O antigo vice-presidente dos Estados Unidos e o ex-banqueiro de investimento da Goldman Sachs, David Blood, lançaram um “manifesto para o capitalismo sustentável”. De acordo com a sua visão, a adopção de standards sociais, ambientais e de governança irá aumentar a rentabilidade das empresas a longo prazo e atrair, em simultâneo, mais investidores. Desafiar a ortodoxia perniciosa do curto prazo é igualmente um dos objectivos do manifesto
“Logo imediatamente após a segunda guerra mundial, na altura em que os Estados Unidos preparavam o seu plano visionário para cultivarem o capitalismo democrático além fronteiras, o General Omar Bradley afirmou: ‘está na altura de sermos guiados pelas estrelas e não pelas luzes de cada navio que passa’. Hoje e mais de 60 anos passados, isso significa abandonar o pensamento económico de curto prazo e adoptar o capitalismo sustentável”. Esta é a introdução de um “Manifesto para um Capitalismo Sustentável”, escrito por Al Gore e por David Blood, ambos sócios da Generation Investment Managament, uma firma de investimento cuja abordagem tem como ideia base que os diferentes factores de sustentabilidade constituem a melhor forma de retorno de longo prazo para as empresas. A firma, lançada em 2004 pelo antigo vice-presidente dos Estados Unidos e pelo ex-banqueiro de investimento da Goldman Sachs, tem vindo a levar cada vez mais a sério os critérios económicos, ambientais, sociais e de governança na análise do seu portefólio de investimento. E, tanto assim é que, em Dezembro último, resolveu lançar este manifesto, publicando-o no The Wall Street Journal e que tem como ideia fulcral dar prioridade ao valor económico de longo prazo em detrimento dos interesses financeiros imediatos. Seja porque o mundo inteiro continua às voltas com uma crise financeira e económica que não tem fim, ou porque são inúmeras as tentativas de dar uma nova face ao capitalismo tal como o conhecemos, o manifesto de Gore e Blood não foi recebido com o entusiasmo que o vencedor do Nobel da Paz, via disseminação das ameaças das alterações climáticas, se habituou. O manifesto foi até alvo de várias críticas, sendo que a mais grave foi proferida por Richard A. Epstein, um reconhecido académico e autor que acusou os autores do manifesto, entre outras coisas, de terem incorrido num diagnóstico profundamente errado do denominado “problema da sustentabilidade”. O VER resume as principais ideias e linhas de acção contidas no documento e exorta os seus leitores a reflectirem e a comentarem esta nova proposta de capitalismo. Como definição do proposto capitalismo sustentável, os autores clamam por uma nova estrutura que procure maximizar o valor económico de longo prazo, a partir de uma reforma dos próprios mercados, exortando-os a abordar as verdadeiras necessidades existentes no planeta, ao mesmo tempo que integram métricas ambientais, sociais e de governança (ESG – no acrónimo em inglês) em todo o processo de tomada de decisão. Mais ainda, este tipo de capitalismo sustentável aplica-se a toda a cadeia de valor de investimento – desde os negócios empreendedores até às grandes empresas cotadas, dos investidores de capital semente aos investidores institucionais, sem esquecer colaboradores e CEOs ou activistas e decisores políticos. Os autores garantem igualmente que as empresas e os investidores que já integram a sustentabilidade nas suas práticas de negócio estão a descobrir que esta aumenta a sua rentabilidade a longo prazo. E enumeram quatro benefícios importantes, demonstrados pela experiência e investigação conduzida até agora. A saber:
Citando o estudo desenvolvido pela Harvard Business School, os autores apresentam igualmente os benefícios desta nova estrutura de pensamento para os próprios investidores, afirmando que as empresas sustentáveis estão já a ultrapassar os seus pares “insustentáveis” a longo prazo. O estudo, publicado em Novembro último, traçou a performance de 180 empresas ao longo de 18 anos. E, as 90 firmas que adoptaram políticas social e ambientalmente responsáveis há já alguns anos superaram os seus pares neste período. Todavia e segundo escrevem os investigadores, “as empresas com elevada sustentabilidade superaram significativamente as demais, mas só em termos de longo prazo”. Assim, o capitalismo sustentável exige que os investidores sejam bons investidores, no sentido de compreenderem na totalidade as empresas nas quais investem, acreditando no seu valor e potencial de longo prazo. As cinco acções chave propostas Seguidamente, os autores do manifesto defendem relatórios integrados obrigatórios, afirmando que “apesar de estarmos a assistir a um aumento do volume e frequência da informação tornada pública pelas empresas, o acesso a esta informação por investidores não se traduziu necessariamente numa visão mais clara e eficaz das próprias empresas”. Os relatórios integrados abordam este problema na medida em que encorajam as empresas a integrar a sua performance financeira em conjunto com a performance ESG, o que permitirá, tanto às empresas como aos investidores, fazerem uma melhor alocação de recursos, tendo ao seu dispor uma visão de como a performance ESG contribui para a criação de valor a longo prazo. Enquanto os relatórios integrados voluntários estão a ganhar algum terreno significativo, os autores do manifesto defendem que estes deviam ser obrigatórios por parte de agências apropriadas, como a Bolsa de Valores e outros reguladores. Em terceiro lugar, Gore e Blood apelam ao fim da prática de publicação dos resultados trimestrais das empresas. Como explicam, “o calendário trimestral encoraja muitos executivos a gerirem para o curto prazo (…), o que encoraja igualmente os investidores a sobrevalorizarem o significado destas medidas em detrimento de outras mais significativas de criação de valor sustentável a longo prazo”. Um melhor alinhamento das estruturas de compensações dos executivos com a performance sustentável de longo prazo é outra das medidas defendidas pelo manifesto. “A maioria dos esquemas de compensações existentes”, alertam, “enfatiza as acções imediatas e falham na responsabilização dos gestores de activos e dos executivos corporativos relativamente à ramificação das suas decisões a longo prazo”. Por último, existe uma necessidade crescente para incentivar e recompensar o investimento de longo prazo. A lógica, neste caso, é a de que o “domínio do curto prazo existente nos mercados fomenta a instabilidade generalizada nos mesmos, ao mesmo tempo que enfraquece os esforços dos executivos que realmente se empenham para uma criação de valor de longo prazo”. O manifesto termina com a crença de que o capitalismo sustentável irá criar oportunidades e recompensas, mas também significará desafiar a ortodoxia perniciosa do curto prazo. E dado o estado da economia e do ambiente globais, o imperativo para a mudança nunca foi tão grande. Será esta a melhor forma de mudança? |
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Editora Executiva