As novas gerações não desistem de descobrir outros horizontes e tendem a apanhar o avião com mais regularidade que os mais velhos. A grande parte da geração Z que já tem autonomia financeira viaja mesmo muito e estes jovens pesam enormemente na atual retoma do sector da aviação. Embora o transporte aéreo seja responsável por quase 3% das emissões globais de CO2, percebe-se que no mundo pós-Covid os aviões continuam a desempenhar um papel muito principal
POR PEDRO COTRIM

Quatro anos após o começo da pandemia, a situação financeira da aviação está de boa saúde e as companhias regressaram praticamente ao nível de atividade anterior à crise. Em novembro de 2023, o tráfego atingiu 99,1% do nível registado em novembro de 2019, de acordo com os números da Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA), e os voos deverão intensificar-se ainda mais este ano, já que são esperados 4,7 mil milhões de passageiros em 2024, contra 4,5 mil milhões em 2019. Não houve nenhuma rutura após a crise sanitária e o mundo de depois parece-se muito com o mundo anterior. O fenómeno do «flygskam», ou vergonha de apanhar um avião devido à poluição gerada, parece continuar marginal.

As novas gerações não desistem de descobrir outros horizontes e tendem a apanhar o avião com mais regularidade que os mais velhos. A grande parte da geração Z que já tem autonomia financeira viaja mesmo muito e estes jovens pesam enormemente na atual retoma do tráfego aéreo. Embora os aviões sejam responsáveis por quase 3% das emissões globais de CO2, percebe-se que no mundo pós-Covid as viagens aéreas continuam a desempenhar um papel principal.

Ainda de acordo com os números da IATA, o tráfego de hoje é impulsionado principalmente pelo crescimento da classe média nos países emergentes, particularmente da China e da Índia. A classe média chinesa já conta com 450 milhões de pessoas e poderá duplicar em dez anos, segundo as promessas de Pequim.

É inegável de que o crescimento económico desempenha um grande papel no aumento do número de voos. Historicamente, o PIB explica dois terços da evolução do tráfego aéreo no mundo, ainda de acordo com a IATA.

O aumento do tráfego, superior a 4% em média nos últimos anos, deverá levar praticamente à duplicação da frota de aeronaves nos próximos vinte anos, segundo a Airbus e a Boeing. Aumentaria assim dos cerca de 28.000 aparelhos atuais para mais de 52.000 em 2044.

Estas duas construtoras, que respondem por mais de 80% da produção global de aparelhos, estão sobrecarregadas com pedidos das companhias. Renovam e ampliam a sua frota com aeronaves que consomem menos querosene, sendo, portanto, menos dispendiosas para operar, uma vez que o combustível representa uma grande parte dos custos das companhias.

Venderam-se 2.094 Airbus em 2023

A Airbus quebrou o seu recorde de encomendas em 2023, atingindo as 2.094 aeronaves – só a Turkish Airlines contribuiu com 220 pedidos em dezembro. A Air France-KLM também fez um pedido de 50 Airbus A350 em setembro. As companhias podem dar-se ao luxo de sacar do livro de cheques, até porque já reembolsaram os auxílios concedidos durante a crise da Covid-19 – a Air France-KLM anunciou na primavera de 2023 que já tinha reembolsado totalmente os empréstimos do Estado.

Os governos acudiram às companhias durante os confinamentos para evitar que falissem. No auge da crise, o número de passageiros transportados caiu 95%. Nas vésperas desta crise, três quartos das companhias tinham menos de três meses de liquidez. Sem ajuda estatal, teriam falido. As transportadoras aéreas têm custos fixos elevados (estacionamento, manutenção, tripulações) que se mantêm quando os aviões não estão a voar.

A Lufthansa obteve um apoio de 9 mil milhões de euros em 2020, incluindo uma entrada de capital do estado alemão; a Air France beneficiou de 7 mil milhões de euros em empréstimos, incluindo 4 mil milhões de empréstimos bancários garantidos pelo Estado. A KLM também recebeu ajuda do estado holandês num total de 3,4 mil milhões de euros. Cenários semelhantes ocorreram para outras companhias como a TAP, a Finnair ou a SAS.

A Ryanair estima o total dos subsídios públicos concedidos às companhias europeias durante a pandemia em 40 mil milhões de euros. A transportadora low cost, que não beneficiou deste auxílio, obteve em 2023 a anulação de parte do mesmo pelo Tribunal de Justiça da União Europeia. São decisões judiciais com efeitos limitados, dado que as companhias já reembolsaram tudo.

Low cost ou não, muitas companhias estão paradoxalmente a emergir mais fortes da crise sanitária graças à forte recuperação do tráfego aéreo, mas não é a única razão. Algumas são mais rentáveis ​​depois de cortarem na sua força de trabalho. Tirando o período 2015-2019, a aviação é um sector que, em média, gera poucos lucros. As companhias representam o elo da cadeia do transporte aéreo (fabricantes – aeroportos – serviços terrestres) com menor rentabilidade média.

O baixo custo influencia principalmente o preço da passagem para atrair viajantes, um fator importante que ajudou a impulsionar o crescimento do tráfego e deu a estas companhias um lugar predominante nos curtos e médios cursos. As transportadoras históricas, por seu lado, geram habitualmente mais margens em voos de longo curso, mas enfrentam uma concorrência crescente das congéneres do Golfo (Emirates, Qatar Airways, Etihad) e da Turkish Airlines. Aproveitam a sua localização geográfica para se posicionarem como um hub para servir o crescimento do tráfego asiático.

A indústria da aviação enfrentou um teste sem precedentes com a pandemia de Covid-19, mas emergiu ainda mais forte e resiliente. O regresso quase completo ao nível de atividade pré-pandemia demonstra a capacidade de adaptação e recuperação do sector, impulsionado principalmente pelo desejo contínuo das novas gerações de explorar o mundo e pela crescente classe média em países emergentes. Apesar dos desafios ambientais e das preocupações com as emissões de CO2, o sector continua a desempenhar um papel fundamental no transporte global e no crescimento económico.

À medida que olhamos para o futuro, é imperativo que a indústria da aviação equilibre o crescimento económico com a sustentabilidade ambiental, visando operações mais eficientes e conscientes do ponto de vista ecológico. Com o compromisso contínuo com a inovação e a responsabilidade ambiental, a aviação está preparada para continuar a desempenhar um papel vital no cenário global, conectando pessoas e culturas e impulsionando o progresso.

Imagem: Nils Nedel/Unpslash.com