Se a crise climática fosse um filme, a COP seria o blockbuster anual. Com direito a tapete vermelho, discursos épicos e promessas de final feliz, o espetáculo atrai audiências globais e deixa manchetes esplêndidas nos jornais. Mas, ao contrário dos filmes, não há efeitos especiais que salvem o planeta no último segundo. Quando os líderes mundiais, heróis por um dia, regressam às suas vidas, o guião cheio de metas e compromissos desaparece como uma peça descartável. As promessas? Adiadas para o próximo ano. E o planeta? Fica à espera, enquanto o mundo assiste a mais um episódio de um espetáculo onde as palavras são grandiosas, mas a ação, essa, continua adiada para a final cut
POR PEDRO COTRIM

De tempos a tempos, a comunidade internacional assiste a uma das maiores encenações do mundo moderno: a COP – Conferência das Partes. É o espetáculo da diplomacia climática na sua expressão máxima, onde líderes de todo o mundo, cientistas, ativistas e empresários se reúnem, cheios de discursos empolgantes e promessas inspiradoras para salvar o planeta. Anualmente, as salas de conferências enchem-se de debates calorosos, com aplausos ruidosos após cada compromisso assinado, e as manchetes destacam as metas ambiciosas para reduzir emissões de carbono. Em cada edição, parece que um novo capítulo está prestes a ser escrito para transformar a história climática da humanidade.

Assim que as luzes da COP se apagam, a realidade, silenciosa e incómoda, regressa ao palco. Apesar das declarações e dos compromissos grandiosos, os avanços práticos continuam a ser dececionantes. Os impactos do aquecimento global intensificam-se e a distância entre a retórica de palco e as ações reais torna-se cada vez mais evidente. No fundo, para além das declarações cheias de esperança e dos objetivos delineados com perfeição retórica, a COP tem sido um espetáculo com resultados quase nulos, onde a eficácia das negociações parece ser medida apenas pelo número de palavras inspiradoras, não pela concretização de ações efetivas.

Eficácia retórica vs. Ação concreta

A COP parece ser um evento onde a eficiência em criar compromissos no papel é inigualável. Em cada ano, as declarações de metas são precisas, os números impressionantes e as promessas parecem a salvação ao alcance de todos. No entanto, a eficácia retórica da COP termina quando a responsabilidade passa a ser transformada em ações. O que se vê, então, é uma fragmentação das intenções iniciais: metas que outrora pareciam sólidas acabam diluídas em cláusulas condicionais, ajustadas para acomodar interesses de diferentes países e indústrias. Como se pode esperar uma ação global uniforme, se mesmo dentro dos debates não há consenso sobre quem deve dar o primeiro passo?

Anualmente, os compromissos são empurrados para o futuro, prometendo mudanças que «quase» acontecerão na próxima década. E enquanto este «quase» permanece eternamente distante, as emissões aumentam, os eventos climáticos extremos intensificam-se e as populações vulneráveis continuam a arcar com o peso das decisões adiadas. A COP tem sido muito eficaz em criar uma aparência de progresso, mas com custos demasiado elevados para o planeta.

Compromissos vagos e promessas futuras

As COP são marcadas por promessas audaciosas com metas que ultrapassam os anos – muitas vezes, as próprias décadas. Declarações de redução de emissões até 2030, 2050 ou mesmo 2070 são feitas com tanta convicção que parecem plenamente realizáveis. Por trás desses números, esconde-se uma verdade inconveniente: as promessas são, em grande parte, demasiado vagas. Como peças cuidadosamente desenhadas para iludir o espectador, estas metas dão a ilusão de que um grande esforço está a ser feito, enquanto, na prática, apenas se transfere a responsabilidade para as gerações futuras.

Para muitos líderes, prometer algo para daqui a 30 anos é uma jogada de mestre. Afinal, as futuras administrações é que terão de lidar com as cobranças. E assim, os anos passam, a COP acumula um histórico de compromissos adiados e o impacto tangível dessas promessas permanece, paradoxalmente, tão longínquo como as metas estabelecidas.

O papel das grandes economias e das empresas: compromissos audaciosos, ação mínima

Nas COP, é comum ver as maiores economias do mundo a anunciar com orgulho as suas promessas audaciosas para um futuro mais verde. As empresas multinacionais seguem o exemplo, marcando presença com compromissos públicos para reduzir emissões a zero e investir em energia limpa. No entanto, por trás deste verniz de responsabilidade ambiental surge um problema evidente: estes compromissos raramente são acompanhados de ações efetivas. As grandes economias continuam a financiar indústrias de combustíveis fósseis e, entretanto, algumas empresas permanecem as maiores emissoras de carbono do planeta.

As COP, para muitos desses atores, tornaram-se num palco para o que poderíamos chamar «lavagem verde» institucionalizada. Há uma tendência crescente de anunciar metas «net-zero» onde, por meio de compensações e créditos de carbono, as emissões são mascaradas em vez de realmente reduzidas. O truque está em calcular emissões compensadas por meio de investimentos em projetos de reflorestamento ou energias renováveis em outros locais. Esta abordagem cria um ciclo em que o impacto climático é, no fundo, empurrado para longe dos centros emissores, mas permanece, implacavelmente, no sistema global.

Para os países em desenvolvimento, a história é outra. Estes, embora também participem nas COP, muitas vezes dependem de financiamentos internacionais para implementar ações climáticas de impacto. No entanto, as promessas de apoio financeiro dos países ricos são frequentemente subfinanciadas ou chegam com tantos requisitos burocráticos que acabam por gerar mais atrasos que soluções. Num círculo vicioso, os países que menos contribuíram para a crise climática encontram-se cada vez mais pressionados a adaptar-se a ela, enquanto os principais responsáveis continuam a fazer promessas para um futuro distante, mantendo o status quo que serve aos seus interesses.

Um espetáculo que precisa de um final diferente

No final de cada COP, resta a sensação de que o evento foi, de facto, um grande espetáculo diplomático, repleto de discursos cuidadosamente elaborados e de promessas que parecem feitas para agradar mais aos olhos e ouvidos do que à realidade climática. Em cada ano, saem das conferências objetivos ambiciosos que se transformam em compromissos sem força de execução. E assim, o planeta continua a pagar o preço desta inércia, enquanto a verdadeira urgência climática fica relegada ao futuro.

Para que as COP deixem de ser apenas um palco de retórica e passem a produzir impacto real, é preciso romper com o círculo de promessas adiadas. As nações e as empresas que são responsáveis por grande parte das emissões globais precisam de assumir compromissos que transcendam a superficialidade das declarações e que tenham impacto real e imediato. E, mais do que nunca, é necessário que haja pressão e vigilância de todos os setores da sociedade para que as palavras, finalmente, sejam acompanhadas de ações. Apenas assim este espetáculo poderá ter um final diferente – um que o planeta, e todos os seus habitantes, verdadeiramente merecem e possam aplaudir.

Imagem: Malcolm Lightbody/Unsplash.com