É assim que Paulo Núncio define o âmbito do regime de IVA de caixa, aprovado recentemente pelo Governo, o qual “constitui uma forte oportunidade para as empresas que sentem dificuldades de tesouraria”. Em entrevista ao VER, o secretário de Estados dos Assuntos Fiscais explicita os principais contornos e vantagens da adopção desta medida, não deixando de afirmar, também, que a reforma do IRC é a mais importante do seu mandato
No seguimento da aprovação em Conselho de Ministros, do regime de IVA de caixa, e constituindo este “um poderoso instrumento de apoio à tesouraria das empresas”, o que levou o Governo português a aprovar, nesta altura em particular (e para entrar em vigor a 1 de Outubro), este regime que há tanto tempo era reivindicado? No entanto, até 31 de Dezembro de 2012, as regras europeias (em particular, a Directiva 2006/112/CE do Conselho, conhecida como “Directiva IVA”) condicionavam a adopção deste regime à aprovação, por parte das instâncias comunitárias, de um pedido dos Estados-membros. Neste sentido, durante o ano de 2012, dando cumprimento à norma prevista no OE para 2012, o Governo realizou diversas consultas com a Comissão Europeia, tendo em vista a aprovação de um regime de IVA de caixa em Portugal. A transposição da Directiva europeia da facturação, que entrou em vigor a 1 de Janeiro de 2013, veio alterar o quadro normativo europeu em matéria de IVA de caixa, passando a permitir aos Estados-membros a aplicação deste regime a sujeitos passivos com volume de negócios até €500.000, sem necessidade de intervenção prévia de Bruxelas. Com a adopção deste regime, Portugal passa a pertencer ao lote dos primeiros países da União Europeia a ter um regime de IVA de caixa, a par de países como o Reino Unido, a Itália, a Suécia, a Eslovénia e a Estónia, e primeiro do que a Espanha, que já anunciou também a intenção de introduzir um regime de IVA de caixa a partir de Janeiro de 2014. De um modo geral, que impactos imediatos terá esta medida no tecido empresarial português – pelo menos no caso das 85% das empresas que, de acordo com o Governo, por ele serão abrangidas? Abrangendo os sujeitos passivos com um volume de negócios anual até €500.000, o que corresponde a mais de 85% das empresas portuguesas, bem como a um número muito significativo de sujeitos passivos titulares de rendimentos empresariais e profissionais que também poderão beneficiar deste regime, o IVA de caixa constitui uma forte oportunidade para as empresas que sentem dificuldades de tesouraria. Trata-se, claramente, de uma medida em que o Estado está ao serviço da economia. Este novo regime é de natureza facultativa e estrutura simplificada. A exigibilidade do IVA devido nas operações activas apenas ocorrerá no momento do recebimento do seu pagamento pelos clientes (em substituição do momento da emissão da factura). Por outro lado, a dedução do IVA suportado nas aquisições de bens e serviços, destinadas à actividade do sujeito passivo, apenas será possível no momento do pagamento aos fornecedores. Apesar de, até agora, a medida estar a ser aplaudida por empresários, patrões e TOC, bem como por várias confederações, a adesão de empresas com volume anual de negócios até aos 500 mil euros tem sido considerada “limitada”. Mesmo sabendo-se que este volume de negócios corresponde ao limite máximo que um Estado-membro pode adoptar sem pedir a intervenção da UE, também é sabido que é no sector secundário, particularmente nas indústrias e construção civil, que os problemas de atrasos de pagamento e incobráveis são maiores. Ora, ficando estas empresas com um VAN superior a meio milhão de euros de fora, existe a possibilidade de o montante vir a ser aumentado no futuro? Atendendo ao seu carácter inovador, o Governo decidiu introduzir o regime de IVA de caixa de forma gradual e os limites comunitários,abrangendo, nesta fase, os sujeitos passivos com um volume de negócios anual até €500.000. Não obstante este regime abranger potencialmente mais de 85% das empresas portuguesas, o Governo não exclui a hipótese de equacionar um potencial alargamento do regime no futuro, se tal se justificar, e apenas após um primeiro balanço do regime. Portugal junta-se agora ao grupo dos oito países europeus que têm IVA de caixa. Existem já estudos e resultados do impacto desta medida na economia destes países?
Aquando da preparação e desenho do modelo a adoptar em Portugal, o Governo desenvolveu vários contactos informais com instituições europeias e autoridades nacionais, tendo em vista a implementação das melhores práticas. Em regra, verifica-se que o regime de IVA de caixa é de implementação recente na maioria dos países (como é o caso de Itália, que adoptou este regime no final de 2012), pelo que se revela prematuro um balanço do seu impacto na economia. Não obstante, foi possível constatar, junto do Reino Unido e da Suécia, por exemplo, que aplicam este regime há vários anos, que o IVA de caixa configura um importante instrumento de apoio à tesouraria das empresas, permitindo às empresas abrangidas afectar os recursos financeiros à sua actividade económica, ao invés de serem obrigados a antecipar ao Estado um imposto que ainda não lhes foi pago pelos clientes. O Governo deixou cair a obrigação do levantamento do sigilo bancário e alargou o prazo de liquidação do imposto para 12 meses. Estas duas medidas parecem indiciar que não há motivos para as empresas não aderirem. Mas o regime só vincula quem aderir a ele. Que outros motivos poderão existir para que a adesão não seja total? Assim, no regime de IVA de caixa aprovado, está apenas previsto que a administração fiscal possa solicitar o levantamento do sigilo bancário nos mesmos termos que estão previstos para a generalidade dos agentes económicos. De igual modo, o Governo teve a preocupação de adoptar um regime abrangente, que inclui genericamente todos os sectores de actividade, incluindo as operações efectuadas com o Estado, assumindo, sem rodeios, que este deve ser tratado da mesma forma que o sector privado. O modelo escolhido é amigo das empresas portuguesas, no respeito pelas regras europeias e pelas obrigações impostas pelos nossos credores internacionais. Com a dilatação do prazo de liquidação do imposto, esta não poderá implicar um impacto negativo nas receitas fiscais previstas? Sendo o Estado considerado um “péssimo pagador” e, consequentemente, um mau exemplo, acredita que esta será uma forma também de disciplinar e fomentar uma cultura de pagamentos atempados que venha de “cima”?
Esta é, aliás, a política orientadora do Governo, que recentemente aprovou em Conselho de Ministros um diploma, de matriz comunitária, que estabelece prazos específicos para o pagamento de transacções comerciais, incluindo os pagamentos devidos por entidades públicas. Assim, não faria sentido excluir do regime de IVA de caixa as operações com o Estado. De facto, nos casos de transacções com o Estado é especialmente relevante que as empresas não sejam obrigadas a adiantar o valor do imposto que se encontra em falta por atraso no pagamento do próprio Estado. A ACEGE encomendou, em 2011, um estudo ao economista Augusto Mateus, que tinha como ponto de partida o cenário de degradação nos prazos de pagamento (entre 2006 e 2011) e no qual se tinha já em conta a directiva 2011/7/CE. No estudo, foram apresentados alguns números que estimavam o que se tinha perdido com os atrasos e o que se ganharia caso as empresas cumprissem o prazo de pagamento de 60 dias: mais 120 mil postos de trabalho, VAB impulsionado em 4,8 mil milhões de euros (3,1% do PIB) e ganhos na produção nacional de 22 milhões de euros. Existem algumas estimativas feitas pelo Governo que forneçam uma perspectiva dos ganhos traduzidos na economia por esta medida em particular? Uma vez que o regime de IVA de caixa abrange potencialmente mais de 85% das empresas portuguesas, estima-se que o impacto desta medida na economia nacional seja significativo, com ganhos evidentes já em 2013. O seu impacto dependerá, contudo, do grau de adesão das empresas. Defende que o IRC é o imposto que mais perturba o crescimento económico. Para quando a sua descida, essencial para atrair investimento, criar riqueza e, obviamente, mais empregos?
A redução das taxas do IRC deve ser ambiciosa, mas deve também assentar em pressupostos sólidos, consistentes e sustentáveis, de forma a perdurar no tempo. A visão do Governo é que a taxa do “novo IRC” deve baixar para promover a competitividade. Mas o “novo IRC” vai muito para além da taxa. Para que Portugal aspire a ser um país fiscalmente competitivo no século XXI é necessário reformar estruturalmente todo o sistema de tributação das empresas, tornando-o mais favorável ao investimento e à internacionalização das empresas portuguesas. A minha ambição é que o “novo IRC” tenha, a prazo, taxas reduzidas e competitivas e que incorpore as soluções mais avançadas a nível europeu tornando-se, simultaneamente, num referencial de estabilidade fiscal. Existem outras medidas que estão em curso para apoiar a tesouraria das empresas (por exemplo, os créditos fiscais)? Destaco em particular a criação do Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento (CFEI), que permitirá às empresas que realizem investimentos produtivos entre 1 de Junho e 31 de Dezembro de 2013 beneficiar de uma dedução até 70% da colecta de IRC no valor de 20% do investimento. Trata-se de uma medida com um alcance extraordinário e que terá, certamente, um impacto significativo no investimento a realizar pelas empresas durante o presente ano.Para além deste crédito fiscal ao investimento, o Governo irá ainda concretizar quatro medidas com importância significativa:
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