Em março de 1985, por ocasião do Ano Internacional da Juventude, proclamado pela ONU, mais de 300 mil jovens, provenientes dos cinco continentes, reuniram-se com S. João Paulo II, na Praça de São Pedro. Tal foi o extraordinário impacto do encontro com esta multidão de jovens que o Papa decide, nesse mesmo ano, instituir a Jornada Mundial da Juventude. Desde então, o evento realiza-se anualmente, intercalando entre anos com uma expressão mais local e anos de celebração mundial
POR MARIA DE FÁTIMA CARIOCA
Dentro de dias, muitas, mesmo muitas, centenas de milhares de jovens de todo o mundo vão encontrar-se em Lisboa para a celebração da Jornada Mundial da Juventude.
Em março de 1985, por ocasião do Ano Internacional da Juventude, proclamado pela ONU, mais de 300 mil jovens, provenientes dos cinco continentes, reuniram-se com S. João Paulo II, na Praça de São Pedro. Tal foi o extraordinário impacto do encontro com esta multidão de jovens que o Papa decide, nesse mesmo ano, instituir a Jornada Mundial da Juventude. Desde então, o evento realiza-se anualmente, intercalando entre anos com uma expressão mais local e anos de celebração mundial.
Cada um destes encontros mundiais, tem sempre impacto à escala global e à escala pessoal. Marca, profundamente, a vida de quem organiza, de quem colabora ou de quem vem simplesmente para participar. Mas também não deixa indiferente muitos dos que, de longe, acompanham o evento. Qualquer JMJ impressiona desde logo pelo extraordinário número de jovens, e menos jovens, que congrega. Impressiona também pela beleza estética, cultural, sobretudo humana de cada momento da própria Jornada. Mas interpela-nos principalmente, porque a presença de cada jovem é uma presença pessoal, viva, que manifesta o desejo íntimo, o sonho de uma vivência comunitária onde, para muitos, se dá o encontro com Deus e, para todos, se festeja o encontro fraterno, universal, com muitos outros, mais além da diversidade de proveniências ou gerações. E isto não pode deixar de ser uma grande alegria e um grande sinal de esperança para todos nós. É a promessa de um presente e de um futuro à medida da humanidade de cada um.
Transpondo para outras comunidades de pessoas, como as empresas e organizações em geral, comprova-se também que é positivamente diferenciador quando se vive a diversidade como uma realidade enriquecedora para todos, e se consegue criar um ambiente no qual todos podem desenvolver-se e contribuir para o bem comum, com os seus próprios talentos, potenciando assim o sentimento de pertença.
Mas nem sempre será assim. Embora o tema seja, hoje em dia, um tema muito estudado, dialogado e, até mesmo, regulado, com alguma surpresa se verifica que o apelo a uma maior diversidade nas organizações não está a produzir alterações significativas, pelo menos ao ritmo desejável. Mesmo com muitos estudos a apontar para a elevada correlação entre diversidade e desempenho nos negócios e com o muito que está a ser feito a nível de políticas e práticas nas organizações, a verdade é que é realmente muito difícil mudar mentalidades. E disso se trata.
Katherine W. Phillips (1972-2020), professora da Columbia Business School, escreveu um ótimo artigo sobre o tema, com o título How Diversity Make us Smarter, onde conclui que estar na companhia de pessoas que são diferentes de nós, faz-nos ser mais criativos, mais diligentes e mais dedicados ao trabalho. Isto porque a simples interação com pessoas com diferentes perfis, encoraja os membros da equipa a prepararem-se melhor, utilizando “os cinco sentidos na busca de informação”, a anteciparem pontos de vista alternativos e a esperar que a colaboração mútua exija esforço.
Mais ainda, a diversidade de perfis profissionais reforça a criatividade e inovação, levando a uma melhor tomada de decisões e solução de problemas. E a mesma lógica se aplica à diversidade social. Quando o grupo conta com pessoas de diferentes gerações, sexo, etnias ou outras dimensões, tem acesso a experiências diferenciadas, potenciando a incorporação de novas ideias e perspetivas no debate. Contudo, todos sabemos que também pode causar desconforto, maior dificuldade na comunicação e relacionamento interpessoal, falta de confiança, maior probabilidade de conflitos, desrespeito e outros problemas comportamentais e menos coesão. Como ultrapassar, então?
A chave está, precisamente, no trinómio: Dignidade – Diversidade – Pertença. Ou seja, o ponto de partida, não é a diversidade, aquilo que nos diferencia, mas a igual dignidade de cada um. E acreditar que somos iguais em dignidade, levar-nos-á a, tranquilamente, abrirmo-nos aos outros e respeitar todos. E, então, só então, deixarmo-nos surpreender, apreciar e desfrutar com o modo como cada um brilha de forma única e diferente de todos os outros.
Promover o diálogo aberto, a defesa da liberdade e a colaboração pressupõe implementar políticas consistentes e alinhadas com a valorização da diversidade. Implica também trabalhar o ambiente no sentido da aprendizagem mútua, ou seja, de genuíno interesse e abertura para aprender com o outro, nomeadamente naquilo em que é diferente (o que pode ser difícil, já que a aproximação mais comum é procurarmos descobrir pontos em comum). Contudo, reitero que a confiança, o respeito mútuo e a solidariedade, imprescindíveis para uma equipa, resultam de nos reconhecermos iguais, mesmo que diferentes. Quando não enraizadas na dignidade da pessoa humana, todas as políticas de Diversidade e Inclusão serão superficiais, impostas e contranatura e, como tal, de difícil adesão.
Pelo contrário, num ambiente como o descrito de compreensão mútua e vontade de cooperação, é possível estabelecer as condições para que todos, sem exceção, possam crescer e sentir-se úteis, valorizados e estimados, contribuindo, para a equipa, com o que têm e o que são. Sem esta vinculação, efetiva e afetiva, dificilmente se desenvolverá o sentido de pertença à equipa próxima e à organização como um todo.
Depois do interregno mais prolongado devido à pandemia, é a vez de Lisboa receber a Jornada Mundial da Juventude. Recordo algumas palavras da mensagem do Papa Francisco, em março de 2022, dirigida aos jovens que organizam a JMJ: “Que nesta Jornada aprendam a olhar sempre para o horizonte, a olhar sempre mais além. Não levantem uma parede diante da vossa vida. As paredes fecham, o horizonte faz-te crescer. Olhem sempre o horizonte, também com os olhos, mas sobretudo com o coração. Abram o coração a outras culturas, a outros rapazes, a outras raparigas, que vêm também a esta Jornada” e, no final, que “cada um saia deste encontro melhor do que quando chegou”. Queiramos nós, e Deus, que a JMJ Lisboa 2023 deixe este legado de humanidade positivo e duradouro em Portugal e no Mundo.
Artigo originalmente publicado no Jornal de Negócios
Professora de Factor Humano na Organização e Dean da AESE Business School