de dólares por ano para o financiamento climático, com enfoque nos países em desenvolvimento. Embora este valor represente um aumento significativo em relação ao compromisso anterior de 100 mil milhões, foi amplamente considerado insuficiente. Os países mais vulneráveis, como os pequenos estados insulares e as nações africanas, expressaram frustração, com alguns delegados a abandonarem as negociações, acusando os líderes de ignorarem as suas preocupações. O valor de 1,3 biliões de dólares anuais, que muitos países mais pobres consideravam essencial para enfrentar os impactos das alterações climáticas, ficou fora de alcance, gerando uma sensação de desconfiança no processo.
Outro tema central da COP29 foi a regulação dos mercados de carbono, onde finalmente se alcançou um acordo sobre as regras do Artigo 6.º do Acordo de Paris. Este é um marco importante, após quase uma década de negociações, que permitirá aos países transacionar unidades de mitigação para cumprirem as suas metas climáticas. No entanto, a complexidade técnica das regras e a falta de uma verdadeira integridade ambiental nas transações levanta questões sobre a eficácia do sistema a longo prazo. A pressão para alcançar resultados tangíveis levou a soluções pragmáticas, mas longe do ideal.
A presidência da COP29, sob a liderança do Azerbaijão, viu-se marcada por tensões diplomáticas e críticas sobre a falta de habilidade em lidar com o processo de negociação e os consensos. O que deveria ter sido um momento de união global em torno de uma ação climática ambiciosa transformou-se num campo de batalha entre países desenvolvidos e os mais pobres. Houve acusações de que os grandes emissores, particularmente os EUA, não estavam a contribuir de forma justa para o financiamento climático e que o processo estava a ser manipulado por uma diplomacia de desgaste, com os países mais vulneráveis a serem pressionados a aceitar acordos desfavoráveis para evitar o colapso das negociações.
A presidência falhou em abrir espaço para o diálogo e, em vez de facilitar compromissos justos, tentou impor soluções apressadas. Este cenário recorda outros momentos da história da COP, como o de 2009, quando uma tentativa de impor um acordo sem legitimidade quase destruiu o processo de negociações.
O ex e futuro presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, foi uma sombra que pairou sobre a conferência. Embora os Estados Unidos tenham regressado ao Acordo de Paris sob a administração Biden, a memória da política climática de Trump e o seu ceticismo face à crise climática continuam a influenciar as dinâmicas globais.
A delegação argentina fez uma retirada abrupta das negociações após apenas três dias de participação, um gesto que gerou controvérsia e colocou em evidência a linha política do novo governo de Javier Milei. A decisão de abandonar a cimeira reflete a postura negacionista do presidente, que já havia classificado a mudança climática como uma “mentira socialista” durante a sua campanha e ameaçou sair do Acordo de Paris.
Na cerimónia de encerramento, António Guterres, secretário-geral da ONU, fez questão de destacar que o acordo alcançado em Baku era “crucial” para manter o objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5°C. No entanto, não escondeu o seu desapontamento, alertando que o financiamento e a mitigação climática ficaram aquém do que seria necessário. Guterres reforçou que, embora o acordo seja um ponto de partida importante, é fundamental que os compromissos sejam cumpridos sem atrasos.
A mensagem final de Simon Stiell, secretário-executivo da UNFCCC, também foi clara: a luta contra as alterações climáticas é um “seguro para a humanidade”, mas o que foi alcançado na COP29 é apenas o começo. A falta de uma ação mais robusta, especialmente no que toca à transição energética e à aceleração do financiamento climático, deixa uma sensação de que as negociações estão longe de acompanhar a velocidade necessária para evitar os piores cenários do futuro climático.
Apesar dos avanços em algumas áreas, a COP29 foi um reflexo das limitações da diplomacia climática atual. Em vez de se focar em soluções ambiciosas e urgentes, os resultados parecem ser frutos de concessões feitas sob pressão.
Com a COP30 marcada para 2025, em Belém, Brasil, o desafio será transformar as promessas feitas em ações concretas. Os próximos dois anos serão decisivos para avaliar se as negociações climáticas finalmente acompanharão a gravidade da crise que o mundo enfrenta. Caso contrário, o que aconteceu em Baku poderá ser recordado como mais uma oportunidade perdida para agir, enquanto o planeta continua a sofrer os impactos das alterações climáticas. A esperança é que, em Belém, a diplomacia climática se faça finalmente acompanhar pela coragem necessária para enfrentar este desafio global.
Imagem: © Bernd Dittrich/Unsplash.com
Consultora de Estratégia e Comunicação para o Desenvolvimento Sustentável