Pioneiro a defender um argumento jamais tido em conta no mundo da competitividade – afinal podem os bonzinhos (muitos vezes conotados como tolinhos) atingir o degrau cimeiro da escada do sucesso – o mais jovem professor da Wharton School of Business está a dar que falar em toda a arena dos negócios. O motivo? Quanto mais generoso se é, maior é a multiplicação do retorno Durante décadas, a denominada literatura de gestão exortava os executivos a se comportarem como verdadeiros guerreiros, lutando até à morte na arena dos negócios, com os leões a personificarem os concorrentes. Um gestor ou um aspirante a tal cargo que se prezasse teria que ter lido (ou fingido, pelo menos) a Arte da Guerra de Sun Tzu, o Príncipe de Maquiavel ou os segredos implacáveis de Jack Welch, a “bomba de neutrões” que liderou a General Electric e a elevou ao estatuto de uma das empresas mais bem-sucedidas de sempre.
Por outro lado, quando se falava em atingir o sucesso, o enfoque recaia invariavelmente nos estímulos individuais como a paixão, a resiliência, o trabalho árduo, o talento e, é claro, um pouquinho de sorte. Mas, no mundo de hoje, o sucesso parece estar crescentemente dependente da forma como interagimos com os outros. E esta é uma das principais teses que sustentam o livro Give and Take: A Revolutionary Approach to Success, do cientista social e mais jovem professor da Wharton School, Adam Grant, que passou a liderar vários rankings de vendas, mesmo que defenda um argumento raramente tido em conta no mundo da competitividade: afinal são os bonzinhos (muitos vezes conotados como tolinhos) que mais facilmente podem atingir o degrau cimeiro da escada do sucesso. O motivo? Em vez de se rentabilizar os contactos, a influência, o tempo, a informação ou o acesso, Grant sugere que quanto mais generoso se é, maior é a multiplicação do retorno. Por esta altura, já o leitor deverá estar a bocejar e a pensar que este artigo não é para si. Afinal, desde quando é que as “boas pessoas” cruzam a meta em primeiro lugar? Mas esse é o verdadeiro trabalho de Grant. O psicólogo organizacional e professor de Gestão – ex-mergulhador olímpico e ex-mágico – espera convencer os seus leitores de que existe lugar para o bem no edifício do sucesso e que este não terá forçosamente que ter lugar nas suas caves. Pelo contrário. As histórias e estudos que preenchem o livro dão exemplos mais do que ilustrativos de que os executivos generosos (e outras espécies) podem ser tão ou mais bem-sucedidos do que os seus pares ambiciosos e calculistas. Mas e para começar a desenrolar a teia desta nova teoria, há que perceber primeiro os três tipos de “espécies” que existem no local de trabalho. Os givers – que dão sem receber nada em troca, os takers – que tiram e extraem benefícios dos outros para seu único proveito e os matchers – que são governados por trocas equilibradas de favores [dado que nem sempre a língua inglesa funciona bem quando traduzida para o português, optámos por manter a terminologia utilizada pelo autor]. Em traços gerais e segundo Grant, as atitudes no local de trabalho tendem a ser, predominantemente, tomadas pelos matchers, os quais se empenham em atingir um equilíbrio de reciprocidade (uma espécie de “ajudo-te se tu me ajudares a mim”); já os givers são considerados como demasiado “moles”, apesar de serem reconhecidos como dignos de confiança e os takers são percepcionados como insensíveis e hiperdominantes. Grant oferece, como já mencionado, histórias reais de givers e de takers, como a do grande responsável pelo escândalo da Enron, Kenneth Lay ou a do benevolente empreendedor online Adam Rifkin, em conjunto com narrativas sobre advogados, magnatas do hip-hop, professores e figuras históricas como Abraham Lincoln ou Frank Lloyd Wright. Sempre na tentativa de persuadir os leitores a acreditar que os givers altruístas são por demais subestimados na arena dos negócios e que enquanto alguns realmente não passam de “capachos”, outros tantos se tornam extremamente bem-sucedidos
A reciprocidade, os givers, os takers e os matchers Numa longa entrevista à Knowledge@Wharton, o autor explica melhor as diferenças entre os três tipos. “É possível ancorá-los em dois extremos; os takers e os givers. Os primeiros são pessoas que, quando entram numa interacção com outra pessoa, tentam retirar o máximo possível dela e contribuir o mínimo possível em troca, convencidos que este é o mais curto e directo caminho para atingirem os seus próprios objectivos”, explica. “Do outro lado do espectro, estão os givers. E que nada têm a ver com actos como doar dinheiro para a caridade ou praticarem voluntariado. São, sim, pessoas que ajudam os outros, por exemplo, dando-lhes um conselho, servindo-lhes de mentores, partilhando conhecimento, sem qualquer interesse associado. Estes givers encaram o contributo para outrem como a finalidade da interacção. Poucos de nós podem ser considerados como givers puros. Sendo que a maioria acaba por se posicionar algures entre ambos os estilos. O que nos leva ao grupo dos matchers, que tentam manter o equilíbrio correcto entre dar e receber”. Como não existe nada que seja completamente branco ou completamente preto, Grant sugere também que existem atributos que podem ser adquiridos nos negócios e na gestão de carreira tanto para givers como para takers, reconhecendo contudo que uma combinação inteligente entre ambos provar-se-á como a mais eficaz. E no livro oferece também “Acções para Impacto” para aplicar estes princípios da melhor forma possível. O autor explica igualmente o que as redes de contactos eficazes, a colaboração, a negociação, a influência e as competências de liderança têm em comum. No que respeita às redes de contactos, não é de estranhar que as dos takers sejam largamente recheadas. E tal deve-se, em parte, ao facto de, quando uma das suas “pontes” é queimada, eles se apressarem a encontrar novas pessoas para explorar, para manter a rede em movimento contínuo. Já os matchers têm redes mais restritas. No geral, mantêm apenas os relacionamentos com aqueles que já os ajudaram no passado ou que, potencialmente, os possam vir a ajudar no futuro, acabando por restringir o seu universo de oportunidades. Os givers, por seu turno, têm a tendência para construir redes muito mais amplas do que os matchers, mas de uma forma completamente diferente da dos takers. O que estes generosos geralmente fazem quando conhecem alguém é tentar perceber de que forma poderão contribuir para beneficiar essa pessoa. O que significa, na prática, que acabam por criar uma quantidade significativa de “boa vontade” nos relacionamentos que constroem e que na maioria das vezes permanece adormecida até que eles dela precisem. Dado que Grant é professor numa escola de negócios, não admira que Give and Take esteja repleto de estudos que comprovam os seus pontos de vista. Existem imensos professores que lêem centenas de relatórios anuais apenas para identificarem CEOs narcisistas e avaliarem os efeitos deste tipo de personalidade na performance de uma empresa. Uma curiosidade: quanto maior é a fotografia de um CEO na parede da empresa, mais disfuncional esta se releva. Mas também há estudos sobre a forma como os givers se sentem mais confortáveis em delegar tarefas ou de como um favor prestado a uma pessoa aumenta a probabilidade de se gerar um ciclo virtuoso significativamente benéfico. Um dos relatórios citados conclui que os negociadores que pensam cuidadosamente sobre os interesses da outra parte tendem a fechar negócios mais favoráveis. Mas também um outro que conclui que aqueles que pedem conselhos a algum membro do conselho de administração sobre como ser aceite no mesmo, têm mais probabilidades de ganharem o lugar do que aqueles que se limitam a perguntar se poderão ser aceites nas mais altas cadeiras empresariais.
Diferentes abordagens em termos de colaboração e partilha de crédito Mas uma das dinâmicas que Grant considera ser extremamente interessante na pesquisa que realizou para o livro prende-se com as diferentes abordagens que givers e takers têm no que respeita à colaboração. E conta pelo menos duas histórias apaixonantes de personagens bem conhecidas da nossa história. Uma é a do famoso arquitecto Frank Lloyd Wright, o qual descobriu a determinada altura da sua vida que os desenhadores que trabalhavam no seu estúdio estavam a receber maiores comissões e mais trabalho do que ele próprio. Tal devia-se ao facto dos clientes os considerarem muito mais fáceis de trabalhar e tão talentosos quanto o próprio. Lloyd Wright ofendeu-se verdadeiramente com a situação, considerando que a sua equipa de desenhadores lhe devia subserviência e proibiu-os de aceitar comissões independentes. Instituiu uma política que os obrigava – em qualquer que fosse o trabalho aceite no seu estúdio de arquitectura e mesmo que ele não tivesse contribuído com uma linha sequer para o trabalho -, a colocar sempre a sua assinatura em primeiro lugar. Esta atitude acabou por lhe custar o abandono de arquitectos extremamente talentosos. E, como diz Grant, se olharmos para o legado do famoso Lloyd Wright, não se encontra nele qualquer referência ao facto de ter sido mentor de outros ou de lhes ter servido como exemplo, comparativamente a outros arquitectos que atingiram um status similar ao seu. Um outro exemplo é o de Jonas Salk, que será lembrado por ter descoberto e comercializado a vacina para a poliomielite. Todavia e se observarmos o comportamento de Salk de uma forma mais cuidadosa, concluiremos que ele nunca deu qualquer tipo de crédito às pessoas que trabalharam com ele no laboratório e que o ajudaram a descobrir a vacina. Na verdade, este comportamento ditou o fim da sua equipa. E Salk nunca mais voltou a fazer uma descoberta verdadeiramente importante. Como afirma Grant, este é um dos custos sofridos pelos takers no que respeita a trabalhar em colaboração com os outros: o menosprezo por aqueles que também merecem crédito. E o que os givers tendem a fazer nestas situações é assumir que o crédito não é uma ‘soma zero’. Reconhecer-se a quota-parte devida do crédito de outrem, não implica diminuir o nosso contributo pessoal. O que torna muito mais fácil manter as pessoas na equipa ao longo do tempo, significando, na maioria dos casos, que caso se seja um líder ou um gestor, as pessoas segui-lo-ão caso mude para uma outra organização ou cargo. O que pode ter um valor sem limites. Trocar o capacho pelo degrau cimeiro Ao longo da sua pesquisa, e depois de ter observado diversos sectores de actividade bem como países, Grant concluiu que os três estilos de personalidade – takers, matchers e givers – existem em todo o lado. E se pensarmos na pirâmide do sucesso, também é verdade que a sua base está repleta de givers. Ao colocar os outros sempre em primeiro lugar, os generosos altruístas acabam por se colocar a si mesmos em situações de risco – que incluem o esgotamento – nomeadamente porque se podem deixar explorar pelos takers. Se, à primeira vista, se poderia pensar que os takers não podem, continuamente, ascender até ao topo, até porque vão coleccionando inimigos nesse caminho (o termo utilizado por Grant é o das “pontes queimadas”), poder-se-ia concluir que seriam os matchers a ocupar um espaço maior nesse mesmo topo, pois sendo mais generosos que os takers, mas protegendo, ao mesmo tempo, os seus próprios interesses, as hipóteses ser-lhe-iam mais favoráveis. Mas a verdade é que Grant acabou por concluir que não é isso que acontece. Quando estudou os dados adquiridos, ficou realmente surpreendido com os resultados. Os givers tanto estão sobre-representados na base da pirâmide do sucesso, como no seu topo. E uma das áreas que melhor ilustra esta realidade é a das vendas. Se estamos habituados a ouvir o mantra de que o melhor vendedor é aquele que coloca o cliente em primeiro lugar, este factor não será uma surpresa. A confiança e a boa vontade exibidas pelos givers confere-lhes uma excelente reputação. Mas Grant volta a colocar os matchers na equação, afirmando que o sucesso dos givers e o declínio dos takers está relacionado com as acções destes “intermédios”. Um matcher é alguém que acredita num mundo justo. Um taker viola essa crença na justiça. E os matchers não suportam ver os takers a somar pontos devido às vantagens que vão retirando dos outros. Ou seja, dados recolhidos sugerem que os matchers perseguem os takers com o intuito de os castigarem, muitas vezes através do lançamento de rumores ou tentando minar a sua reputação. Ou seja, e mais uma vez, ser-se um matcher acaba por se revelar uma estratégia mais segura. Todavia, e concluindo-se que os givers conseguem atingir o topo do sucesso da mesma forma que também podem não passar da base, há que conhecer os tais riscos a eles associados (a propensão para estados de esgotamento e a forte possibilidade de não passarem de meros capachos na vida). Grant afirma que estes riscos podem ser mitigados se algumas estratégias cautelosas forem perseguidas. E uma boa parte delas está relacionada com o estabelecimento de fronteiras. Muitos givers confundem o facto de se mostrarem úteis ou generosos com a disponibilidade total para qualquer que seja a pessoa ou o pedido a ser satisfeito. Existem outros givers que confundem a generosidade com a empatia, deixando tuudo o que estão a fazer para poderem ajudar os outros. Outros há ainda que se sentem desconfortáveis quando pensam nos seus próprios interesses. Um dos conceitos favoritos de Grant encontrados ao longo da sua pesquisa é o que ele chama de “o favor dos cinco minutos”. Em vez da disponibilidade total para ajudar toda a gente a qualquer hora, o giver deverá perguntar: posso fazer algo por si que realmente o ajude mas que não me leve a mim mais do que cinco minutos? Ou seja, trata-se de pensar no benefício do outro mas com um custo baixo que assegure que o giver não fique prejudicado.
Descobrir o giver que há em si E, como não poderia deixar de ser, existe um conjunto de material, ao longo de todo o livro, que ajuda a transformar a teoria na prática. Adam Grant aconselha que, antes de mais, o leitor deverá perceber qual é o seu verdadeiro estilo. Para isso, o autor criou um website no qual é possível fazer-se uma auto-avaliação e, mais interessante ainda, um espaço dedicado aos que nos conhecem bem e nos podem ajudar a sermos avaliados. Este é, para o autor, o primeiro passo. Olhar para um espelho e perguntar: “qual o padrão dominante no meu comportamento? Posso agir mais como um taker quando estou a fazer uma negociação complexa. Ou posso ser mais um giver quando estou a servir de mentor a alguém. Provavelmente sou um matcher quando um colega de uma outra organização me pede ajuda num conhecimento específico”. Todavia, a pergunta mais importante prende-se com “a forma como se interage com os outros na maioria das vezes”, diz, sublinhando que este será sempre o ponto de partida. De seguida, Grant afirma que existem algumas oportunidades surpreendentes, no que respeita ao sucesso e ao significado, ao se operar como um giver. E a questão é a seguinte: “que tipo de generosidade se coaduna mais com as minhas competências?”. Para algumas pessoas, será a partilha do crédito por um bom trabalho. Para outras, é ser-se um bom mentor. E as possibilidades continuam… Descobrir o nosso “estilo enquanto giver” é algo extremamente útil e poderoso. O verdadeiro significado e propósito associados a esta realidade é o facto de que mesmo que os givers nem sempre sejam melhor sucedidos do que os matchers ou os takers, eles acabam por conseguir ter sucesso na forma como tornam os outros melhores pessoas, os ajudam a “subir”, em vez de os atirarem da escada abaixo. E encontrar formas para colocar em prática esta estratégia é, muito provavelmente e de acordo com o professor de comportamento organizacional, o caminho mais sustentável para o sucesso a longo prazo. Para os indivíduos e para as organizações. |
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