Advento é tempo de espera. Espero que o nascimento de Jesus traga uma força e um discernimento renovados e reforçados para o tempo acelerado e desafiante que vivemos. Espero ainda que esta alegria renovada a cada Natal seja um incentivo para caminhar firmemente para Cristo com a ajuda, o talento, a sabedoria e a força das melhores referências que temos
POR DUARTE VAZ PINTO

Uma vida sem referências é uma travessia no deserto. Todos nós temos as nossas referências de infância, de escola, profissionais, familiares, espirituais, de fé, de mentoria ou de amizade. São pessoas que nos inspiram, que nos guiam e nos servem de exemplo. Em princípio, quanto mais fortes e sólidas forem essas referências, mais se alumia o nosso caminho.

Por outro lado, não me canso de repetir a familiares, a amigos e até a colegas de trabalho que todos nós somos produto dos nossos modelos de referência. De forma mais consciente ou inconsciente, de forma mais positiva ou negativa. As referências marcam e influenciam tanto para um lado como para o outro.

O Relvas trabalhou “toda a vida” em casa dos meus avós. Era um homem forte e ágil que fazia elevações só com um braço pendurado no estendal e exibia a sua batata “à Popeye” muito raramente e só depois de o chatearmos muito. Escondia-se e corria connosco, mas também se sentava ficava a olhar por um bebé ou vigilante na piscina enquanto saltávamos e mergulhávamos. Era paciente.

Lanchava uma carcaça com chouriço e um copo de vinho tinto mas arranjava-nos um pouco de manteiga se lhe pedíssemos, e quando sabia que estávamos trazia mais carcaças e se faltava, dava-nos a dele. Era generoso.

Estudou pouco, não teria mais do que a instrução primária, mas era um prático. Ensinou-me a andar de bicicleta, a repor a corrente e a reparar um furo. Ensinou-me a guiar e a mudar um pneu. Ensinou-me a pintar, a reparar candeeiros, mangueiras, a plantar, a podar, a colher. Foi com ele que tive as primeiras aulas de física sobre os polos positivos e negativos de um circuito elétrico e de química sobre o ph da piscina e os perigos do ácido muriático. Era inteligente.

Pintava o cabelo de preto e apresentava-se sempre impecavelmente de fato cinzento, camisa branca e gravata preta, de fato de macaco azul, de camisa de flanela xadrez ou de chapéu de palha. Sempre aprumado. Arrumava sempre a bancada de trabalho e tinha a caixa de ferramentas arrumada, limpava sempre as migalhas da carcaça e varria a garagem. Tinha brio.

Vi-o construir, com as próprias mãos, um quarto para o filho e uma garagem para o carro. Mais tarde também construiu, com a minha modesta ajuda, um abrigo para minha primeira mota. Estudava, media, planeava, aproveita uns materiais, comprava outros e ia fazendo e aperfeiçoando. Era persistente.

Nas folgas e fins-de-semana cortava árvores, enormes, que ele reduzia a lenha devagarinho, com cautela e meticulosamente. Fazia trabalhos de monta, bastante arriscados, por preços comedidos. A minha avó incentivava-o a cobrar mais, mas aquilo era um misto de hobby e negócio. Aceitava trabalhos que outros recusavam ou exigiam gruas e outros meios, mas que ele só precisava das suas escadas e cordas e fazia magia com a motosserra. Era muito trabalhador.

Hoje olho para trás e tenho a sensação nítida de que este homem foi uma referência para mim. Pequenos nadas que moldam a nossa personalidade, a maneira de pensar e de agir. Estou-lhe grato.

Quantas referências temos nas nossas vidas sem nos darmos conta? A quem nunca agradecemos e demos o devido valor? E quantas referências estéreis e sem valores, que não servem para nada, seguimos de forma muito empenhada?

Além de fazermos escolhas mais conscientes dos modelos de referência que queremos para a nossa vida (e para os nossos filhos) podemos também dar um lugar de maior destaque a Jesus como referência maior e central na nossa vida.

Advento é tempo de espera. Espero que o nascimento de Jesus traga uma força e um discernimento renovados e reforçados para o tempo acelerado e desafiante que vivemos. Espero ainda que esta alegria renovada a cada Natal seja um incentivo para caminhar firmemente para Cristo com a ajuda, o talento, a sabedoria e a força das melhores referências que temos.

Licenciado em Relações Internacionais e pós-graduado em Gestão. Empreendedor, considera-se um gestor emprestado à política. O seu percurso profissional começou com a criação de uma empresa, passou por Macau, pelo associativismo, por uma grande empresa, mas tem sido maioritariamente marcado por cargos de assessoria a governantes em temas relacionados com economia, empresas e energia. Associado ACEGE Next, católico, amante de praia e do Alentejo, benfiquista, dedica os seus tempos livres à filha Marta, à família, aos amigos e à bricolage

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