POR MÁRIA POMBO
Paris está, por estes dias, no centro das atenções a nível mundial, por ocasião da 21ª Cimeira das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP 21). Clima é um termo inevitável, e combater as suas alterações é uma urgência e uma necessidade.
O quinto relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) denuncia, uma vez mais, a influência humana no aumento da concentração de gases com efeito de estufa (GEE), alertando para os perigos deste flagelo nas próximas décadas. “Enfrentar o desafio das alterações climáticas requer [por esse motivo] liderança e uma colaboração sem precedentes entre todos os stakeholders”, como explica María Mendiluce, directora de clima e energia do World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), que esteve presente na Conferência Anual do BCSD Portugal, realizada recentemente em Lisboa. Segundo as empresas que compõem o BCSD Portugal, “as alterações climáticas representam um dos mais sérios problemas ambientais com que as sociedades humanas se têm vindo a confrontar nas últimas décadas”.
Manter o aumento de temperatura global do planeta abaixo dos 2ºC é um dos grandes objectivos da COP 21, a qual conta com os líderes de 193 países desenvolvidos e em desenvolvimento, que se reúnem ainda para acelerar o desenvolvimento e a implementação de tecnologia em energias renováveis, de baixo carbono, num compromisso de eliminação gradual da produção energética por combustíveis fósseis. Terminar com o financiamento público destes combustíveis, direccionando-o para a eficiência energética e para as energias renováveis é uma das estratégias mais defendidas nesta Cimeira para reduzir as emissões de CO2.
Um sinal da mudança dos tempos e que permite ter algum optimismo está presente no esforço já revelado por Barack Obama em continuar a contrariar a decisão tomada pelo seu país aquando do Protocolo de Quioto: “estou aqui como presidente da maior economia mundial, e o segundo maior emissor [de CO2], para dizer que não só os Estados Unidos reconhecem o seu papel na criação deste problema, como não recusam a sua responsabilidade em fazer algo a este respeito”, referiu Obama, apostando numa “estratégia de longo prazo” e com “um forte sistema de transparência” para resolver este flagelo sentido à escala mundial.
[pull_quote_left]Manter o aumento de temperatura global do planeta abaixo dos 2ºC é um dos grandes objectivos da COP 21[/pull_quote_left]
Mas já a curto prazo, “agir em defesa do clima é a única forma de assegurar lucros sustentáveis, emprego e prosperidade para todos”, como acredita María Mendiluce, convicta de que “a energia renovável é fiável, cada vez mais competitiva e acompanhada por uma procura crescente dos investidores por activos renováveis”. Contudo, a directora de clima e energia do WBCSD alertou também que “para ganharem escala, as tecnologias renováveis requerem mais inovação no negócio, uma estrutura de mercado apropriada e enquadramento político”.
São diversos os riscos mas são também variadas as oportunidades da aposta, pelas empresas e pelos governos, de uma economia de baixo carbono. O aumento dos preços das matérias-primas, dos valores de seguros e do solo, bem como possíveis perdas de credibilidade da marca são alguns dos riscos calculados no projecto do BCSD, os quais abrangem ainda responsabilidades no cumprimento de legislação e pressão dos stakeholders. No entanto, as oportunidades são quase inesgotáveis, servindo de exemplo o desenvolvimento de novos produtos e serviços, bem como de processos e tecnologias mais eficientes, o aumento da credibilidade da marca, contacto com novos investidores e consequente ampliação de parcerias.
Portugal tem sido referenciado como um país pioneiro no combate às alterações climáticas e na adopção de energias renováveis, sendo a quarta nação, entre quase 60, mais bem qualificada em matéria de acção climática e tendo uma classificação de “Bom”, segundo o mais recente relatório do IPCC.
No âmbito da COP 21 e enquadrada na sua Acção 7, que pretende demostrar o valor gerado por projectos de eficiência energética, o BCSD Portugal desenvolveu a iniciativa “Economia de baixo carbono – Soluções made in Portugal” com o objectivo de identificar as estratégias e tecnologias que os seus membros já implementaram para combater as alterações climáticas através da redução de emissões de CO2. Com isto, o BCSD pretende ainda incentivar as empresas a encararem a economia sustentável como uma oportunidade para serem mais competitivas, impulsionando também a criação de emprego e estimulando o bem-estar da população.
Eficiência energética, produção e uso de energias renováveis e de combustíveis alternativos, substituição de matérias-primas, e ainda utilização de sistemas de transporte de baixo carbono, e exploração de florestas como sumidouros de carbono são as áreas onde os membros do BCSD Portugal têm implementado as suas soluções para diminuir a emissão de carbono. Para além de reduzir as emissões de GEE, os principais objectivos destas empresas são melhorar a eficiência de recursos como a água, a energia ou as matérias-primas, mitigar as alterações climáticas e, também, gerir a reputação e as expectativas dos seus stakeholders.
A aposta ganha das empresas portuguesas na economia de baixo carbono
Das 32 soluções de baixo carbono apresentadas pelo BCSD, 19 são de eficiência energética (17 das quais já atingiram uma redução global de 21% das emissões de CO2), quatro dizem respeito a processos industriais, três são de energias renováveis, três são referentes a serviços e as últimas três estão relacionadas com mobilidade. Neste artigo, o VER apresenta sumariamente algumas dessas soluções nas quais o tecido empresarial português tem vindo a apostar, revelando as potencialidades de uma economia de baixo carbono.
[pull_quote_left]Para ganharem escala, as tecnologias renováveis requerem mais inovação, uma estrutura de mercado apropriada e enquadramento político[/pull_quote_left]
Com duas soluções implementadas, a Bosch é um exemplo de empresa determinada em combater as alterações climáticas. Entre 2014 e 2015, o projecto Transportar mais com menos – que visa a optimização da carga transportada e dos meios de transporte, a melhoria do espaço de carga dos camiões e contentores, a utilização de rotas mais eficientes e, também, o redesign de embalagens – permitiu a esta empresa diminuir a pegada carbónica dos seus produtos, aumentar a eficiência da sua cadeia de valor e evitar a emissão de cerca de 216 toneladas de CO2. Por seu turno, através da iniciativa Energy Reduction, esta empresa já desenvolveu diversas medidas de eficiência energética que abrangem os processos industriais, os sistemas de ar comprimido, a iluminação, a climatização e os sistemas de gestão, reduzindo o consumo de energia em 13,6% e de emissões de carbono em 11%.
Também com duas soluções, a Brisa destaca-se pelas suas tecnologias que visam melhorar a motricidade dos cidadãos, especialmente em ambiente urbano e nas auto-estradas. Concebido por esta operadora de infra-estruturas de transporte em conjunto com outras 14 empresas para ser aplicado em qualquer cidade, o projecto Sustainable Mobility pretende desenvolver e implementar planos de mobilidade urbana, com base nas dimensões ambiente, economia, social e desempenho do sistema de mobilidade. Estando já a ser testada em seis cidades – Lisboa e Hamburgo (Europa), Campinas (Brasil), Banguecoque (Tailânia), Indore (Índia) e Chengdu (China) – esta iniciativa já despertou o interesse de Instituições internacionais, de que são exemplo a Comissão Europeia, o Banco Mundial ou a International Council for Local Environmental Initiative.
Complementarmente, a Brisa tem em curso a implementação de balastros electrónicos em 19 mil pontos de iluminação pública nas auto-estradas portuguesas. Esta iniciativa de iluminação eficiente, que pretende reduzir o CO2 em 36%, requer um investimento de cerca de dois milhões de euros. Através desta tecnologia, prevê-se uma redução anual dos custos de energia na ordem dos 36%, resultando numa poupança, a cinco anos, de mais de um milhão de euros e, a 10 anos, de mais de dois milhões e meio de euros.
Contribuindo para a concepção e desenvolvimento de tecnologia que permite a exploração do potencial eólico no mar, a EDP criou as Wind Float. Estas são plataformas flutuantes, ancoradas ao fundo do mar em locais com profundidade superior a 40 metros, que podem estar parcialmente submersas e onde assenta uma turbina eólica que produz energia. Desde a sua concepção, em 2012, até Agosto do presente ano, este projecto já permitiu reduções de CO2 na ordem das 13 mil toneladas, e entre Dezembro do ano passado e Agosto último, a produção de energia teria sido suficiente para abastecer uma vila de 1250 habitantes. Esta é uma solução que faz igualmente parte do portfólio apresentado pelo BCSD Portugal para combater as emissões de carbono.
Através do projecto Baixo carbono por natureza, e com base na gestão sustentável e certificada das suas florestas, na biomassa, nas tecnologias das unidades industriais e na eficiência energética, o Grupo Portucel Soporcel pretende conciliar as questões ambientais e sociais com a vertente económica, aproveitando o potencial da natureza através do investimento em tecnologias eco-eficientes. As plantações de eucalipto e outras espécies revelam-se importantes sumidouros de carbono, reduzindo a emissão de GEE. Por outro lado, quando os subprodutos e resíduos florestais são processados, dão origem à produção de electricidade, calor e biocombustíveis, substituindo os combustíveis fósseis. Através das medidas de eficiência energética implementadas e preconizadas pelo Grupo, prevêem-se reduções de CO2 em cerca de 10 mil toneladas por ano, fazendo desta uma solução de baixo carbono a ter em conta, segundo o BCSD Portugal.
[pull_quote_left]Portugal é a quarta nação mais bem qualificada em matéria de acção climática[/pull_quote_left]
Globalmente, as 32 soluções de eficiência energética requerem um investimento de 15 milhões de euros, mas permitem reduções consideráveis no consumo de energia (como demonstram os exemplos acima apresentados). Em termos de poupança agregada, são clarividentes as vantagens da eficiência energética: a cinco anos, a poupança atingirá os 64 milhões de euros, e a 10 anos, estima-se que o retorno ultrapasse os 130 milhões de euros.
Estes valores revelam a determinação de Portugal em apostar na produção de energias renováveis e reduzir as emissões de carbono, e demonstram que a crise económica não tem impedido o alcance de resultados importantes no combate às alterações climáticas. No entanto, para que o País continue a crescer e a destacar-se na luta contra a produção de emissões, é necessário que os consumidores sejam, também eles, produtores, devendo apostar-se na micro-produção e na produção descentralizada de energia. Esta é, aliás, uma questão em discussão na COP 21, de onde se espera um compromisso de todos os países presentes para travar o aquecimento global.
Jornalista