Arranjar um lugar ao sol no populoso mundo dos rankings que avaliam a performance das empresas não é propriamente fácil. E é isso que está a tentar fazer uma jovem consultora britânica, cujo negócio é exactamente o de “embutir” empatia nas organizações, mas com o aval da prestigiada Harvard Business Review. Pelo 3º ano consecutivo, o Índice de Empatia Global mostra, nem sempre de forma totalmente clara, o que têm a ganhar as empresas que apostam nesta qualidade humana para melhorar a sua experiência com colaboradores, clientes e público em geral. Em conjunto com os seus lucros, é claro
POR
HELENA OLIVEIRA

Responder adequadamente às necessidades de empregados e clientes, num ambiente crescentemente instantâneo, intimo e interactivo não constitui tarefa fácil para qualquer empresa, independentemente do seu sector de actividade. A necessidade de as empresas se envolverem num diálogo autêntico com os seus stakeholders é cada vez mais urgente, mas nem todas estão a saber – ou a querer – aproveitar este meio privilegiado de abertura e comunicação. Sim, a conversa não é nova, mas continua fazer parte do debate entre a velha e a nova escola de gestão.

Num mundo dominado pela transparência imposta pelos media sociais, em que não só os produtos ou os serviços, mas também os comportamentos das empresas, são constante e imediatamente avaliados, não é de estranhar que, com frequência, nasçam novos rankings para classificar o quão bem ou mal as culturas organizacionais se estão adaptar ao mesmo.

[pull_quote_left]Existem cada vez mais atributos intangíveis, difíceis de avaliar, mas que fazem sentido analisar no ambiente empresarial da actualidade[/pull_quote_left]

Normalmente e como sabemos, quanto mais concretas e racionais são as análises realizadas pelas entidades que dominam estes rankings, mais seriamente as encaramos e mais facilmente citamos de cor a empresa X ou Y como pertencente ao ranking 500 da Fortune ou ao Índice de Sustentabilidade do Dow Jones ou ainda à classificação das empresas mais éticas do mundo, dos CEOs com melhor performance, entre uma panóplia alargada de outros tantos.

Todavia, e também inerente a esta mudança dos tempos, existem cada vez mais atributos intangíveis, difíceis de avaliar, mas que fazem sentido analisar no ambiente empresarial em que passamos a viver. E, lenta mas progressivamente, é o que está a acontecer com um novo ranking, desenvolvido timidamente por uma empresa britânica, mas que, e com o aval da reconhecida Harvard Business Review, começa a ganhar terreno – ou a chamar a atenção dos media – e cuja edição de 2016 acaba de ser tema em destaque na revista norte-americana.

Estamos a falar da avaliação da “empatia” – dessa capacidade tão humana de compreender os sentimentos dos outros, colocando-se no seu lugar – mas que, e muito graças aos media sociais, pode – e deve – ser aplicada às empresas ou, mais concretamente, aos seus líderes, pelo menos de acordo com um novo negócio que, contando já com algumas empresas de peso como clientes, pretende “ensinar” a gestão de topo a imprimir doses de empatia nas empresas que lideram.

[pull_quote_left]Assegurando que a empatia está directa e positivamente correlacionada com o crescimento, a produtividade e o lucro das empresas, o actual Global Empathy Index lista as empresas mais “empáticas” (e as menos também) de 2016[/pull_quote_left]

Tudo começou em 2010, pela mão de Belinda Parmar, fundadora da consultora britânica The Empathy Business, e seleccionada, em 2014, como uma Young Global Leader, pelo Fórum Económico Mundial. No início, a consultora em causa tinha como principal objectivo ajudar mulheres na área das tecnologias, com o objectivo de encontrar “um Mark Zuckerberg no feminino” (a sua fundadora é autora do livro “Little Miss Geek: Bridging the Gap Between Girls and Technology”, publicado em 2012), mas cedo percebeu que “não eram as questões de género que maior impacto tinham na performance das empresas, mas antes a empatia”.

Assim, a pequena consultora especializou-se em avaliar os níveis de empatia existentes nos clientes, nos colaboradores e no público em geral de um conjunto de grandes empresas e criou o primeiro índice de empatia com a banca europeia a servir de “cobaia”. Actualmente, o objectivo não consiste apenas em avaliar esta característica nas maiores empresas mundiais, como ajudar a “embuti-la” nos grandes gigantes organizacionais. Assegurando que a empatia está directa e positivamente correlacionada com o crescimento, a produtividade e o lucro das empresas, o actual Global Empathy Index , que lista as empresas mais “empáticas” ( e as menos também) de 2016, foi recentemente publicado na revista de Harvard e revela algumas tendências importantes, nomeadamente o facto de as empresas que compõem o seu Top 10 – este ano encimado pelo Facebook – terem duplicado o seu valor face às 10 últimas do ranking.

A consultora define a empatia corporativa através de três componentes: o cliente, o empregado e os media sociais. E é através da combinação deste trio, em que cada um dos elementos possui um peso igual, e tendo em conta três canais correspondentes – o interno (empregados), o externo (clientes) e o social – que chega ao denominado “quociente da empatia”.

[pull_quote_left]O índice de este ano “dividiu” a empatia em categorias tão distintas quanto a ética, a liderança, a cultura da empresa, a percepção da marca e as mensagens públicas veiculadas através dos media sociais[/pull_quote_left]

Como é explicado no artigo da Harvard Business Review, o Índice de Empatia procura responder à questão “quais as empresas que mais bem-sucedidas estão a ser na criação de uma cultura de empatia”, a qual está intimamente relacionada com a retenção das melhores pessoas, de ambientes em que as equipas mais diversificadas florescem e com as empresas que maiores recompensas financeiras conseguem colher.

Sendo esta a terceira edição deste ranking ainda pouco conhecido – e, na verdade, não tão bem explicado como seria desejável – a consultora tem vindo a aperfeiçoar o seu modelo de avaliação, ajustando os seus critérios e expandindo o tipo de fontes de dados em análise.

Assim, o índice de este ano “dividiu” a empatia em categorias tão distintas quanto a ética, a liderança, a cultura da empresa, a percepção da marca e as mensagens públicas veiculadas através dos media sociais. Adicionalmente, o ranking incluiu ainda outro tipo de métricas como a taxa de aprovação dos CEOs por parte dos empregados, o rácio de mulheres nos conselhos de administração e o número de infracções ou escândalos correspondentes a cada uma das empresas analisadas. A informação financeira é proveniente da S&P Capital IQ, uma divisão da S&P Global, a que diz respeito aos empregados vem da Glassdoor e, só para o ranking deste ano, um conjunto de dados qualitativos foi utilizado a partir da selecção de um painel do Young Global Leaders do Fórum Económico Mundial, aos quais foi pedido que avaliassem a moralidade das empresas em causa. A consultora analisou ainda cerca de dois milhões de tweets, entre 27 de Setembro e 16 de Outubro do corrente ano. Para já, o índice conta com empresas globais, maioritariamente dos Estados Unidos e do Reino Unido e ainda com 10 empresas indianas, sendo que a ideia é estendê-lo a outras geografias, como África, já em Março de 2017, ficando as empresas chinesas de fora dada a inexistência de informação publicamente disponível.

Mas e afinal, quais as empresas que melhor e pior pontuaram neste recente ranking da empatia?

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Tecnológicas são as mais empáticas, banca e telecomunicações as menos

Para já, é importante referir que das 10 empresas que compõem o top das mais empáticas, seis pertencem ao sector da tecnologia. Com o Facebook a obter a pontuação mais elevada, segue-se a Alphabet (Google), o LinkedIn e o Netflix, e ainda a Microsoft (em 7º lugar) e a SAP a fechar este top 10. Na 5ª posição, a gigantesca Unilever que, conjuntamente com a WholeFoods (em 8º), representa bem o sector dos bens de consumo, bem como a Southwest Airlines, a única do sector das viagens e turismo a figurar no “top +” e a Johnson & Johnson a representar a área farmacêutica.

O facto de serem as grandes tecnológicas a ocupar os principais lugares da tabela – e a liderar o que Belinda Parmar considera como uma nova mudança cultural – corresponde exactamente ao papel que a própria tecnologia – e em particular, os media sociais – tem nos vários domínios da actualidade. Num artigo sobre o ranking publicado pelo Fórum Económico Mundial, a fundadora da The Empathy Business afirma que “os media sociais alteraram tudo, ao mesmo tempo que levantaram a ponta do véu empresarial. Agora todos nós podemos olhar para os mecanismos internos de uma empresa, sendo que se existir algum tipo de comportamento do qual não gostamos ou com o qual não concordamos, é muito mais fácil fazermos ouvir a nossa voz”.

Explicando que o Facebook subiu, de 2015 para 2016, da 48ª posição para a primeira, tal deve-se, segundo Belinda Parmar, ao facto de a empresa saber escutar os seus clientes e trabalhadores – ou saber colocar-se no seu lugar – e proceder, de seguida, à avaliação deste feedback e alterar o que tem de ser alterado. No caso específico da empresa de Mark Zuckerberg, este salto de quase meia centena de posições deve-se também à implementação do denominado Empathy Lab (v. caixa), desenvolvido para melhorar o acesso de pessoas com necessidades especiais aos serviços que oferece.

[pull_quote_left]Os media sociais alteraram tudo, ao mesmo tempo que levantaram a ponta do véu empresarial. Agora todos nós podemos olhar para os mecanismos internos de uma empresa, sendo que se existir algum tipo de comportamento do qual não gostamos ou com o qual não concordamos, é muito mais fácil fazermos ouvir a nossa voz[/pull_quote_left]Mas e como também sublinha no artigo que assina para a Harvard Business Review, tão “fácil” quanto subir um conjunto significativo de degraus no ranking é descer vertiginosamente no mesmo. Na medida em que a empatia está fortemente correlacionada com a ética, e dado que um passo em falso nesta matéria traz sempre um custo associado, a responsável pelo Índice de Empatia dá o exemplo da queda do Deutsche Bank – posicionado, em 2015, em 40º lugar e caindo, em 2016, para uma péssima 110ª posição – e também do Wells Fargo, de 20º classificado para 130º, no rescaldo dos escândalos recentes em que ambos foram actores principais. Atolados em indecências de ordem variada, desde falsos testemunhos, manipulação de taxas, branqueamento de capitais, no caso do primeiro, até ao esquema de mais de um milhão de contas falsas e a emissão de meio milhão de cartões de crédito sem autorização, no caso do banco norte-americano, os quais levaram a demissão dos seus respectivos CEOs, a banca continua, sem remédio, a protagonizar histórias de vergonha e de ausência total de ética.

Neste índice, a maior pare das instituições financeiras posiciona-se nos últimos 25 lugares, sendo apenas ultrapassadas – em termos de mau comportamento ou ausência de empatia – pelas grandes empresas de telecomunicações, como é o caso da Vodafone, da British Telecom, da Deutsche Telekom, da Verizon, entre outras. De acordo com a perspectiva de Belinda Parmar, esta falta de empatia relativa a estes gigantes das telecomunicações deve-se, em muito, exactamente às suas (más) estratégias sociais, na medida em que a forma como tratam os clientes continua a ser a “tradicional” resposta “enlatada” proporcionada pelos call-centers, não conseguindo acompanhar a nova era dos media sociais. Mas e afinal, que sectores estão bem mais apetrechados para “se colocarem nos sapatos” dos seus clientes e colaboradores?

[pull_quote_left]Quando se utiliza o conceito de “empatia corporativa”, tal significa a compreensão, cognitiva e emocional, das experiências dos outros, as quais resultam, no final, em acções consistentes[/pull_quote_left]

Tendo em conta os três rankings já realizados, a indústria das tecnologias aparece destacada na medida em que é “mais jovem” e mais aberta à inovação, comparativamente aos sectores liderados por CEOs mais tradicionais ou da “velha escola” os quais, segundo a consultora, ainda têm que acordar para os benefícios de um modelo corporativo que coloca a empatia no seu centro.

Parmar recorda ainda que quando se utiliza o conceito de “empatia corporativa”, tal significa a compreensão, cognitiva e emocional, das experiências dos outros, as quais resultam, no final, em acções consistentes com esta “disponibilidade para se calçar os sapatos de outrem”. Ou seja, uma boa receptividade face às necessidades ou desejos de empregados, clientes e público em geral, o que, em outros modelos de negócio “novos” pode ser considerado como o “propósito”, “envolvimento” ou “autenticidade” que parecem ainda faltar aos que se pautam pelas ardósias da velha escola corporativa. E é possível reduzir-se este défice de empatia que caracteriza ainda um conjunto demasiado amplo de grandes empresas? Ora e para o negócio da empatia gerido por Belinda Parma, claro que sim. Vejamos como.

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Como “embutir” empatia nas empresas (ou saber calçar os sapatos dos outros)

Um dos obstáculos com o qual se depara a consultora do The Empathy Business – e que não é, de todo, surpreendente – prende-se com o facto de os líderes de negócio não levarem muito a sério a questão da empatia e, por esse motivo, considerarem-na apenas como mais uma mera iniciativa que fica bem “fazer” nos departamentos de recursos humanos e pouco mais. Por outro lado, e por constituir uma característica intangível – e, como todas as outras, difícil de avaliar – torna-se, em simultâneo, complicado de avaliar o quão empática determinada empresa é e, mais importante ainda, onde residem os seus maiores défices [de empatia].

Claro que, e de acordo com Belinda Parma, esta é uma percepção errónea, pois é possível avaliar o quociente de empatia de qualquer empresa, permitindo desta forma que o CEO, ou a equipa de liderança, identifique as forças e as fraquezas da organização e, em simultâneo, possa avaliar a sua performance face aos concorrentes. A fundadora do The Empathy Business afirma ainda que a empatia não é uma soft skill, mas antes uma hard skill que deve ser implementada em toda a empresa e através dos três canais por excelência já anteriormente citados; internamente, para os seus próprios colaboradores, externamente, tendo em conta os seus clientes e, para o público, através dos media sociais.

[pull_quote_left]É possível avaliar o quociente de empatia de qualquer empresa, permitindo desta forma que o CEO, ou a equipa de liderança, identifique as forças e as fraquezas da organização e, em simultâneo, possa avaliar a sua performance face aos concorrentes[/pull_quote_left]

Para explicar de que forma é possível dotar a cultura da empresa de doses adequadas de empatia, afirma Belinda Parma que o primeiro passo é identificar os “focos de conflito” – ou as actividades e comportamentos que carecem de relações empáticas – e começar por os avaliar. E dá como exemplo a história da companhia aérea Ryanair, e do seu programa Always Getting Better, o qual soma já três anos de vida. Em 2014, a empresa low cost decidiu alterar algumas das regras que vigoravam nos seus voos, aumentando a carga na bagagem de cabine, permitindo a marcação de lugares, conferindo uma maior transparência à cobrança de “taxas escondidas” e eliminando algumas delas, e lançando um novo website e uma app móvel, ou, em suma, respondendo às queixas e desejos dos seus clientes. Belinda Parma recorda as palavras do presidente da companhia, Michael O’Leary, quando este afirmou que “se soubesse que ser simpático para os clientes iria funcionar tão bom, já o teria feito há muito mais tempo”. Em termos de posicionamento no Índice da Empatia, a Ryanair subiu 13 posições face ao ranking de 2015, com um crescimento nos seus resultados líquidos de 867 milhões de euros, para 1,24 mil milhões de euros. em Março de 2016.

A responsável pelo consultora especializada em empatia assegura também que os primeiros passos não precisam de ser “grandes” e que se pode começar pela implementação de pequenos “incentivos de empatia”, desde que bem sistematizados, e que o que conta não é o que valem isoladamente, mas sim em conjunto. No artigo de Harvard, fala de um banco europeu que resolveu implementar uma “fundo de empatia”, permitindo que o seu staff utilize pequenas quantidades de dinheiro, como bem entenderem, para melhorarem o seu envolvimento com os clientes. Um exemplo simples é enviar um cartão de “simpatia” a um cliente que tenha sofrido uma perda de um ente querido, por exemplo.

Para a fundadora deste novo negócio que aposta na empatia, o que interessa são os pequenos gestos que, em conjunto, poderão, e muito, aumentar a satisfação dos stakeholders e, consequentemente, os lucros. Se assim é ou não, é impossível garantir. Mas também é verdade que mal não deve fazer.


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E o Óscar da empatia corporativa vai para o… Facebook

Para melhorar a sua experiência online, o Facebook criou um Laboratório de Empatia – cujo nome nada tem a ver com o ranking e o negócio da consultora britânica – especialmente concebido, mas não só, para pessoas com algum tipo de incapacidade. Desejando assegurar que os seus produtos e serviços estivessem disponíveis para todos os utilizadores, a empresa lançou um “toolkit de acessibilidade”, fruto do trabalho de uma equipa de engenheiros e especialistas em diversas áreas que, desde 2011, se dedicou inteiramente a estudar, e a sentir “na pele”, que tipo de experiência online têm, por exemplo, os invisuais, os surdos ou alguém que simplesmente não consegue utilizar um rato.

Adicionalmente, a equipa leva também em consideração outros factores de limitação na utilização da rede social, como por exemplo os utilizadores que vivem em países onde a velocidade da Internet é baixa, desenvolvendo soluções que permitam ultrapassar estes e outro obstáculos.

A compreensão e consequente sensibilização dos engenheiros cuja tarefa é pensar nas questões da acessibilidade tornou-se central na estratégia da empresa e do seu laboratório de empatia porque, e na verdade, o que é comum acontecer é só pensar nestes obstáculos depois de se receber feedback por parte dos utilizadores que pretendem ter acesso a uma experiência similar aos que não padecem de nenhuma incapacidade. Assim, a ideia é “antecipar” estas dificuldades sempre que os engenheiros se propõem a desenvolver uma nova funcionalidade ou serviço.

Se esta foi a razão para que a empresa de Mark Zuckerberg tenha subido ao pódio do ranking da empatia, não sabemos. Mas que é uma boa ideia, é, sem dúvida.

Assista ao vídeo que mostra de que forma uma mãe cega utiliza o Facebook.


Editora Executiva