A geração X, composta por profissionais entre os 45 e os 60 anos, acumulou décadas de experiência, resiliência e compromisso. No entanto, muitos sentem-se invisíveis, subvalorizados ou empurrados para a irrelevância no local de trabalho. Nascidos entre dois mundos – o analógico e o digital – são hoje pilares silenciosos da estabilidade e da memória organizacional. Assim, por que motivo estão a ser deixados para trás?
POR HELENA OLIVEIRA

Apesar da sua vasta experiência, conhecimento acumulado e resiliência testada, muitos profissionais da geração X sentem-se cada vez mais invisíveis nos locais de trabalho. Este fenómeno traduz-se num subaproveitamento claro de um capital humano que é essencial para enfrentar os desafios actuais das organizações — da retenção de talento à transmissão de saberes, da estabilidade à diversidade geracional.

Englobando os indivíduos que atingiram a maioridade à sombra da geração dos Baby Boomers, ensanduichados entre duas coortes demográficas proeminentes, esta geração testemunhou o aparecimento dos computadores pessoais, o advento da Internet e a queda do Muro de Berlim. Viveram recessões económicas, mudanças nas estruturas familiares e alterações culturais que desafiaram as normas tradicionais, entre muitos outros acontecimentos que “mudaram o mundo”.

Mas e nos dias que correm, dados recentes da OCDE , do World Economic Forum e de outras instituições, alertam para uma realidade preocupante: os trabalhadores acima dos 50 anos enfrentam taxas mais elevadas de desemprego de longa duração, têm menos oportunidades de reconversão profissional e são menos considerados para promoções ou desafios estratégicos. Em muitos sectores, ser “sénior” significa estar a um passo da irrelevância — mesmo quando o currículo, a ética de trabalho e a lealdade desmentem esse juízo precipitado.

Como sabemos, o mercado de trabalho está a envelhecer rapidamente: para 2060, a OCDE prevê que a razão entre a população sénior e a população activa aumente dos actuais 31 % para 52 % – um cenário já visível em países como Itália, Japão, Espanha e Portugal. Este desequilíbrio estrutural está a impulsionar políticas para integrar melhor os 50+.

Com este envelhecimento cresce também a necessidade urgente de adaptar as culturas organizacionais ao valor dos profissionais mais seniores. Ainda segundo dados da Pordata, “o trabalhador envelheceu: há 20 anos, um terço dos trabalhadores tinha entre 44 e 64 anos. Hoje, praticamente metade estão nesta faixa etária”. Adicionalmente, “o escalão etário dos trabalhadores que mais aumentou foi entre os 55 e os 64 anos, registando uma subida de 66%”, afirma ainda a Pordata, o que se traduz numa tendência que continuará a acentuar-se nas próximas décadas devido ao aumento da esperança média de vida, do declínio das taxas de natalidade e do prolongar da idade de reforma.

Neste contexto, a geração X — nascidos entre 1965 e 1980 — representa hoje um pilar preocupantemente silencioso no interior das organizações. Como já acima enunciado, são profissionais que viveram profundas transformações sociais e tecnológicas, e que transportam consigo um conhecimento acumulado valioso, fruto de décadas de adaptação, lealdade e contributo para o crescimento das empresas. No entanto, muitos sentem-se progressivamente “apagados”: não por deixarem de ter valor, mas por um fenómeno crescente de invisibilidade.

O custo escondido do preconceito

Em particular, os profissionais 50+, e mesmo acumulando experiência, estabilidade e visão estratégica, são frequentemente esquecidos nos planos de formação, excluídos dos projectos mais inovadores e preteridos em processos de promoção. Como aponta um estudo recente do Fórum Económico Mundial, apenas 4% das estratégias de diversidade e inclusão implementadas pelas empresas têm em conta a variável “idade”.

Esta discriminação etária — ainda que muitas vezes não assumida — assume formas subtis: desde a ausência de convites para programas de reskilling e upskilling até à ideia de que os mais velhos são resistentes à mudança ou não dominam as tecnologias emergentes. A Harvard Business Review aponta que “as organizações sobrestimam frequentemente os custos de formar trabalhadores mais velhos e subestimam os custos de perder talento experiente”.

Num tempo em que se fala tanto de talento, é paradoxal que as empresas ignorem aquele que já têm — maduro, resiliente, disponível e, muitas vezes, mais comprometido. A invisibilidade da geração X não é inevitável: é o resultado de uma cultura que continua a valorizar a juventude e inovação, mas que esquece a profundidade, a consistência e a memória — ingredientes essenciais para qualquer organização que queira crescer com equilíbrio e sustentabilidade.

Em muitos casos, a idade é sinónimo de obsolescência digital: evitam-se candidaturas, excluem-se progressões, e surgem comentários depreciativos sobre “resistência à mudança” ou “dificuldades tecnológicas”. A conclusão parece irónica: esta faixa etária é relegada para longe de formações estratégicas que lhe permitiriam continuar a contribuir, ao mesmo tempo que se criam estereótipos que os marginalizam — embora tenham competência e motivação para continuar. A OCDE recomenda políticas anti‑discriminação e estratégias de aprendizagem contínua para desconstruir esta invisibilidade .

E, neste sentido, importa também sublinhar que a exclusão digital não é, em muitos casos, resultado de incapacidade, mas da falta de investimento das empresas na formação contínua de todos os seus colaboradores. Ao serem deixados para trás em ferramentas, plataformas ou processos novos, muitos profissionais seniores acabam por se desactualizar à força — criando um ciclo vicioso de desvalorização que não parte da competência, mas da omissão.

O preconceito etário manifesta-se também, ainda que seja através de formas subtis mas persistentes: piadas sobre “ser do tempo do fax”, convites ausentes para formações mais avançadas, ou a ideia de que um profissional com mais de 50 anos “já não ambiciona crescer”. A verdade é que muitas destas pessoas estão no auge da sua maturidade profissional, com vontade de contribuir, aprender e adaptar-se — se forem envolvidas com sentido e respeito.

No fundo, a invisibilidade da geração X é uma escolha — e não uma inevitabilidade. Reconhecê-la como activo estratégico e não como passivo em transição é o primeiro passo para uma cultura mais justa, eficaz e sustentável.

Mais do que experiência: estabilidade, memória e visão

Num tempo marcado por alta rotatividade, burnout precoce e instabilidade nas equipas, os profissionais com mais de 50 anos continuam a representar um dos recursos mais consistentes e subvalorizados nas organizações. Longe de simbolizarem o declínio, trazem uma combinação única de experiência prática, maturidade emocional e compromisso organizacional, que é cada vez mais escassa.

Os trabalhadores 50+ são portadores de um conhecimento tácito acumulado ao longo de décadas, que muitas vezes não está documentado nem é facilmente transferível. Como sublinha a OCDE no Employment Outlook 2025, “as empresas que conseguem reter talento sénior estão melhor preparadas para enfrentar choques e ciclos de mudança, precisamente porque possuem memória organizacional e capacidade adaptativa consolidada”.

Com maior capacidade de gestão emocional, estes profissionais tendem a reagir melhor sob pressão, a mediar conflitos com mais empatia e a contribuir para ambientes de trabalho mais coesos. A Harvard Business Review destaca que colaboradores seniores “demonstram maior autocontrolo, menor impulsividade nas decisões e uma tendência superior para resolver disputas com diplomacia”

Muitos profissionais da geração X assumem naturalmente o papel de “ponte geracional”, facilitando a comunicação entre equipas mais jovens e estruturas mais tradicionais. Um relatório da McKinsey afirma que a diversidade geracional bem gerida contribui para melhores resultados em inovação e retenção, sendo os líderes seniores, “essenciais na criação de ambientes psicologicamente seguros para equipas intergeracionais”

Adicionalmente, a fidelização dos colaboradores 50+ tende a ser mais elevada. Segundo o World Economic Forum, “os profissionais mais velhos demonstram níveis superiores de engagement com a missão das organizações, menor propensão a mudar de emprego por motivos marginais e maior interesse em deixar um legado duradouro. Esta estabilidade permite às empresas reduzir custos com recrutamento e integração, além de preservar o capital relacional interno e externo.

Em suma, os 50+ não são apenas detentores de experiência: são pilares, ainda que silenciosos, da sustentabilidade organizacional. A sua valorização efectiva pode ser o antídoto para muitos dos desequilíbrios que hoje fragilizam as culturas de trabalho contemporâneas.

Mentoring reverso: quando o conhecimento circula nos dois sentidos

Nas organizações de hoje e como sabemos, podem coexistir até cinco gerações no mesmo local de trabalho — dos Baby Boomers à geração Z. Esta convivência é, em teoria, uma riqueza. Mas, na prática, as tensões geracionais são um desafio crescente, sobretudo quando não há espaços de escuta mútua, nem políticas internas que reconheçam o valor da diversidade etária.

As fricções são muitas vezes subtis, mas reais: diferentes estilos de comunicação, prioridades distintas, visões contrastantes sobre o tempo, a tecnologia, a autoridade ou o papel do trabalho na vida. Para a geração X, habituada a um equilíbrio entre esforço e recompensa, o imediatismo e a fluidez das novas gerações podem ser fonte de inquietação. Por outro lado, os mais jovens podem interpretar a experiência e cautela dos seniores como rigidez ou resistência à mudança.

No entanto, segundo a AARP , equipas intergeracionais bem geridas têm melhor desempenho, apresentam maior capacidade de inovação e são mais resilientes em contextos adversos. A chave está na gestão activa desta diversidade — não escondê-la, mas valorizá-la intencionalmente.

Uma das práticas com melhores resultados tem sido o mentoring reverso, em que colaboradores mais jovens partilham conhecimentos digitais ou novas abordagens, enquanto os mais velhos transmitem visão estratégica, inteligência relacional ou memória institucional. O sucesso depende de uma cultura onde todos aprendem e ensinam, com respeito mútuo.

É também importante considerar que a convivência geracional não se resolve com workshops pontuais ou slogans sobre diversidade. Implica rever processos de recrutamento, formação, avaliação e gestão de talento, com métricas que reflictam o contributo de todas as faixas etárias. E implica, sobretudo, lideranças que saibam ouvir, articular e potenciar o que cada geração traz consigo — da ousadia à prudência, da agilidade ao legado.

Do preconceito à estratégia: mudar a cultura organizacional

Valorizar os profissionais acima dos 50 anos (ou a geração X no geral) não é uma questão de caridade nem de justiça social: é uma urgência económica, uma estratégia de sustentabilidade e um imperativo organizacional.

Numa altura em que o envelhecimento da população activa é uma realidade inescapável e o mundo do trabalho atravessa mutações profundas, desperdiçar o contributo dos seniores é um luxo a que nenhuma empresa pode dar-se. São eles que garantem a continuidade do conhecimento, a maturidade nas decisões, a memória institucional e, muitas vezes, a estabilidade de equipas sujeitas a grande rotatividade.

A exclusão silenciosa dos mais velhos — por via de preconceitos, negligência ou simples desatenção — compromete não apenas a dignidade individual, mas também a inteligência colectiva das organizações. E, como os dados revelam, o preconceito etário afasta, desmotiva e acelera saídas desnecessárias, mesmo de profissionais com vontade e capacidade para continuarem a contribuir.

Reconhecer o valor dos 50+ significa ir além da inclusão simbólica. Significa criar condições reais para a sua presença activa: oportunidades de desenvolvimento, desafios relevantes, ambientes mistos e respeito por diferentes ritmos e modos de trabalhar. Significa ver a idade não como um entrave, mas como um trunfo.

Imagem:© Tolgahan Akbulut/Unsplash.com

Editora Executiva

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