Os temas da sustentabilidade e das alterações climáticas não estão imunes às notícias falsas; pelo contrário, a disseminação de informações erradas tem um impacto direto na perceção pública. A desinformação é um dos maiores desafios para a ação climática, pois mina a confiança na ciência, influencia as políticas ambientais e atrasa a implementação de medidas essenciais para mitigar as alterações climáticas
POR MARIA JOÃO RAMOS

Há algumas semanas, circulou a notícia de que Cristiano Ronaldo não se deslocaria ao Irão para evitar uma possível punição judicial que poderia resultar em até 100 chicotadas. Esta alegação rapidamente se espalhou pelas redes sociais e vários meios de comunicação a divulgaram como verdadeira, dando como certa uma valente carga de chicotadas, caso o CR7 resolvesse colocar os pés no Irão. No entanto, tratava-se de uma informação falsa.

Agora que falei no “melhor do mundo” e já tenho a vossa atenção, posso dar exemplos mais concretos sobre o tema que aqui me traz.

Durante os incêndios florestais em Los Angeles, em 2024, circularam nas redes sociais imagens falsas e informações enganosas. Algumas fotografias manipuladas mostravam o letreiro de Hollywood em chamas, o que não ocorreu na realidade. Além disso, surgiram teorias da conspiração que atribuíram a origem dos incêndios a causas infundadas, desviando a atenção dos verdadeiros fatores, como as alterações climáticas e a gestão inadequada dos terrenos.

Também após as devastadoras inundações em Valência, em outubro de 2024, que resultaram em mais de 210 mortes, houve uma proliferação de desinformação nas redes sociais. Grupos de extrema-direita disseminaram teorias que negavam a crise climática e culpavam o governo e a União Europeia pela tragédia. Mensagens falsas alegavam que as autoridades estavam a ocultar o número real de vítimas, utilizando imagens de morgues que, na verdade, eram de outros países e não estavam relacionadas com as inundações em Valência.

Toda esta desinformação dificultou a resposta das autoridades, semeando desconfiança entre a população, minando a confiança pública nas instituições e desviando o foco das verdadeiras causas dos desastres.

Pergunto-me, então, o que devemos fazer e em quem podemos acreditar quando até os principais veículos de comunicação do país divulgam notícias sem se preocupar com um simples fact-check?

Os temas da sustentabilidade e das alterações climáticas não estão imunes às notícias falsas; pelo contrário, a disseminação de informações erradas tem um impacto direto na perceção pública. A desinformação é um dos maiores desafios para a ação climática, pois mina a confiança na ciência, influencia as políticas ambientais e atrasa a implementação de medidas essenciais para mitigar as alterações climáticas.

Nos últimos anos, tornou-se evidente que muitas pessoas já não verificam se uma notícia é verdadeira ou falsa antes de a partilharem. Esta realidade tem sido impulsionada pela polarização política, pelo uso estratégico da desinformação e pelo crescimento das redes sociais, onde conteúdos virais se espalham rapidamente, independentemente da sua veracidade. Plataformas como Facebook, X, Instagram e TikTok são frequentemente usadas para disseminar informações erradas sobre as alterações climáticas, como a ideia de que estas são um “ciclo natural” e não causadas pela atividade humana, além da negação do consenso científico sobre o aquecimento global e teorias da conspiração sobre “interesses ocultos” por trás das políticas climáticas.

A presidência de Donald Trump foi e é um marco no enfraquecimento da luta contra as alterações climáticas, não só pelas suas decisões políticas – como retirar os EUA do Acordo de Paris –, mas também pela disseminação de narrativas negacionistas. Trump chamou as alterações climáticas de “farsa”, descredibilizou cientistas e reforçou a ideia de que as regulamentações ambientais prejudicam a economia. Este impacto duradouro e grave encoraja outros líderes e influenciadores a adotar discursos semelhantes, criando uma base de apoio para políticas antiambientais e dificultando a implementação de medidas sustentáveis.

A desinformação tem consequências diretas na forma como a sociedade encara a crise climática. Se as pessoas acreditam que as alterações climáticas não são um problema real ou urgente, pressionam menos os governos para agir, o que resulta numa falta de mobilização coletiva e em atrasos nas políticas necessárias para combater o aquecimento global. Além disso, cria um ambiente em que é mais difícil alcançar consensos científicos e gerar apoio popular para soluções eficazes.

E este é um problema do qual todos fazemos parte, quando partilhamos notícias sem as confirmar, alimentamos a desinformação nas redes sociais e damos espaço a grupos radicais para avançarem com as suas agendas. Cada vez que partilhamos uma informação sem verificar a sua veracidade, estamos a contribuir para a propagação de uma falsa narrativa que prejudica a luta contra as alterações climáticas.

Precisamos de incentivar e ensinar as pessoas a identificar fontes fiáveis, a verificar as notícias antes de as partilharem, controlar melhor os conteúdos falsos e penalizar quem espalha desinformação. Devemos também colocar a tecnologia ao serviço da sustentabilidade, mas de forma correta, ou seja, tornar os dados científicos acessíveis ao público de maneira simples e clara.

Combater a desinformação é uma responsabilidade coletiva que deve ser encarada como um passo essencial para proteger o nosso planeta e garantir um futuro mais sustentável para as próximas gerações. Quanto mais difícil for espalhar fake news, mais fácil será mobilizar a sociedade para agir.

Consultora de Estratégia e Comunicação para o Desenvolvimento Sustentável

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