Apesar de toda a informação, de todas as medidas já tomadas e da sensibilização crescente para o elevado nível de contágio provocado pelo novo coronavírus, são ainda muitas as empresas que estão à espera de directrizes que as ajudem a decidir o que fazer relativamente à segurança das suas pessoas e à continuidade dos seus negócios. Porque os tempos são de incerteza, é obrigatório que o universo empresarial tome acções imediatas para proteger os seus trabalhadores, que avalie desafios e riscos para o negócio e que contribua para mitigar a epidemia mediante todas as formas possíveis
POR HELENA OLIVEIRA

As notícias circulam à velocidade da luz e o que é agora uma certeza, passa a deixar de o ser no minuto seguinte. Alarmismo para uns, precaução para outros, mas a verdade é que, queiramos quer não, a epidemia de covid-19 passou a fazer parte das nossas vidas e ninguém se arrisca a fazer previsões sobre o que o futuro próximo nos pode ainda reservar em matéria de consequências nas diversas esferas da nossa existência. É claro que o maior enfoque se deverá concentrar na contenção e mitigação do novo coronavírus, mas também sabemos que os impactos económicos começam a ser verdadeiramente preocupantes e muitas empresas estão ainda a tentar perceber o que esta epidemia significa para as suas pessoas e para os seus negócios. E são muitas as que não sabem exactamente como reagir às voltas e reviravoltas que caracterizam agora os nossos dias, sabendo apenas que só teremos uma fotografia de todos os impactos sofridos em retrospectiva.

A pouco e pouco, as empresas vão tomando algumas precauções esperando pelo melhor dos cenários, mas e com excepção para as de grande dimensão – muitas já tomaram medidas draconianas – são poucas ainda as que têm já estabelecido um plano de contingência para enfrentar o que ainda está para vir. Todos os dias, e para não dizer a todas as horas, novos dados vão-se avolumando, novas opções são feitas, novas decisões são tomadas e, inevitavelmente, todos podemos vir a ser directa ou indirectamente afectados pelo tão temido coronavírus.

Como sabemos e apesar de medidas sem precedentes que inevitavelmente estão e continuarão, de forma crescente, a condicionar o quotidiano de milhões de pessoas, os casos não param de aumentar e as perspectivas não são animadoras. Apesar de, e comparativamente com outros países, Portugal não ter ainda um número de casos verdadeiramente alarmante e de, até à altura em que este texto está a ser escrito, não ter registado nenhuma morte, também sabemos que o vírus é altamente contagioso, que para o deter poderão ser necessárias medidas ainda mais drásticas e que muitos se questionam acerca da capacidade por parte das autoridades de saúde para conter um possível caos.

No meio de toda esta desordem estão as empresas e milhões de trabalhadores que têm filhos nas escolas que podem ser encerradas, que andam de transportes que podem vir a ser cancelados, que têm reuniões importantes agendadas, que viajam como parte integrante do trabalho que têm e que, de alguma forma, têm de estar adequadamente preparadas para, e durante um período ainda indeterminado de tempo, se adaptarem a um “novo normal”.

Assim, o que podem fazer as empresas para não só garantir a estabilidade das suas pessoas como a dos seus próprios negócios? Apesar de as medidas possíveis parecerem, em muitos casos, óbvias, ter um plano de contingência devidamente preparado e pronto para ser accionado caso seja necessário, não é ainda o tal “novo normal” acima mencionado. Continua-se à espera de orientações externas, de ver “o que isto vai dar” e para além de medidas básicas de higienização das mãos e de “distanciamento social”, não há ainda notícias de verdadeiras disrupções nos locais de trabalho dos portugueses (sem contar, naturalmente, com as zonas assinaladas como de maior risco e com os diferentes estabelecimentos que têm vindo a ser encerrados nos últimos dias). A Direcção Geral da Saúde (DGS) publicou já um guia de procedimentos de prevenção, controlo e vigilância em empresas , mas cada organização, e independentemente da sua dimensão, deverá ter o seu próprio plano de contingência e adoptar medidas de natureza variada que permitam não só proteger os trabalhadores, como assegurar os seus serviços e zelar para que não hajam situações que possam causar ansiedade e, consequentemente, o pânico.

Comunicação eficaz e transparente é imprescindível

No mundo interligado da actualidade, os trabalhadores têm acesso directo a um sem número de fontes de informação. Desta forma, os líderes poderão razoavelmente concluir que dada a existência de quantidades gigantescas de notícias, torna-se desnecessário fazer algo mais no que a este assunto diz respeito. Todavia, têm sido vários os especialistas em gestão de crises a alertar de que “muita informação não significa estar informado”. Assim, sugere-se que as empresas partilhem, pelos meios que considerarem mais pertinentes, boletins informativos e sumários regularmente actualizados sobre o estado da epidemia e sobre as medidas que estão a ser tomadas nos seus diferentes âmbitos. Distinguir claramente entre factos, hipóteses e especulações torna-se imprescindível em qualquer local de trabalho e é dever das empresas garantir aos seus empregados que a situação está a ser continuamente acompanhada e que existem pessoas – ou departamentos – exclusivamente dedicadas a avaliar o desenvolvimento da situação e a tomar medidas se necessário.

Por outro lado, é igualmente natural que ao serem expostos a informações muitas vezes conflituosas, os empregados aumentem os seus níveis de ansiedade e se sintam confusos relativamente às acções que deles se esperam. A quebra de produtividade é outro “efeito secundário” em tempos de crise e, apesar de não existirem motivos para que o trabalho não seja feito, é perfeitamente compreensível que os trabalhadores andem mais ansiosos e distraídos, o que implica uma maior dose de paciência e compreensão por parte dos chefes hierárquicos. Estes, por sua vez, deverão tentar ao máximo manter um clima de calma, de “normalidade” tanto quanto for possível, sempre garantindo que a empresa está alerta e pronta a intervir se necessário.

No caso de a empresa ter um plano de contingência devidamente preparado, este deverá ser transmitido o mais rapidamente possível aos empregados, da forma mais transparente possível, assegurando igualmente que exista um canal de comunicação aberto que permita responder às dúvidas e ansiedades dos trabalhadores. De acordo com o Edelman Trust Barometer, a comunicação veiculada pelos empregadores é aquela em que os trabalhadores mais confiam. Quando o líder fala, as pessoas escutam e o tom, a eficácia e a relevância do seu discurso poderá fazer toda a diferença entre a manutenção da calma e o início de um estado de pânico. Garantir, sem margem para dúvidas, que a empresa está a par de toda a situação, que a está a monitorizar e que tem planos para uma possível disrupção é imprescindível.

O trabalho a partir de casa

No caso de o cenário se complicar, os empregadores têm de estar preparados para que o trabalho feito pelos seus trabalhadores tenha continuidade a partir de suas casas. Seja porque existem zonas em quarentena, seja porque as escolas dos filhos estejam fechadas, seja porque a própria empresa reporte algum caso suspeito que obrigue ao afastamento dos demais empregados, a opção do teletrabalho está sempre em cima da mesa, com menor prejuízo tanto para as empresas como para os seus trabalhadores.

Mas e para tal, é igualmente necessário que existam condições para o fazer. Antes que o pior aconteça, as empresas deverão assegurar que têm os equipamentos e a infra-estrutura necessários para que esta opção corra bem. Ou seja, testar antecipadamente esta hipótese, verificar se existem computadores portáteis suficientes, telefones ou tecnologias especificamente necessárias para que o trabalho seja feito é uma medida que deve ser tomada de imediato. Claro que existem trabalhos específicos que exigem a presença dos empregados nos seus locais de trabalho – e para estes outras medidas terão de ser, a seu tempo, tomadas – mas também é verdade que trabalhar remotamente hoje em dia não só já é uma realidade para muitos, como poderá ser a melhor opção a ser tomada pelas empresas para evitar contágios desnecessários. As diversas ferramentas de chat existentes permitirão que as reuniões continuem, a tecnologia que nos rodeia evitará o isolamento e, em circunstâncias “normais”, o trabalho poderá continuar a ser feito normalmente.

Para os que trabalham com informação sensível e, em particular para os que trabalham com tecnologia, aconselha-se igualmente uma revisão cuidada das políticas de TI, antes do “êxodo” do escritório para casa. Os empregadores, em particular aqueles que têm nas suas mãos dados pessoais de partes terceiras, devem igualmente assegurar que os sistemas que serão usados para permitir que os empregados trabalhem em casa sejam compatíveis e estejam em conformidade com as normas de segurança de dados e que não exista a possibilidade de qualquer perda ou roubo dos mesmos. O planeamento – seja ao nível das infra-estruturas, dos equipamentos e das políticas internas da empresa – é assim crucial e, quanto mais cedo for feito, melhor.

Evitar as viagens

Como é do conhecimento público, as viagens para os países onde a epidemia de Covid-19 está mais descontrolada estão fortemente desaconselhadas, em particular para a Itália, a China, a Coreia do Sul e o Irão (e com os Estados Unidos a suspenderem as entradas de viajantes provenientes da Europa durante 30 dias). Todavia, e na generalidade, a maioria das empresas está igualmente a proibir ou limitar as viagens de trabalho para outros destinos como medida de precaução. Esta decisão envolve um conjunto de múltiplos factores, incluindo o impacto que a não realização de determinadas viagens possa ter para o próprio negócio, e também um muito provável período de quarentena para aqueles que viajam e regressam ao país de origem.

No caso de as viagens não serem desmarcadas, os empregadores terão igualmente que contar com várias situações possíveis, sendo que uma, bem provável, é ser o próprio empregado em causa a recusar-se a viajar e a colocar a sua saúde em perigo. Todavia, e se viajar continuar a ser permitido sem grandes restrições, é obrigação da empresa monitorizar globalmente as indicações dadas pelo governo e pelas autoridades de saúde, não só do país de origem, como do país de chegada e rever as condições dos seguros de quem vai viajar assegurando que o mesmo oferece a cobertura necessária no caso de surgir algum problema. É igualmente aconselhável que os empregados que façam viagens em trabalho sejam submetidos a testes e a períodos de quarentena quando regressarem, pois na medida em que o novo coronavírus não implica forçosamente o aparecimento de sintomas nos primeiros dias de incubação, é impossível saber se o trabalhador foi contaminado, principalmente se se sentir em perfeitas condições de saúde.

Garantir a liquidez em caso de tempestade

Tentando evitar panoramas catastrofistas, mas tendo em atenção a impossibilidade de prever a duração e grau de perigosidade desta epidemia, é aconselhável que as empresas definam cenários adaptados ao seu contexto financeiro. Em particular para as variáveis críticas que possam vir afectar as receitas e os custos, há que antecipar uma análise adequada e identificar riscos potenciais. As empresas devem ainda modelar os seus dados financeiros (fluxo de caixa, lucros e perdas, balancetes) em cada um dos cenários e identificar “desencadeadores” que possam prejudicar significativamente a sua liquidez. E, para cada um desses desencadeadores, deverão definir estratégias e planos que permitam estabilizar a organização em cada um dos cenários possíveis (optimização de contas a pagar e a receber, redução de custos, desinvestimentos, etc.).

As empresas deverão igualmente ter uma equipa dedicada a determinar quais as operações que são sistémicas e críticas para o funcionamento do seu negócio, e quais são opcionais. As duas primeiras precisam muito provavelmente de planos de contingência para estarem salvaguardadas caso algo corra mal. E a prudência aconselha a que se olhe com particular atenção para a liquidez total da empresa e como esta poderá ser afectada em cenários diversos.

A crise provocada pelo novo coronavírus é uma história com um final absolutamente imprevisível. O que é claro é o facto de o seu impacto estar já a ser crítico e que as empresas têm a obrigação de agir imediatamente para proteger os seus trabalhadores, avaliar desafios e riscos para o negócio e ajudar a mitigar a epidemia mediante todas as formas possíveis.

Editora Executiva