«Agora só um milagre salva a minha empresa!»
Pedro, ali mesmo à saída do banco, foi dominado por este pensamento desolado. O empréstimo tinha sido recusado! Deste modo em breve deixaria de conseguir fazer pagamentos. O negócio, com mais de vinte anos, sobrevivera a sucessivas crises; ultimamente, graças a esforços hercúleos, até à pandemia. Mas agora, com a inflação e, sobretudo, com a concorrência das alternativas digitais, o fim estava iminente. A não ser que surgisse um milagre…
POR JOÃO CÉSAR DAS NEVES
Pedro reparou então que era véspera de Natal, o momento ideal para pedir milagres. E o local certo para o fazer era, evidentemente, uma igreja. Lembrou-se também que, no meio da confusão, ainda não se tinha confessado para as festas. Então desceu ao parque de estacionamento, meteu-se no carro e atravessou metade da cidade para ir à igreja do padre João. O sacerdote, que o acompanhava desde criança, fora parte ativa e decisiva dos momentos mais marcantes da sua vida. Era indispensável consultá-lo neste momento.
Aparecer de improviso, para mais na véspera de Natal, era muito arriscado, pois o padre João tinha sempre muita gente para atender. Felizmente desta vez a espera não foi longa, pois estavam apenas duas pessoas na fila, e Pedro até aproveitou o tempo para fazer o exame de consciência. Quando finalmente entrou no gabinete do sacerdote foi recebido calorosamente e fez a sua confissão. No final desta, depois de receber a absolvição, Pedro disse:
«… e venho também pedir ao Menino do Presépio o milagre de salvar a minha empresa, porque agora só Ele lhe pode acudir!»
«Que disparate!», disse o padre João. «O Menino do Presépio não vem salvar empresas moribundas. Ele vem-te salvar a ti, não ao teu negócio!»
Pedro ficou descoroçoado com esta resposta e tentou justificar-se: «Mas ao longo destes vinte anos muitas vezes Lhe rezei para acudir à empresa; e muitas vezes senti que Ele fez verdadeiros milagres. Lembra-se? Contei-lhe muitas dessas histórias, e o padre João até concordou que eram milagres.»
«Sim, foram milagres para te salvar a ti, aos teus trabalhadores, clientes e fornecedores; não para salvar o negócio. E fê-lo a ti como fez aos outros. Deus ama todas as suas criaturas, como te disse nessas alturas, e por isso ama tanto a tua empresa como ama os teus concorrentes. Ele nunca faria batota a teu favor no jogo do mercado, só porque vens mais à missa que os outros. O que tu lhe estás a pedir agora é batota financeira.»
«Batota financeira?!», admirou-se Pedro.
«Sim, claro. Tu sabes que a tua empresa está falida. Nestes últimos meses tentaste tudo, o possível e o impossível. Esta visita ao banco, disseste-me tu, era a última hipótese. E falhou. Tu não estás a pedir um milagre; estás a pedir uma injustiça, que é prejudicar os teus concorrentes para manter viva a tua firma insustentável, só por causa dos teus lindos olhos. Pedir isso é, só por si, uma afronta; propriamente um pecado. O Menino do Presépio sabe muito de finanças, ao contrário do que diz Fernando Pessoa. Já várias vezes te expliquei que o Pessoa é que não sabia muito de Jesus Cristo; nem de finanças. Por isso o Senhor está perfeitamente consciente, como tu também estás, que a tua empresa está morta. Aquilo que há a fazer agora é liquidá-la com justiça e dignidade, e avançar para a próxima fase da tua carreira, a etapa seguinte do teu caminho para o Céu.»
«A próxima fase da carreira?», disse Pedro pesaroso. «E o que é isso?»
«Ora aí está uma excelente pergunta e um excelente pedido a fazer este ano ao Menino do Presépio. Pergunta-Lhe onde é que Ele te quer a partir de agora. Pede-Lhe que te revele o que pretende que faças, para maior glória de Deus e serviços dos irmãos. Fizeste muito bem a muita gente com a tua empresa durante vinte anos, como te disse várias vezes. Irás certamente fazer muito bem a muita gente onde quer que vás agora trabalhar. Neste Natal nasce a segunda fase, e talvez a última, da tua carreira profissional. Mas será apenas mais uma das muitas fases da tua vida que ainda percorrerás até à vida eterna.»
«E que será dos meus colaboradores?», perguntou Pedro. «Sobretudo daqueles três mais próximos que estão comigo desde o princípio e que, tal como eu, deram tudo pela empresa?»
«Aí está outra excelente pergunta, que é capaz de ser o início da resposta à outra pergunta. Reúnam-se os cinco, conversem, e são capazes de encontrar a próxima fase da vossa carreira profissional.»
«Os cinco?», admirou-se Pedro.
«Sim, claro», respondeu o padre João. «Tu, a Joana, o António, a Matilde e o Menino do Presépio. Conversem sobre o que Ele quer que os quatro façam, e daí tem de sair a solução. Este ano, no Natal, nasce Jesus e nasce o vosso próximo negócio. Esse é o milagre porque eu vou rezar na Missa do Galo.»
Economista, professor catedrático na Universidade Católica e Coordenador do Programa de Ética nos Negócios e Responsabilidade Social das Empresas