POR GABRIELA COSTA
No âmbito do primeiro objectivo operacional da Estratégia de Apoio ao Empreendedorismo Sénior na Região Norte Empreender 45-60 – identificar e analisar estratégias de emprego implementadas em países da União Europeia, direccionadas à população desempregada e qualificada, com idade superior a 45 anos, elencando os principais drivers de sucesso – que, em conjunto com os restantes (ver Caixa), vai ao encontro das metas estabelecidas em matéria de emprego na Estratégia Europa 2020 e no Plano Nacional de Reformas, no sentido de se alcançar uma taxa de emprego de 75% na faixa etária entre os 20 e os 64 anos, seja por via do emprego público e privado seja pelo contributo dado pelo empreendedorismo e pelo emprego por conta própria, a Fundação AEP realizou um estudo de benchmarking internacional, com vista à identificação de modelos de apoio ao empreendedorismo sénior, recolhendo boas práticas internacionais passíveis de serem adaptadas ao País.
Desenvolvido com o co-financiamento dos Programas Norte 2020/Portugal 2020 e FEDER, o relatório “O Empreendedorismo Sénior na Europa”- Casos notáveis e recomendações para a Região Norte Portugal” – que compila os resultados de uma investigação relevante com base em dados oficiais de organizações europeias e mundiais, como a Comissão Europeia e a OCDE, bem como informação recolhida em relatórios de entidades políticas e organizações não-governamentais, outros trabalhos de investigação científica e estudos longitudinais que monitorizam os indicadores de evolução do emprego e empreendedorismo sénior nos países, e ainda os contributos de diversas instituições e entidades que organizam projectos de empreendedorismo sénior na Europa – conclui que a criação de um “ecossistema do empreendedorismo” que dê resposta às necessidades identificadas no Empreender 45-60 constitui “um desafio europeu”, com especial relevância para a região Norte de Portugal.
[quote_center]A Europa tem de ultrapassar a complexidade e modelo de estrutura dos seus programas e fundos europeus[/quote_center]
A nível nacional, as principais conclusões deste trabalho de estudo comparativo publicado em Abril evidenciam que Portugal “se encontra na retaguarda dos pares europeus, em termos de predisposição a empreender na senioridade e de experiência na implementação de programas de empreendedorismo sénior”. Contudo, o auto-emprego na senioridade “tem um peso substancial” no país (seja por motivação, seja por necessidade), justificando assim “um desígnio nacional que deverá consistir em desenvolver um ecossistema para o empreendedorismo sénior” (45-60), com o objectivo de aproveitar estes recursos e impactar, de forma positiva, a economia e a sociedade.
Por outro lado, o envolvimento dos governos dos países europeus “pode fazer a diferença na dinamização de programas de empreendedorismo sénior a médio e longo prazo”, dita o relatório, “combinando parceiros privados com estruturas públicas de suporte e com as ferramentas de dinamização económica e coesão social disponíveis”. Segundo o documento, “a Europa tem um conjunto de intenções empreendedoras que não estão ainda aplicadas na prática”, uma vez que ainda não conseguiu adoptar modelos adaptados aos seus Estados membros”, e precisa ultrapassar um conjunto de problemas aportados pela complexidade e modelo de estrutura dos seus programas e fundos europeus.
Boas práticas europeias são lição para Portugal
Tendo em vista contribuir para a definição de programas de apoio ao Empreendedorismo Sénior na Europa, que constituem o scope deste trabalho, a investigação desenvolvida analisa a diversa informação recolhida e os vários case study de sucesso implementados nesta área, na Europa, com o objectivo de propor uma reflexão sobre a sua aplicabilidade a Norte de Portugal, a região do País com o maior número de desempregados qualificados e de longa duração acima dos 45 anos.
No enquadramento do relatório, sublinha-se o interesse crescente do empreendedorismo sénior desde o início do século XXI, em particular no contexto de incerteza e mudança vivido no Velho Continente neste último quinquénio (2010-2015), tendencialmente persistente. Para os autores do estudo, este contexto exigirá, “de forma intrínseca, reformas e novos paradigmas, com novos processos, modelos e abordagens a serem definidos ao longo dos próximos anos”. Procedendo ao levantamento das barreiras e oportunidades do empreendedorismo sénior, a Fundação AEP aponta os pontos fortes e fracos do conceito e da sua implementação na Europa.
Num segundo capítulo, o relatório centra-se em boas práticas de empreendedorismo sénior na União Europeia, que parametriza, apresentando exemplos dos quais se podem retirar lições “que devem (podem) ser convenientemente tidas em conta na definição de um programa em Portugal”.
[quote_center]O empreendedorismo sénior é um tema ainda marginal nas preocupações políticas e sociais dos Estados membros da União[/quote_center]
Deste “Manual de Boas Práticas” da Comissão Europeia, que elenca 24 iniciativas já implementadas ao nível da Europa, entre os muitos projectos desenvolvidos em toda a União, ressalta a questão central da mentoria, dado que as principais dificuldades referidas pelos vários stakeholders envolvidos se verificam no que toca a encontrar mentores competentes, a definir de forma clara os requisitos do mentoring e a vê-lo valorizado por parte dos empreendedores beneficiários deste tipo de apoio. Neste aspecto, os autores concluem que “é fundamental o envolvimento da comunidade local e de instituições que compreendam os objectivos e benefícios sociais de programas de empreendedorismo sénior”. A mesma constitui, de resto, “um factor decisivo para o sucesso dos programas”. Fundamental é também “existir uma forte comunicação e visibilidade para o público-alvo e opinião pública”, envolvendo os Media.
Segue-se a apresentação e descrição de Casos Notáveis de programas de empreendedorismo sénior, e na sua grande maioria intergeracional – porque reconhecidos como sendo “de sucesso” – implementados nos últimos cinco anos. Trata-se de 12 case studies (11 europeus e um norte-americano, este último referido em diversas iniciativas europeias como um paradigma a seguir), que “são considerados como dos mais relevantes até aos dias de hoje”. Avaliando o âmbito da sua acção, métodos usados e resultados dos projectos, a partir do contacto com as organizações envolvidas no seu desenvolvimento, o que permitiu obter uma apreciação de quem esteve directamente ligado à sua implementação no terreno, a equipa de investigação concluiu pela necessidade de criação de uma “rede de contactos” de empreendedores seniores e parceiros, de modo a promover um “sistema” facilitador e interconectado, nos países da UE.
Finalmente, e num quarto capítulo que antecede as conclusões do relatório, são abordadas as políticas europeias que se traduzem e corporizam sistemas de incentivos e programas de financiamento (concretamente o Programa 2020, o Grundtvig, e o COSME). Sublinhando o apelo formulado por Bruxelas aos Estados membros da UE para que promovam e adoptem políticas de sensibilização sobre os fenómenos do empreendedorismo sénior e o envelhecimento activo, o relatório passa em revista as principais recomendações de práticas a serem implementadas pelos mesmos, incluídas em várias documentações de diversos organismos da Comissão Europeia.
[quote_center]O desemprego sénior é superior ao desemprego jovem[/quote_center]
Também neste capítulo, o estudo apresenta o sumário de indicadores sobre o fenómeno do auto-emprego, numa leitura comparada ao nível da Europa, tendo por base o documento GEm – Global Enterpreneurship monitor de 2015, da OCDE e da União Europeia, e contextualiza os factores pelos quais o empreendedorismo sénior é muito mais do que o “início de um novo negócio”, englobando um conjunto de actividades, como sejam o investimento e o suporte a negócios de terceiros (muitas vezes envolvendo intergeracionalidade), a passagem do próprio negócio e experiência (legado) a outros, e a profissionalização de serviços prestados (caso dos mentores freelancer).
Os autores do relatório da Fundação AEP concluem, pois, que o empreendedorismo sénior “constitui, acima de tudo, uma atitude”, quer por parte da população sénior, quer por parte da sociedade, dos stakeholders, das universidades, incubadoras tecnológicas e poderes públicos, nos vários países e nos vários cenários que se considerem. E defendem, por isso, “a criação de um ‘ecossistema do empreendedorismo europeu’ que integre a realidade do empreendedorismo sénior”, naquele que consideram “um tema ainda marginal nas preocupações quer políticas, quer das sociedades dos Estados membros da União”.
Jovens criam mais novos negócios mas seniores lideram auto-emprego
Se a iniciativa de empreender criando um novo negócio levada a cabo pela população sénior é muito menor quando comparada com o mesmo índice na população jovem, a verdade é que noutros indicadores do empreendedorismo sénior, ou seja, noutras actividades de auto-emprego e de manutenção de actividade na senioridade, como as acima referidas, a realidade é bem distinta.
Segundo o Inquérito “Força de Trabalho 2003-13” do Eurostat, a taxa de auto-emprego entre os seniores na UE-28 é superior à média registada na população total: entre os primeiros (50-64 anos) regista-se uma taxa de auto-emprego em torno dos 20%, superior à verificada, em termos relativos, nos jovens e adultos em geral (cerca de 15%). Contudo, a taxa de auto-emprego dos seniores na Europa tem vindo a decrescer de forma ligeira ao longo do tempo, à medida que um maior número de população chega à senioridade.
[quote_center]O número de idosos na União cresce a um ritmo seis vezes superior que o seu universo populacional[/quote_center]
Da análise dos dados contidos neste “EU Labour Force Survey” divulgado em 2014, em conjunto com o relatório “The Missing Entrepreneurs 2015” (OCDE e UE, 2015), conclui-se ainda que a Europa tinha em 2013 uma população de seniores em auto-emprego de 11,2 milhões de pessoas, e 1/3 deles tinha um ou mais empregados a trabalharem para si (taxa similar à restante população em auto-emprego). No entanto esta taxa varia muito de país para país (por exemplo, na Hungria 47% dos seniores em auto-emprego tem empregados).
No caso de Portugal, os dados apontam um decréscimo elevado das actividades de auto-emprego, em especial na população sénior entre os 50 e 65 anos. De acordo com o mesmo inquérito do Eurostat, a taxa de auto-emprego sénior em Portugal situava-se próximo dos 40% em 2003 (a segunda mais alta, praticamente o dobro da média da União Europeia) tendo decrescido de forma acentuada ao longo da última década, para valores apenas ligeiramente acima da média dos países da UE. Já a taxa de seniores portugueses em auto-emprego com empregados ao seu serviço varia entre os 25% e os 30% (estável), sendo ligeiramente inferior à média europeia. De forma bem menos expressiva, a taxa de penetração de empreendedores seniores que começaram um novo negócio, entre 2009 e 13, foi de 2,2% em Portugal. Ainda assim, esta percentagem é quase idêntica à média europeia.
Segundo o Inquérito “Força de Trabalho 2003-13” comprova-se que “a motivação empreendedora pura (criação de um novo negócio) dos seniores europeus é, em média, cerca de 40% mais baixa do que a taxa verificada na população em geral”. Pelo contrário, a análise do GEM – Global Enterpreneurship Monitor (OCDE e UE 2015) referente a “negócios existentes” revela que a taxa de “donos de negócios” seniores, ao nível da UE é 30% mais alta, em comparação com a taxa registada na média da população empreendedora em geral. Estes números sustentam uma penetração relativa superior do auto-emprego, quando as pessoas atingem a senioridade (50 ou mais anos), embora em termos de “iniciativa de criação”, esta esteja mais associada aos jovens.
No que respeita a Portugal, os dados das diferentes fontes compilados no relatório da Fundação AEP revelam que o desafio está em, por um lado, manter na senioridade o auto-emprego de pessoas que empreenderam negócios quando eram mais novas e, por outro, incrementar a predisposição para começar a empreender a partir dos 45 anos.
O auto-emprego sénior como forma de empreendedorismo constitui uma prioridade da UE, tanto mais que o desemprego sénior (50-64 anos) de pessoas à procura de uma oportunidade é superior ao desemprego jovem (15-24 anos), com variação mais visível a partir de 2009, regista o Eurostat 2014. Acresce que, para um país como Portugal, as actividades de auto-emprego sénior (nomeadamente a criação de novos projectos por parte de empreendedores seniores), apresentam ainda mais pertinência do que para a maioria dos países europeus, “sendo necessário lançar o repto às entidades a quem interessa o ‘ecossistema do empreendedorismo sénior’, incluindo a sociedade civil, para que este desiderato seja cada vez mais considerado”.
[quote_center]A motivação e o mindset empreendedor dos seniores portugueses é relativamente baixo[/quote_center]
Tendo em conta que as PME constituem a base da economia portuguesa e representam a maioria dos postos de trabalho do País, e que o factor demográfico de envelhecimento está a impactar de forma dramática toda a Europa – na UE28 a população com mais de 45 anos cresceu, na última década, em cerca de 26 milhões de indivíduos, ou seja 12%, enquanto a população total cresceu apenas 2% no mesmo período, ou seja, o número de idosos na União cresce a um ritmo seis vezes superior ao seu universo populacional -, conclui-se que em países cujos problemas estruturais de emprego são conhecidos, como Portugal e Espanha, a dinamização do empreendedorismo na senioridade poderá contribuir, de forma positiva, para o aumento de competitividade, para o crescimento económico e para a estabilidade de emprego.
Porém, a criação de auto-emprego na faixa etária entre os 45 e os 60 anos constitui um grande desafio, porquanto a motivação e o mindset empreendedor dos seniores portugueses é relativamente baixo, concluem os autores do relatório “O Empreendedorismo Sénior na Europa”- Casos notáveis e recomendações para a Região Norte Portugal.
E é neste contexto que o projecto “Empreender 45-60” se propõe “apontar caminhos” para o desenvolvimento de estratégias de apoio ao empreendedorismo sénior em Portugal, com prioridade para a aplicabilidade desta dinâmica à região Norte do País e Portugal, mas com a ambição de, futuramente, “servir de exemplo e despertar consciências” para outras iniciativas, a nível nacional.
Objectivos operacionais do Empreender 45-60
. Identificar e analisar estratégias de emprego implementadas em países pertencentes à União Europeia, direccionadas à população desempregada e qualificada, com idade superior a 45 anos, elencando os principais drivers de sucesso;
. Avaliar os principais constrangimentos, ao nível da oferta e da procura, que impedem o desenvolvimento de atitudes empreendedoras por parte deste grupo de população, na região Norte do País;
. Identificar as condições que favorecem o empreendedorismo sénior e propor modelos de actuação inovadores que contrariem os factores inibidores de uma atitude empresarial pró-activa;
. Promover o debate em torno da temática, pela partilha dos resultados obtidos nas fases do projecto;
. Desenvolver um conjunto de acções de capacitação dos principais agentes ligados ao empreendedorismo, promovendo o networking e a criação de redes de apoio que permitam minimizar os constrangimentos identificados;
. Implementar um projecto-piloto de apoio ao empreendedorismo sénior com base num modelo de mutualismo de geração de ideias e criação de negócios, associado ao empreendedorismo intergeracional.
Fonte: Empreender 45-60
Desafios societários que se colocam ao empreendedorismo sénior em Portugal e na Europa
. O factor populacional, com um crescimento contínuo do número de seniores nos países europeus e com um aumento do peso desta faixa etária no desemprego;
. O envelhecimento da população, que significa diminuição na vontade de iniciar novos negócios / startups, embora os seniores europeus considerem que têm sabedoria e competências para o empreendedorismo (com diferente gradação por país);
. A necessidade de desmistificar elementos tradicionalmente associados à senioridade, como inactividade, falta de competências digitais e de adaptação ao novo contexto;
. A dificuldade dos canais de comunicação habituais e dos programas ligados ao empreendedorismo conseguirem chegar aos seniores;
. O desconhecimento por parte dos seniores das instituições que os poderão apoiar, quer em termos de mentoria, quer em termos de formação de competências digitais e outras;
. Uma visão negativa, por parte dos mais jovens, sobre a pertinência e utilidade dos mais velhos como potenciais mentores nos processos de empreendedorismo.
Fonte: “O Empreendedorismo Sénior na Europa”- Casos notáveis e recomendações para a Região Norte Portugal
Jornalista