POR GABRIELA COSTA
Que mundo queremos em 2015? Quais são as prioridades, num planeta em desequilíbrio, habitado por 7 mil milhões de pessoas? Que mudanças querem as pessoas ver na construção de um futuro melhor? Educação de qualidade. Melhores serviços de saúde. Melhores oportunidades de trabalho. Governos “honestos e actuantes”. Acesso a alimentos de qualidade. Protecção contra o crime e a violência. Por esta ordem, pelo menos para as mais de 7 milhões, de 194 países, que já votaram no My World, Pesquisa Global das Nações Unidas Por Um Mundo Melhor, cujos resultados são partilhados com os líderes mundiais e considerados na definição da próxima agenda de desenvolvimento global, a estabelecer este ano.[pull_quote_left]Entre 2014 e 2020, cerca de 75 % da ajuda da UE será concedida aos países mais pobres do mundo[/pull_quote_left]Reunindo também, entre outros, critérios como liberdades políticas, eliminação da discriminação, igualdade de géneros, acesso a energia, e a água potável e saneamento, protecção das florestas, rios e oceanos, ou combate às alterações climáticas (preocupantemente, o item menos votado a nível global, e o 10º de 16 mais votado em Portugal), o inquérito da ONU lançado em Janeiro de 2013 e aberto ainda à participação de todos em 2015, avalia o que pensam os participantes de um novo acordo sobre desenvolvimento, a partir de questões elaboradas tendo em conta as prioridades expressas por pessoas com baixos rendimentos, no que respeita sustentabilidade, segurança, governança e transparência, em pesquisas sobre os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.
E o que pensam estas pessoas, a avaliar pelas prioridades eleitas, traduz-se no desejo do secretário-geral das Nações Unidas, enunciado no relatório da iniciativa My World, We the peoples – Celebrating 7 million voices: “Deixem-nos construir a Agenda para o Desenvolvimento mais inclusiva que o mundo alguma vez conheceu”.
Reset ao desenvolvimento na Agenda Pós-2015
É com a convicção de que o ano limite para o cumprimento dos ODM (não alcançados, como é sabido), representa “um fim que é também um recomeço”, que Ban Ki-moon declara 2015 o ano da sustentabilidade, durante o qual a oportunidade de fazer avançar o mundo em direcção à mesma se poderá concretizar, em três negociações de alto nível (de que o VER dá conta nesta edição), destinadas a reorganizar a agenda mundial de desenvolvimento e o funcionamento da economia mundial: o encontro internacional sobre as reformas do Financiamento para o Desenvolvimento, em Addis Abeda, Etiópia, em Julho; a aprovação, numa Cimeira Especial a realizar na sede das Nações Unidas, em Setembro, dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, que deverão orientar as políticas nacionais e internacionais até 2030; e, em Dezembro, a COP21, reunião de líderes da ONU, desta feita em Paris, para aprovar mais um acordo mundial sobre as alterações climáticas.
[pull_quote_right]A nível mundial, a percentagem de pessoas extremamente pobres caiu para metade desde 1990, mas 1,2 mil milhões vivem ainda nessa condição[/pull_quote_right]
Proclamado pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho da União Europeia Ano Europeu para o Desenvolvimento, 2015 é, pois, um ano de esperança para a sustentabilidade do planeta e para a erradicação da pobreza entre as gerações vindouras (objectivo primeiro da política de cooperação para o desenvolvimento, como sublinham os dois órgãos europeus na Decisão nº 472/2014/EU, que proclama o EYD 2015).
Desde logo, é o primeiro Ano Europeu “consagrado à acção externa da União Europeia e ao papel da Europa no mundo”, o que constitui uma “oportunidade única” para as organizações de desenvolvimento divulgarem “o empenho europeu” para reduzir a pobreza à escala mundial e contribuir para a Ajuda Pública ao Desenvolvimento (de referir que a EU é o principal doador de ajuda a nível mundial), motivando mais europeus a participar no esforço para a cooperação e desenvolvimento.
[pull_quote_left]Na última década, 14 milhões de crianças frequentaram a escola primária e 70 milhões de pessoas tiveram acesso a água potável, graças ao financiamento europeu[/pull_quote_left]
A nível global, e como referido, é o ano em que a comunidade internacional terá de decidir o futuro quadro mundial para a erradicação da pobreza e para o desenvolvimento sustentável, no âmbito da Agenda Pós-2015, que sucede as metas estabelecidas para os ODM, e que se antevê no relatório síntese do secretário Geral das Nações Unidas, apresentado em Dezembro, “The Road to Dignity by 2030: Ending Poverty, Transforming All Lives and Protecting the Planet”, o qual propõe várias medidas para abordar as 17 metas e os 169 objectivos que deverão integrar os Objectivos para o Desenvolvimento Sustentável. Em causa está reavaliar o que falhou e o que urge ser feito neste domínio.
EYD: cidadãos mais conscientes e políticos mais comprometidos
Sob o mote “O nosso mundo, a nossa dignidade, o nosso futuro”, o EYD 2015 dedica-se às questões de cooperação e ajuda ao desenvolvimento, com três grandes objectivos: informar os cidadãos da UE sobre a cooperação para o desenvolvimento da União e dos seus Estados-Membros, divulgando os resultados já alcançados e o trabalho que continuará a realizar enquanto actor de peso a nível mundial, no âmbito do debate para a definição do quadro geral pós-2015; fomentar a participação directa, o pensamento crítico e o interesse activo dos cidadãos da UE na cooperação para o desenvolvimento, incluindo na formulação e execução das respectivas políticas; e sensibilizar para os benefícios decorrentes da política de cooperação para o desenvolvimento da União, não apenas para os beneficiários da ajuda ao desenvolvimento mas também para os próprios cidadãos da UE, alcançando “uma mais ampla compreensão da coerência das políticas”, e promovendo nos cidadãos europeus e dos países em desenvolvimento “um sentimento comum de responsabilidade, solidariedade e oportunidade, num mundo em mutação e cada vez mais interdependente”.
Consciencialização e compromisso são, assim, as drives para este ano voltado para a participação dos europeus num vasto conjunto de acções com vista à erradicação da pobreza, à melhoria da situação dos refugiados, à luta contra as alterações climáticas e à protecção dos recursos naturais, entre outras, organizadas pela União ou a nível regional, nacional ou local.
[pull_quote_right]Mais de 80% dos cidadãos europeus consideram que a APD é importante, mas metade não sabe para onde vai a ajuda da UE[/pull_quote_right]
Os Estados-membros nomeiam um coordenador nacional responsável pela organização do EYD 2015 no seu país, que irá promover campanhas de comunicação, seminários e debates, acções de educação para o desenvolvimento, estudos e inquéritos, partilha de informações e boas práticas ou qualquer outra iniciativa que contribua para os objectivos deste Ano Europeu. Cada mês do ano é dedicado a um grande tema, da educação ou saúde ao emprego e crescimento sustentável, passando pelo clima, demografia, paz e segurança, igualdade de oportunidades para mulheres e crianças, ajuda humanitária e direitos humanos.
Em Portugal, o Camões – Instituto da Cooperação para o Desenvolvimento e da Língua é o coordenador para o EYD 2015, e irá divulgar a informação e actividades desenvolvidas no âmbito do Programa de Trabalho Nacional para este Ano, com a finalidade de sensibilizar e promover a participação dos cidadãos portugueses nas matérias do Desenvolvimento, com enfoque nas políticas de cooperação e educação para o desenvolvimento de Portugal e da EU.
[pull_quote_left]Ajudar a retirar as pessoas da pobreza em todo o mundo custa a cada cidadão europeu menos de 8 cêntimos por dia[/pull_quote_left]
Neste que foi considerado “um ano especial”, pelo ex-Comissário Europeu para o Desenvolvimento, Andris Piebalgs, o grande desafio é, como disse, conseguir transformá-lo numa “oportunidade sem paralelo” para a União Europeia envolver os cidadãos europeus no seu “forte compromisso” com o fim da pobreza, demonstrando afinal, como “cada euro doado ajuda a fazer a diferença na vida de tantas pessoas, em alguns dos países mais pobres do mundo”.
O lançamento oficial do Ano Europeu para o Desenvolvimento está agendado para amanhã, dia 9, em Riga, na Letónia, país que assume a Presidência rotativa da União Europeia neste primeiro semestre do ano.
No ar ficam as questões de sempre: no ano em que se faz o balanço final do nível de incumprimento das metas estabelecidas em 2000 para os ODM, chegará esta iniciativa que apela à participação de todos os cidadãos dos Estados-membros da EU, para impulsionar um acordo que inclua transparência e vontade política na adopção, em Setembro, dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável? Poderá a nova agenda para o desenvolvimento global inverter os números que ditam, ainda, a existência de 1,2 mil milhões de pessoas a viver na pobreza extrema?
Jornalista
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